Reportagem na Pensilvânia
Quando Amilcar Arroyo chegou à cidade de Hazleton, viviam aqui menos de 100 latinos. No bairro italiano, onde o peruano se instalou e de onde seguia a pé todos os dias para a fábrica de tomate onde trabalhava, Amilcar era o único ali. “Cheguei aqui por necessidade, quase por acidente”, conta. Bancário em Lima, no Peru, deixou o seu país em 1989 por questões económicas e procurou emprego em Miami. A sua licenciatura em gestão acabou por funcionar mais como empecilho do que como vantagem e foi assim que, com apenas 10 dólares no bolso, partiu para a Pensilvânia atrás de um trabalho anunciado num jornal.
Hoje, 28 anos depois da chegada, Amilcar já não é o mesmo — e a pequena cidade de Hazleton também não. “Este é um local agradável para criar uma família. As pessoas dizem que é perigosa, que os latinos a destruíram, mas não é verdade”, lamenta-se o peruano, sentado à secretária do seu escritório, onde todos os dias redige e pagina sozinho o El Mensajero, jornal de língua espanhola da cidade.
Amilcar, que fez parte de inúmeros quadros consultivos em órgãos como a câmara de comércio local ou a Universidade Penn State, é hoje uma voz respeitada na comunidade. Tem duas filhas adultas, fruto da relação com a mulher (nascida e criada em Hazleton, de origem germânica, que Amilcar conheceu na fábrica de tomate), e dois netos. Vivem no Valley, uma zona mais abastada nos subúrbios, onde os habitantes são na maioria brancos que abandonaram o centro da cidade. Na baixa, onde se encontra o escritório do Mensajero, as poucas lojas e restaurantes abertos anunciam nas suas montras desayunos, envios de dinero e peluquerias, ao lado de sinais luminosos que gritam Open em letras de um vermelho vivo.
Se quando o peruano Amilcar aqui chegou, em 1989, Hazleton tinha menos de uma centena de hispânicos, hoje em dia são mais de 10 mil, numa cidade cuja população anda à volta de 25 mil habitantes. O condado de Luzerne, onde a cidade se insere, teve um aumento de 523% na população hispânica entre os anos 2000 e 2011, de acordo com dados do Pew Research Center.
A maioria é de origem dominicana e vive aqui, em Hazleton, fruto de um fenómeno de passa a palavra. Os empregos criados por grandes companhias como a Amazon ou a agro-alimentar Cargill, que vieram atraídas por uma política de baixos impostos, são um chamariz para imigrantes que vivem em cidades caras como Nova Iorque ou Nova Jérsia, a apenas um par de horas de distância dali. A renda de uma casa em Hazleton fica largas centenas de dólares abaixo de uma renda nova-iorquina, por exemplo, e as contas tornam-se mais fáceis de fazer: “Os latinos estavam sedentos de dinheiro, prontos para fazer qualquer trabalho e as empresas ficaram muito felizes com isso”, resume Amilcar.
“Vou a uma loja e vejo-os a comprarem coisas que eu não consigo comprar”
No entanto, apesar do grande número de hispânicos na região, o grande vencedor das eleições presidenciais de 2016 no condado de Luzerne foi Donald Trump — que, durante a campanha, disse que a maioria dos mexicanos eram “violadores” que “trazem drogas para os EUA”. O candidato arrecadou ali 58% dos votos e virou o condado, tradicionalmente democrata, do azul para o vermelho dos republicanos. Os 52% que Barack Obama tinha conquistado em Luzerne e os votos dos latinos de nada serviram a Hillary Clinton.
Amilcar viu a diferença no dia das eleições: “Geralmente demoro cinco minutos a votar. Desta vez, demorei uma hora. Vi vizinhos brancos que nunca vão votar a irem para as filas. Pessoas mais velhas, até pessoas em cadeiras de rodas, tudo…” Os números que dizem que os latinos abriram mais de uma centena de pequenos negócios na cidade não os animam. E nem as estatísticas da criminalidade, que mostram não ter havido o aumento exponencial que crêem ter existido com a vinda dos imigrantes, os demovem. Os habitantes brancos de Hazleton, na sua maioria, não gostam dos hispânicos que se estabeleceram na sua cidade — e deixaram-no bem claro nas urnas.
