910kWh poupados com a
i

A opção Dark Mode permite-lhe poupar até 30% de bateria.

Reduza a sua pegada ecológica.
Saiba mais

i

© João Pedro Domingos / PSD

© João Pedro Domingos / PSD

Entre o empurrão de Belém e a cachupa da Cova da Moura, Montenegro teve de lidar com sombra do Chega e fantasma da troika

Com a bênção de Marcelo, Montenegro foi da Brandoa ao Guincho em modo campanha eleitoral. Atacou Costa e picou balão presidencial, mas não sem se irritar com insistência no Chega e fantasma da troika.

Começar o dia promovido a “líder da oposição” e acabá-lo com o irritante que existe à direita (André Ventura) despromovido a simples “deputado”. Depois dos sucessivos e variados recados de Marcelo Rebelo de Sousa sobre a inexistência de uma alternativa à direita e alertas sobre a excessiva dependência do PSD em relação ao Chega, Luís Montenegro aproveitou o dia entre o Mercado da Brandoa, a Cachupa da Cova da Moura, a conversa palaciana em Belém e o vento do Guincho para atacar o Governo socialista, demarcar-se subtilmente do Chega, marcar uma diferença em relação a Rui Rio (nunca nomeado) e para (tentar) normalizar a relação com o Presidente da República. E, desta vez, fê-lo com um aparente conforto e concordância de Marcelo Rebelo de Sousa.

Depois da semana de coabitação mais tensa entre os dois — Marcelo voltou a insistir que Montenegro ainda não era uma alternativa suficientemente forte; Montenegro contrariou-o publicamente e garantiu não “estar no bolso de ninguém” –, Presidente da República e líder do PSD encontraram-se esta terça-feira a sós numa audiência no Palácio de Belém.  O Observador sabe que não ficou qualquer assunto por tratar, incluindo os equilíbrios à direita e a situação política do país, que pode ou não resultar na marcação de eleições antecipadas no segundo semestre de 2024. A conversa terá sido franca, mas não foi tensa, o que terá ajudado a relançar uma relação que tem sido tudo menos pacífica entre Belém e São Caetano.

Se Marcelo certa vez afirmou que se via como um “pica-balões“, alguém que antecipa e tenta evitar eventuais tensões, Montenegro aproveitou este encontro com o Presidente da República para evitar o escalar de um pingue-pongue que se vem arrastando há alguns meses e que conheceu nas (raras) respostas públicas do líder do PSD ao Chefe de Estado o seu expoente máximo até aqui. Depois de respondido diretamente a Marcelo em duas ocasiões — na rua, a 12 de abril, e em entrevista à CNN, exibida a 14 de abril, Montenegro entende que tudo o que havia para dizer ao Presidente da República está dito — e o mais fica no segredo dos deuses.

“Há zonas da conversa que ficam no recato da relação institucional entre o presidente do PSD e candidato a primeiro-ministro e o Presidente da República”, desculpou-se Montenegro aos jornalistas. De resto, a história desse encontro começou a ser construída ainda antes, como antecipava aqui o Observador: pela primeira vez, Marcelo referiu-se oficialmente a Montenegro como “líder da oposição” e, mais relevante ainda, ao final do dia, quando anunciou igual audiência com André Ventura, que decorrerá esta quarta-feira, o Chefe de Estado referiu-se ao líder do Chega apenas e só como “deputado“.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Uma diferença de tratamento entre os dois que foi devidamente notada no PSD e que parece acompanhar os sinais que o Presidente da República vem deixando à boca pequena — ainda na edição da última sexta-feira, o Expresso titulava que Marcelo não dissolveria a Assembleia da República com PSD na mão do Chega; a 13 de abril, o Observador contava que, num jantar organizado pelo Harvard Club of Portugal, à porta fechada, o Chefe de Estado confessou estar mais otimista com a força do centro-direita, com a capacidade de o PSD vir a ser uma alternativa e sobre a possibilidade de os sociais-democratas dispensarem a direita radical.

