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O governo de Boris Johnson encomendou 100 milhões de doses da vacina de Oxford/AstraZeneca

Paul Ellis - WPA Pool/Getty Images

O governo de Boris Johnson encomendou 100 milhões de doses da vacina de Oxford/AstraZeneca

Paul Ellis - WPA Pool/Getty Images

Faz sentido adiar a 2.ª dose para vacinar já mais pessoas? É possível, mas farmacêuticas desaconselham

Devido à escassez de vacinas e à situação descontrolada da pandemia, o Reino Unido vai dar a 2.ª dose da vacina mais tarde, para vacinar já mais pessoas. Imunidade não será muito prejudicada.

O governo britânico autorizou esta terça-feira o uso de emergência da vacina da Oxford/AstraZeneca contra a Covid-19 (ChAdOx1 nCoV-2019). A notícia foi recebida com entusiasmo no país que, esta terça-feira, ultrapassou os 53 mil novos casos registados num único dia. A tomada de posição do governo, seguindo a recomendação do comité de vacinação, não levantaria grandes questões, não fosse pelo facto de se ter admitido que a segunda dose da vacina — quer da Oxford/AstraZeneca, quer da Pfizer/BioNTech — pudesse ser administrada ao fim de 12 semanas e não de três ou quatro como inicialmente previsto.

Entre os especialistas britânicos, existem aqueles que consideram que vacinar o maior número de pessoas, mesmo sem completar imediatamente o plano de vacinação, é a escolha acertada e os que receiam que os grupos de maior risco não fiquem tão protegidos como deveriam. O comité de vacinação (Joint Committee on Vaccination and Immunization, JCVI), por sua vez, está alinhado com a maioria e escolheu dar prioridade a uma maior cobertura (mais pessoas vacinadas), tendo em conta a situação da pandemia no país e a velocidade da resposta necessária. As farmacêuticas, porém, lembram que os ensaios clínicos foram feitos com a segunda dose a ser tomada cerca de um mês depois — e não aconselham a alteração.

“A partir de hoje [30 de dezembro], o NHS [sistema nacional de saúde] vai dar prioridade à administração da primeira dose da vacina aos grupos de maior risco em todo o Reino Unido”, anunciou, esta quarta-feira, o governo britânico. Segundo a BBC, a vacina ChAdOx1 nCoV-2019 pode começar a ser administrada a partir de segunda-feira.

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Que esquema de vacinação estava previsto para as vacinas contra a Covid-19?

O JCVI, que considerou as vacinas da Oxford/AstraZeneca e da Pfizer/BioNTech seguras e altamente eficazes, defende que a vacinação seja feita em duas doses espaçadas no tempo. Mas tendo em conta o contexto epidemiológico no Reino Unido, o comité dá prioridade a que um maior número de pessoas vulneráveis seja vacinado rapidamente. Em termos práticos isto quer dizer que se deve apostar em dar a primeira dose a todas as pessoas de risco antes de haver uma preocupação com a toma da segunda dose.

"Não temos dados que demonstrem que a proteção conferida pela primeira dose se mantenha depois de 21 dias."
Pfizer

A decisão foi baseada no facto de ambas as vacinas apresentarem alguns dados que, segundo o JCVI, indicam que é conferida proteção contra o desenvolvimento da doença (ou das formas mais graves) após a primeira dose. A vacina da Oxford/AstraZeneca pode assim ser dada entre quatro a 12 semanas depois da primeira dose. Já a segunda dose da vacina da Pfizer/BioNTech, que tinha recomendação para ser dada a partir do 21.º dia como em Portugal, passa a poder ser dada desde essa data e até à décima segunda semana após a primeira dose.

A Pfizer reagiu imediatamente à decisão, avisando que não foi isso que se testou nos ensaios clínicos, conforme reporta o The Guardian. “Não temos dados que demonstrem que a proteção conferida pela primeira dose se mantenha depois de 21 dias”, alertou a farmacêutica.