“Votei em Donald Trump, sim. Porquê? Por causa da imigração”, resume ao Observador uma avó de 71 anos que espera a neta, quase a sair das aulas, na rua principal da cidade, a Broad Street. Recusa revelar o seu nome, mas conta, enquanto mexe nervosamente no fecho do casaco do fato de treino rosa, que trabalhou toda a vida numa fábrica. “Vejo muitos estrangeiros com o Access Card [cartão utilizado na Pensilvânia para receber apoios sociais do Estado]. E nós, que vivemos aqui a vida toda, não temos nem metade daquilo. Não é justo. Vou a uma loja e vejo-os a comprarem coisas que eu não consigo comprar. A gasolina é cada vez mais cara, a comida também…”, desabafa a reformada, queixando-se do valor da sua pensão, que não aumenta. “Vivi aqui toda a vida e nunca tinha visto droga ou homicídios antes. Foram os [imigrantes] ilegais que os trouxeram”, sentencia, semicerrando os olhos azuis.
Frank Singly concorda. “O meu negócio já foi assaltado 12 vezes”, desabafa este soldador de 68 anos que, como muitos outros habitantes nativos de Hazleton, se mudou para os arredores da cidade. “Votei no Trump porque ele diz o que pensa. Não é como os outros políticos”, admite, de mãos enterradas nos bolsos das Levi’s, depois de ter confessado timidamente que se sente um pouco desconfortável porque o Presidente “não sabe falar bem com as pessoas”.
Apesar disso, não se arrepende do voto: “Trump está a tentar impedir a criminalidade e tem tido alguns resultados. A imigração já está a descer”, acaba por dizer Frank, antes de se despedir para regressar ao trabalho. Esteve a almoçar no Jimmy’s, um restaurante local famoso pelos cachorros quentes e pelo ambiente típico de diner americano. Lá dentro, é-se transportado para a América dos anos 50: há as banquetas em frente ao balcão de inox, as empregadas de avental à cintura e bloco de notas na mão que tratam todos os clientes por honey e os anúncios que prometem uma tarte de abóbora “igualzinha àquela que a mãe fazia”. Na tarde em que visitamos o Jimmy’s, os clientes sentados à mesa são todos brancos.
“Hazleton já era uma comunidade trumpiana muito antes de Trump aparecer”, resume ao Observador Jamie Longazel, filho da terra, professor de ciência política na John Jay College e autor do livro Undocumented Fears: Immigration and the Politics of Divide and Conquer in Hazleton, Pennsylvania (sem edição em português). “Há uma piada que se costuma contar sobre Hazleton que diz que em cada esquina aqui há uma igreja católica e um bar, construídos pelos antigos imigrantes europeus, como os italianos e os irlandeses. Agora há uma igreja, um bar e uma agência de emprego temporário”, resume o académico. Apesar do trabalho em armazéns e fábricas, o desemprego em Hazleton continua alto (9,6%, comparado com os 4% da média nacional) e os salários são baixos. A depressão económica nesta cidade, à semelhança de muitas outras na Pensilvânia que viraram as costas aos democratas, é uma realidade.
“Trump está a pôr o dedo numa ferida. O “Make America Great Again” toca em alguma coisa. Mas nós na América estamos tão ligados a questões raciais que quando se diz ‘antes é que era bom’, as pessoas não conseguem desligar isso da raça. É a combinação da queda económica com a invenção de um bode expiatório racial”, diz Longazel, ele próprio filho de um mecânico fabril. “O que me parte o coração é ver que há de facto um problema profundo e que esse problema está a ser mal interpretado.”
O clima anti-latinos, contudo, já existia na cidade muito antes de Trump ser candidato presidencial. Em 2006, aproveitando as notícias de um homicídio cujos suspeitos eram hispânicos, o presidente da câmara Lou Barletta propôs uma lei anti-imigração fortemente repressiva, que incluía, entre outras medidas, multas pesadas para os senhorios que alugassem casas a imigrantes ilegais. A tensão acentuou-se de tal forma que culminou em vários episódios de discriminação, como um vivido pelo peruano Amilcar: “Estava a cobrir uma manifestação para o jornal quando uma senhora me viu e desatou aos gritos. ‘Ilegal! Traidor! Cabrão do ilegal!’, dizia.”