Além disso, os renovados sinais de Marcelo em relação a Montenegro surgem depois de uma entrevista do líder do PSD à jornalista Maria João Avillez, na CNN, em que este carregou no tom das críticas a André Ventura e deixou a garantia de que não fará acordos de governo ou de incidência parlamentar com “políticas ou políticos racistas ou xenófobos, oportunistas ou populistas”. Ainda que não tenha desfeito o tabu — Montenegro continua sem dizer taxativamente que não fará qualquer aliança com o Chega –, o afinar do discurso parece ter sido do agrado presidencial.

Pelo menos, e esse é outra mudança devidamente assinalada no PSD, as declarações de Montenegro nessa mesma entrevista tiveram a vantagem de provocar uma reação epidérmica a Ventura, que, acredita-se, será vantajoso para o PSD — quanto mais o Chega critica a “direita mariquinhas“, mais o PSD crescerá entre as forças moderadas. Até lá, Montenegro vai gerindo os silêncios.

Desde o momento em que deu entrevista a Maria João Avillez, o líder social-democrata não mais respondeu diretamente às perguntas sobre o Chega. Na segunda-feira, recusou-se a esclarecer se considerava o partido de André Ventura “racista, xenófobo, oportunista ou populista”; esta terça-feira, depois da audiência com Marcelo, e à margem de uma visita à Duna da Cresmina, voltou a cortar a eito. “Já esclareci os portugueses. Disse o que tinha a dizer.”

Montenegro não desfaz o tabu, mas aumenta pressão sobre Ventura: “Racistas”, “imaturos” e “populistas” ficam fora

Troika e Suzana Garcia quase estragam o guião

Se sobre Marcelo Rebelo de Sousa chegou a ser escrito que procurava medir o pulso da opinião pública no eixo Portugália-Santini, em Cascais, Luís Montenegro aproveitou o eixo Brandoa-Cova da Moura-Belém-Guincho para tentar validar a tese de que o ciclo político de António Costa terminou e de que o Governo socialista está esgotado e desligado da realidade do país.

Durante a manhã, no Mercado da Brandoa, à medida que ia perguntando sobre o estado da arte e sobre os impactos da redução do IVA para 0% num conjunto alargado de produtos, Montenegro ia recebendo de volta lamentos sobre a quebra no negócio, a falta de dinheiro dos consumidores, a descrença nas medidas do Governo e a ineficácia da medida apresentada por António Costa, que entrou esta terça-feira em vigor. Cumprida a aquisição de duas couves-flor, uma courgette, dois bifes de frango e quatro de alcatra, o líder social-democrata aproveitaria as declarações aos jornalistas para acusar o Governo de viver no “país dos powerpoint” — ideia que repetiria mais tarde, em Belém.

Mas existe um país antes de António Costa e em que Luís Montenegro teve papel relevante. Já depois da visita ao Mercado da Brandoa, e quando se preparava para tomar o café da praxe com a caravana laranja improvisada, o líder social-democrata foi interpelado por uma senhora que recordou os cortes nas pensões decididos pelo Governo de Pedro Passos Coelho. O presidente do PSD — líder parlamentar do partido nesse período — ainda tentou rebater, lembrando que esses cortes só se aplicaram a partir de um certo montante. Sem sucesso. Na volta, ainda ouviu a mesma pessoa a dizer-lhe que António Costa é que tinha reposto o que a direita cortara.

A sombra da troika, em particular junto do eleitorado mais velho, continua a ser uma dificuldade para o PSD, identificada há muito, quer pela direção de Rui Rio, quer pela direção de Luís Montenegro. Em declarações aos jornalistas, o líder social-democrata desdramatizou o episódio. “Gosto muito de ser confrontado com as perceções erradas. O que aconteceu em Portugal foi o seguinte: houve um Governo, do PS que obrigou o Estado a tomar medidas de restrição. E ando na rua de cara levantada. Não ando aqui à espera de receber beijinhos e abraços”, atirou.