A Moderna também não defende este alargamento do prazo com a sua vacina. “Todos os ensaios clínicos com a vacina mRNA-1273 incluíram uma segunda dose ao fim de 28 dias. Neste fase, a Moderna não pode comentar sobre a eficácia ou segurança da mRNA-1273 ao longo de outros períodos“, respondeu a farmacêutica ao Observador. A vacina da Moderna também é baseada em ARN mensageiro, como a da Pfizer/BioNTech, mas ainda não foi aprovada no Reino Unido nem União Europeia.

Vacina da Pfizer tem 90% de eficácia. “Hoje é um grande dia para a ciência e a humanidade”, anunciou CEO da empresa

A resposta imunitária à vacina começa a ser desenvolvida ao fim de poucos dias ou nas primeiras semanas e vai evoluindo até estabilizar por volta dos 21 dias (no caso da vacina da Pfizer), explica ao Observador Hélder Mota Filipe. Daí que essa seja a data escolhida para a segunda dose. Mas os estudos mostraram que, após a primeira dose, “a resposta imunitária mantém-se até à 12.ª semana”, diz o professor da Faculdade de Farmácia da Universidade de Lisboa, apoiando a decisão do Reino Unido.

“A segunda dose é precisa para garantir que as defesas permanecem no tempo”, diz Hélder Mota Filipe, ex-presidente do Infarmed e membro da Comissão de Avaliação de Medicamentos no organismo. Ou seja, a segunda dose não vai aumentar a resposta imunitária, não a vai tornar mais potente, mas vai permitir que essa resposta se prolongue no tempo.

É por esse mesmo motivo que o comité defende que não se pode deixar de tomar a segunda dose, para uma proteção mais duradoura. “O JCVI recomenda que a segunda dose seja da mesma vacina que a primeira dose. Trocar entre vacinas ou falhar a segunda dose não é aconselhável uma vez que pode afetar a durabilidade da proteção”, lê-se no documento do comité.

"A segunda dose é necessária para garantir que as defesas permanecem no tempo."
Hélder Mota Filipe, professor na Faculdade de Farmácia da Universidade de Lisboa

A Moderna, no entanto, diz que as vacinas de ARN mensageiro fornecem mais do que uma ação prolongada. Ainda que tenha sido detetada uma resposta imunitária ao fim de 15 dias depois da primeira dose, “a segunda dose, dada 28 dias depois da primeira, é um ‘boost’ [reforço]”, refere a empresa. “Em algumas vacinas de ARN mensageiro, incluindo a mRNA-1273, este reforço pode criar uma resposta imunológica mais forte do que seria criada caso se usasse o dobro da dose numa única injeção.”

O especialista em Farmacologia destaca que é igualmente importante que não se vacine antes do tempo recomendado pela farmacêutica produtora da vacina — no caso da Pfizer, antes do 21.º dia —, “porque a resposta imunitária precisa de tempo para se estabilizar”. A vantagem de vacinar logo ao fim dessas três semanas, como se prevê que seja feito em Portugal, é garantir que o processo de vacinação fica resolvido o mais depressa possível para cada uma das pessoas, diz o investigador.

Qual a vantagem de vacinar mais pessoas em pouco tempo?

Vacinar o maior número de pessoas possível, como deseja o Reino Unido, é um “princípio legítimo”, explica Hélder Mota Filipe, que não vê, no entanto, vantagem em fazer o mesmo em Portugal, visto que a situação epidemiológica não tem comparação com a crise que se vive naquele país.

Grupos prioritários no Reino Unido

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No Reino Unido, a primeira fase pretende prevenir a mortalidade e morbilidade devido à Covid-19. Os grupos definidos como prioritários pelo JCVI (Joint Committee on Vaccination and Immunisation) representam cerca de 99% das mortes preveníveis.