Os suspeitos do crime de 2006 acabaram por não ser condenados. A lei do mayor Barletta foi considerada inconstitucional e a cidade ficou com uma dívida de mais de 1,4 milhões de dólares em despesas legais devido aos vários recursos que perdeu em tribunal. A má opinião dos latinos, contudo, ficou. “A lei de 2006 deu licença para odiar. Nos últimos anos, as coisas estavam a ficar melhores. Agora as pessoas voltam a sentir-se encorajadas a ter estas atitudes… Quando eu era pequeno não havia tantas bandeiras da Confederação em Hazleton como agora, por exemplo”, reflete Longazel.
A capital dos refugiados ainda é um local acolhedor
A sul de Hazleton, num caminho onde se passa por aquela que é uma das cidades mais pobres de toda a América, Reading, encontra-se o condado agrícola de Lancaster. Aqui, os republicanos sempre dominaram a política local e Trump conseguiu uma vitória confortável em Lancaster, ficando-se nos 57%. Este é um lugar conservador e isso nota-se: apesar de estar a apenas hora e meia de distância de uma grande cidade como Filadélfia, em Lancaster basta entrar no mercado para encontrar as mulheres Amish, de touca na cabeça, a vender os seus produtos hortícolas.
Em Lancaster, como em Hazleton, o número de estrangeiros a viverem no condado (e, em particular, na cidade com o mesmo nome) é elevado. Contudo, aqui não há tantos imigrantes, mas sim refugiados. E, ao contrário do que acontece na cidade do condado de Luzerne, esse não é um tópico problemático — pelo menos para já. Os números contam parte da história: Lancaster recebe mais 20 refugiados per capita do que o resto do país, com 1 refugiado para cada 327 residentes. Em termos de comparação, a cidade de Nova Iorque tem uma média de 1 refugiado para cada 50 mil habitantes. A BBC chamou a Lancaster “a capital dos refugiados na América”.
“Esta é uma cidade muito acolhedora. Temos uma tradição de mais de 300 anos de acolher pessoas, foi isso que aconteceu aqui quando acolhemos os Amish e os Menonitas.” Quem o explica é Stephanie Gromek, funcionária do Church World Service (CWS), organismo responsável pelo acolhimento de refugiados no condado há 30 anos, onde chegam sobretudo congoleses, somalis e sírios. A unanimidade sobre o tema é tanta que, quando em 2015 um grupo de cerca de 30 supremacistas brancos de fora do condado organizou uma manifestação à porta da sede da CWS, 200 contra-manifestantes da cidade surgiram para os afugentar.
“Os refugiados aqui são vistos como uma questão humanitária, não são uma questão política. Mas esta é uma questão que se tornou mais sensível nos últimos tempos, sem dúvida”, admite Gromek. O responsável pela mudança que tem ocorrido ao longo do último ano tem um nome: Donald Trump. Stephanie Gromek recorda-se bem do dia 27 de janeiro, quando o Presidente anunciou que tinha assinado a ‘travel ban’, proibindo os cidadãos de vários países (entre eles a Síria e a Somália) de entrar nos EUA. A equipa reuniu-se quase toda no seu cubículo, com a televisão ligada na CNN, para vê-lo assinar o documento. “Caraças, isto está mesmo a acontecer”, pensou Stephanie nesse momento.
A medida foi entretanto travada por vários tribunais. No entanto, a redução do número de refugiados que os Estados Unidos podem receber tem também afetado o CWS. Os últimos números estabelecidos por Barack Obama fixavam-se nos 110 mil. Trump alterou esse teto para os 50 mil, sendo que ainda pode descer mais. No CWS, tudo está em suspenso. Com uma redução tão grande no número de refugiados, houve igualmente cortes no financiamento da instituição. Vários funcionários foram despedidos e muitos refugiados ficaram com os seus processos parados. O ambiente é de incerteza, já que ninguém sabe se amanhã o Presidente anunciará novas medidas.
“Os que cá estão ficaram desapontados. ‘Será que o meu filho vai poder juntar-se a nós?, perguntam-me. As pessoas estão confusas, perguntam o que é que está a acontecer. E vêm ter connosco à procura de respostas que nós não temos”, desabafa ao Observador Amer Alfayadh, refugiado vindo do Iraque há já vários anos e que hoje colabora com o CWS. Licenciado em Engenharia, Amer, de 34 anos, começou por trabalhar num armazém, único local onde lhe deram emprego quando chegou à América. A situação frustrava-o, conta. Queria “fazer mais pela comunidade” que tanto lhe tinha dado e que o recebeu de braços abertos.