Mas houve um abraço que quase lhe provocava um dissabor. Na visita à Brandoa, Montenegro fez-se acompanhar de Suzana Garcia, candidata escolhida por Rio para a Amadora, conhecida pelas posições controversas e pelos rasgados elogios que recebeu de André Ventura. Confrontado com a associação ao Chega, e a dificuldade em dizer taxativamente que recusa qualquer aliança com aquele partido, Montenegro irritou-se.

“Aqui na Brandoa, o cidadão comum não está preocupado com isso. Isso é um movimento mediático que vive numa bolha. Eu estou aqui com dirigentes e autarcas do PSD com todo o gosto e todo o respeito pelos valores do PSD. Só e confuso para quem quer continuar”, insistiu Luís Montenegro. Nas costas da bolha de jornalistas que rodeava o líder social-democrata, ouviam-se comentários de exasperação. “Outra vez? Já chega.” O PSD bem pode dizer que o assunto está arrumado e que é uma obsessão da “bolha”; mas ainda incomoda.

LUSA

A cachupa na Cova da Moura e o abraço a Carreiras no Guincho

Montenegro aproveitaria ainda o seu segundo dia no distrito de Lisboa (tem passado uma semana de cada mês num distrito diferente) para almoçar cachupa num restaurante cabo-verdiano na Cova da Moura. Mesmo com os termómetros a marcarem os 29.º celsius, o líder social-democrata não abdicaria do picante e de um travo de grogue antes de se lançar à estrada para a audiência com Marcelo Rebelo de Sousa, no Palácio de Belém.

No final, já no Guincho, e em jeito de balanço, Montenegro referir-se-ia àquele encontro com a comunidade cabo-verdiana como forma de dar destaque à necessidade de uma política de imigração capaz de atrair “portugueses novos“, devidamente “integrados”, que “vêm procurar uma oportunidade em Portugal”. Isto semanas depois de o PSD se ter travado de razões com Marcelo Rebelo de Sousa e António Costa sobre políticas de imigração, o que obrigou a uma demarcação imediata face a André Ventura, que procurou rapidamente colar-se aos sociais-democratas.

Cumprido o ritual, o líder social-democrata não esqueceria ainda Carlos Carreiras, que, investido no papel de cicerone, acompanhou o percurso de Montenegro entre a Quinta do Pisão e a Duna da Cresmina. O presidente da Câmara de Cascais foi um dos maiores críticos de Rui Rio, que lhe chegou a devolver na mesma moeda, chamando-o de “incompetente“. Depois da reaproximação à liderança atual do PSD, Montenegro referiu-se a Carreiras como “um ativo importante do poder autárquico e do PSD”. A diferença estava devidamente assinalada.

À porta fechada, Marcelo elogia alternativa a Costa e regista novo fôlego do centro-direita

Ofereça este artigo a um amigo

Enquanto assinante, tem para partilhar este mês.

A enviar artigo...

Artigo oferecido com sucesso

Ainda tem para partilhar este mês.

O seu amigo vai receber, nos próximos minutos, um e-mail com uma ligação para ler este artigo gratuitamente.

Ofereça até artigos por mês ao ser assinante do Observador

Partilhe os seus artigos preferidos com os seus amigos.
Quem recebe só precisa de iniciar a sessão na conta Observador e poderá ler o artigo, mesmo que não seja assinante.

Este artigo foi-lhe oferecido pelo nosso assinante . Assine o Observador hoje, e tenha acesso ilimitado a todo o nosso conteúdo. Veja aqui as suas opções.

Atingiu o limite de artigos que pode oferecer

Já ofereceu artigos este mês.
A partir de 1 de poderá oferecer mais artigos aos seus amigos.

Aconteceu um erro

Por favor tente mais tarde.

Atenção

Para ler este artigo grátis, registe-se gratuitamente no Observador com o mesmo email com o qual recebeu esta oferta.

Caso já tenha uma conta, faça login aqui.