  1. residentes e trabalhadores dos estabelecimentos residenciais para idosos;
  2. todos os que tenham 80 ou mais anos e os profissionais de saúde e de ação social de primeira linha;
  3. todos os que tenham 75 ou mais anos;
  4. todos os que tenham 70 ou mais anos e indivíduos que sejam extremamente vulneráveis em termos clínicos (exceto grávidas e crianças);
  5. todos os que têm 65 anos ou mais;
  6. todos os indivíduos que tenham entre 16 e 64 anos e uma condição de saúde que o coloque em maior risco de ter uma doença grave ou morrer;
  7. todos os que tenham 60 ou mais anos;
  8. todos os que tenham 55 ou mais anos;
  9. todos os que tenham 50 ou mais anos.

JCVI/Gov.UK

O JCVI recomenda que a prioridade do atual programa de vacinação contra a Covid-19 seja a prevenção da morte associada à doença — nomeadamente acima dos 65 anos — e a proteção dos profissionais de saúde, dos trabalhadores dos serviços sociais e dos respetivos sistemas. A segunda prioridade será dada àqueles que se encontram em maior risco de exposição e maior risco de hospitalização. Aumentar a cobertura (vacinar mais pessoas) “deverá maximizar o impacto de curto prazo do programa”, defende o comité.

“O impacto [da medida] vai demorar algumas semanas a tornar-se visível, mas estou certo de que será significativo”, diz Robert Read, diretor do Centro de Investigação Biomédica de Southampton, do Instituto Nacional de Investigação em Saúde. Admitir que a segunda dose seja dada ao fim de 12 semanas, “permite dar a tão necessária flexibilidade a um programa tão grande como este”, destaca.

Os programas baseados na idade são, normalmente, mais fáceis de implementar e, desta forma, alcançar uma maior taxa de vacinação. Um programa baseado na idade também aumenta a probabilidade de toma entre aqueles que apresentam fatores clínicos de risco, uma vez que estes fatores de risco aumentam com a idade”, refere o comité.

Apesar do esforço para aumentar o número de pessoas vacinadas, ainda está por definir que percentagem da população precisa de ser vacinada de forma a suprimir a doença em vez de apenas se protegerem as pessoas das manifestações mais graves da infeção, diz Jonathan Stoye, virologista no Instituto Francis Crick, em Londres. “E quanto tempo durará [esta proteção]?”

Que consequências negativas pode ter o adiamento da segunda dose?

A decisão do JCVI que permite que “ambas as vacinas aprovadas no Reino Unido sejam dadas com um maior intervalo entre doses, para maximizar o número daqueles que recebem uma dose tão rapidamente quando possível, é uma questão sensível”, admite Stephen Evans, professor de Farmacoepidemiologia na Escola de Higiene e Medicina Tropical de Londres, em reação ao anúncio feito esta quarta-feira. “Não pode ser visto como uma decisão fácil, uma vez que a evidência sobre a eficácia de uma dose é mais limitada, mas a crise no Reino Unido exige mais do que a abordagem regulatória normal.”

"Nenhuma vacina é 100% eficaz e comportarmo-nos como se fosse só servirá para prolongar a pandemia."
Stephen Evans, professor de Farmacoepidemiologia na Escola de Higiene e Medicina Tropical de Londres

Simon Clarke, professor de Microbiologia Celular na Universidade de Reading, por sua vez, considera que, “num momento em que aumentam as taxas de infeção, hospitalização e morte por Covid-19, é urgente que haja maior clareza em relação a quaisquer riscos associados ao adiamento da segunda dose para 12 semanas depois”. O professor questiona se a eficácia apresentada é constante entre a terceira e 12.ª semana ou se o valor apresentado pelos investigadores nos dados publicados diz respeito apenas ao pico da proteção.

“Seria profundamente lamentável que se aumentasse o risco de pessoas vulneráveis para permitir que indivíduos de baixo risco pudessem receber sua primeira dose da vacina”, acrescenta Simon Clarke, numa reação ao anúncio feito esta quarta-feira. “Na pior das hipóteses, isso pode significar uma pessoa vulnerável morra ou vá para uma unidade de cuidados intensivos, para se poder evitar que uma pessoa menos vulnerável tenha que passar uma semana doente na cama.”