Hoje em dia, no entanto, esse acolhimento nem sempre é tão caloroso. “Ainda no outro dia aconteceu uma coisa quando fui à Segurança Social. Um tipo lá olhou para mim e para os refugiados que estavam comigo e começou a dizer ‘estas pessoas vêm aqui para levar o meu dinheiro’. Se calhar há uns tempos ele não teria coragem de dizer isto… Mas eu adoro estas oportunidades, porque posso falar-lhe de mim e contar a minha história: ‘Tenho dois empregos, estou a tirar um mestrado, sustento a minha família’, disse-lhe.”
Stephanie também acaba por admitir que Lancaster enfrenta as suas divisões. “Temos de ter muito cuidado quando falamos sobre o que fazemos, porque algumas das pessoas que nos apoiam votaram em Trump. Podem não concordar com ele em relação aos refugiados, mas concordam no resto”, conta. Licenciada em Psicologia, Stephanie teve uma experiência com refugiados em Albuquerque que a marcou para sempre: graças a um trabalho na Universidade, contactou com um casal do Ruanda (ela era tutsi, ele hutu) que se tinham conhecido no campo de refugiados e que procuravam uma vida nova na América. Daí para a frente, decidiu que tinha de trabalhar com refugiados e, através de uma pesquisa no Google, descobriu o CWS e decidiu mudar-se para Lancaster.
Agora, cinco anos depois, está feliz com a sua decisão. Tenta manter-se positiva, mas não consegue evitar algum desânimo quando olha para a situação atual e teme que as coisas mudem na cidade que escolheu para viver e onde nasceu entretanto a sua filha. “Podíamos estar numa situação pior, muitas cidades estão. Queremos sair da nossa bolha e chegar aos que estão do outro lado, mas é muito difícil, porque não nos querem ouvir”, diz.
“Tenho disto na minha própria família, acreditas? Fala-se na palavra ‘imigração’ ou ‘refugiados’ à pessoa errada e isto pega fogo, é inflamável. Tem sido cansativo. Eu e o meu marido andamos a falar em começar a fazer ioga”, remata, com uma curta gargalhada. Antes de se ir embora, Stephanie pega no iPhone, que estava pousado em cima da mesa, e olha para o ecrã. Arregala ligeiramente os olhos quando lê que um juiz no Havai acabou de bloquear a última versão da ‘travel ban’. “O terceiro círculo tem estado do nosso lado… Que é o lado certo, na verdade”, diz, sorrindo ligeiramente, mas com pouco entusiasmo. Ao ritmo a que mudam as decisões na era Trump, esta americana não quer largar foguetes antes da festa.
O eleitorado latino, “um gigante adormecido”
Se em Lancaster há refugiados assustados, em Hazleton, para além de vários eleitores satisfeitos, também há latinos com receio da retórica do Presidente. Ben Medina nasceu em Porto Rico, é cidadão americano, mas está longe de se sentir confortável com a sua situação. “Ele desrespeitou-nos de tantas formas… Ainda agora, em Porto Rico, tratou as pessoas como animais, atirando-lhes os rolos de papel”, afirma. “Aqui em Hazleton não tenho visto um reforço no policiamento à procura de imigrantes ilegais, mas as pessoas estão com medo à mesma.”
A troca de palavras com Medina acontece na sede do Hazleton Integration Project (HIP), uma associação criada para tentar promover a aproximação entre as comunidades branca e latina, onde o porto-riquenho trabalha como diretor. Além de organizarem um ATL para crianças, os trabalhadores e voluntários desta organização funcionam como uma espécie de ponte: traduzem documentos, ajudam a encontrar emprego, organizam festas e atividades. Uma das suas fundadoras, Elaine Curry, serve de cicerone pelo edifício desta antiga escola católica transformada em sede da associação. “Esta é uma geração de imigrantes que precisa de ajuda, os pais não são fluentes em inglês e não sabem navegar nos nossos sistemas de saúde e educação”, explica.
Com quatro anos de existência, o HIP tem atualmente 85 crianças inscritas, na sua maioria de origem hispânica. Outras 40 estão em lista de espera. Às três da tarde, a sala comunitária do piso de baixo está a fervilhar: saídos das aulas, dezenas de miúdos de várias idades lancham e brincam, numa algazarra de palavras em inglês e espanhol que se misturam pelo ar. A seguir, irão separar-se por grupos etários e fazer atividades diferentes: aulas de computador, debates, workshops de fotografia, entre outras.
Elaine mostra as várias salas, cheia de orgulho, enquanto enumera as atividades. Conta entre gargalhadas a história de uma rapariga a quem disse ‘podes ser Presidente, podes ser o que tu quiseres’, tendo ela respondido ‘acho que preferia ser juiz do Supremo Tribunal’. Elaine diz que é um exemplo da confiança que quer ver nas crianças que frequentam o seu centro. Mas nem tudo são rosas aqui: na hora de dar donativos, muitos dos habitantes de Hazleton recuam, ressentidos. Olham com desconfiança para o HIP, que dizem “só ajudar os latinos”. De pouco vale ao centro ter sido co-fundado por uma das poucas figuras públicas que Hazleton já produziu e que encara como um “dos seus” — Joe Maddon, treinador dos Chicago Cubs, que o ano passado deu a vitória na World Series ao clube, que não conquistava o título desde 1908.
Também a eleição de Donald Trump teve efeitos no centro, como conta Elaine: “Eu oiço da boca dos meus meninos como eles agora ouvem muito mais insultos racistas. O filho de uma amiga minha peruana começou a ser chamado de ‘mexicano’ na escola e dizem-lhe que tem de ir para o país dele. Ele está na terceira classe…”
Ao longo do curto caminho de estrada alcatroada, sem passeios, que separa as instalações do HIP até à baixa, são inúmeros os cartazes cor-de-rosa, espetados nos pequenos quintais das vivendas de madeira cinzentas e castanhas, com as palavras “Eu apoio Allison Barletta”. Trata-se de uma prima do antigo presidente da câmara responsável pela lei anti-imigração de 2006, que concorre agora à assembleia municipal. O próprio Lou Barletta também não abandonou a política. Terminado o mandato de mayor em 2010, foi depois eleito membro da Câmara dos Representantes e tenciona agora dar o salto para o Senado, impulsionado pelo próprio Donald Trump. “É um óptimo tipo”, já disse o Presidente acerca de Barletta em mais do que uma ocasião.
Surpreendentemente, Amilcar Arroyo, que já trabalhou para Barletta traduzindo documentos, concorda: “Ele é um bom tipo, não é racista. Mas também é um político esperto e percebeu que os eleitores brancos têm este tipo de sentimento”, explica o jornalista peruano. “Os latinos aqui são um gigante adormecido. Não votamos nas eleições locais, só nas presidenciais. Só vemos a Univision, não vemos as outras televisões…”, lamenta-se, acrescentando que muitos dos latinos na cidade prestam mais atenção à política no seu país.
“Nós somos os imigrantes de primeira geração: tudo o que fazemos é trabalhar, trabalhar, trabalhar. Os de segunda geração é que já falam bem inglês, já conhecem a Constituição, já querem votar. Essa é a geração que vai fazer a diferença”, diz o peruano. Ele próprio vê isso em casa: as suas duas filhas, plenamente integradas, não se vêem apenas como latinas. Mas, tal como todas as moedas têm outra face, o avô Amilcar também sente necessidade de tentar ensinar espanhol a um dos seus netos, por medo de que ele nunca venha a conhecer a língua.
Por enquanto, o seu neto e as crianças do HIP ainda não participam na política e o peruano continua todos os dias a vestir o seu fato, a colocar um laço ao pescoço e a conduzir até ao seu escritório na baixa de Hazleton, onde escreve sozinho edições inteiras de um jornal em espanhol. O editor esforça-se por incluir questões políticas no meio dos anúncios que tratam de matérias práticas como o aluguer de casas, venda de carros ou envio de dinheiro para a América Latina.
“Precisamos de trabalhar em conjunto, a população antiga e a população nova de Hazleton”, vai repetindo Amilcar, como um mantra que lhe dá forças para sair de casa todos os dias e continuar a trabalhar, apesar da idade avançada. “Já estivemos mais próximos. Mas depois chegou Donald Trump e o fosso ficou maior outra vez.”
*O Observador viajou com o apoio da bolsa Transatlantic Media Fellowship, da Fundação Heinrich Böll