Jonathan Stoye, virologista no Instituto Francis Crick, apresenta o problema de outra forma: tem dúvidas que os serviços de saúde tenham capacidade para vacinar tanta gente. Até ao Natal, eram vacinadas 50 mil pessoas por dia, diz o investigador. Para se atingir os 40 milhões de indivíduos incluídos na primeira fase, seria preciso vacinar cerca de três milhões de pessoas por semana, mesmo considerando o intervalo de 12 semanas. “Isto inevitavelmente significa que algumas pessoas já vão estar prontas para a segunda dose enquanto outras ainda nem a primeira receberam.”

Mesmo felicitando o aumento da cobertura de vacinação, Stephen Evans lembra que isso “não significa um regresso rápido à vida pré-Covid-19, mas é um passo importante nesse sentido”. Mesmo as pessoas vacinadas terão de continuar a cumprir as medidas de prevenção de contágio, como distanciamento físico ou uso de máscara. “Nenhuma vacina é 100% eficaz e comportarmo-nos como se fosse só servirá para prolongar a pandemia”.

E se o erro da AstraZeneca e da Universidade de Oxford na vacina contra a Covid-19 for uma coisa boa?

Que vantagens traz a aprovação da vacina da Oxford/AstraZeneca?

Primeiro, o benefício mais óbvio: ter mais vacinas — o governo britânico já encomendou 100 milhões doses (contra 40 milhões de doses da Pfizer/BioNTech). Além disso, a vacina desenvolvida pela Universidade de Oxford em conjunto com a farmacêutica AstraZeneca pode ser mantida a uma temperatura de entre 2 a 8 ºC durante seis meses, o que torna consideravelmente mais fácil o armazenamento, transporte, manuseamento e administração — este tipo de frigoríficos estão normalmente disponíveis nas farmácias e centros de saúde, por exemplo.

A facilidade de utilização da vacina ChAdOx1 nCoV-2019 é uma vantagem não só para o Reino Unido, que assim pode alargar os locais onde podem ser dadas vacinas contra a Covid-19 e aumentar rapidamente o número de pessoas vacinadas, mas sobretudo para os países de rendimento médio ou baixo. Estes países, mesmo que consigam adquirir as vacinas da Pfizer/BioNTech ou da Moderna, terão mais dificuldade em garantir as condições de frio que estas vacinas requerem.

A vacina da Oxford/AstraZeneca tem ainda outra vantagem para os países mais pobres, como lembra o diretor executivo da AstraZeneca, Pascal Soriot, em comunicado de imprensa: a farmacêutica não pretende ter lucro com a venda da vacina. Assim, a ChAdOx1 nCoV-2019 torna-se uma das vacinas contra a Covid-19 mais baratas do mercado e pode, inclusivamente, ser produzida por laboratórios de países de baixo rendimento (como se de um medicamento genérico se tratasse). Com o objetivo de chegar a estes países, a AstraZeneca já tem em curso um pedido de autorização de uso de emergência junto da Organização Mundial de Saúde.

É o momento de celebrar a inovação britânica”, diz Matt Hancock, secretário de Estado para a Saúde e Apoio Social no Reino Unido. “Esta vacina será disponibilizada a algumas das regiões mais pobres do mundo a um baixo custo, ajudando a proteger um número incontável de pessoas desta doença horrível.”

A maior desvantagem (se é que pode ser referido dessa forma) é que a vacina da Oxford/Astrazeneca mostrou ter uma eficácia na prevenção da doença Covid-19 inferior à da Pfizer/BioNTech (ou Moderna), cerca de 70,4% (no intervalo de confiança entre 54,8% e 80,6%), combinando os resultados de dois ensaios clínicos de fase III, um no Reino Unido e outro no Brasil.

Tendo em conta que as entidades reguladoras dos Estados Unidos e Europa (FDA e EMA, respetivamente) estavam dispostas a aprovar vacinas que mostrassem uma eficácia superior a 50%, a eficácia da vacina desenvolvida no Reino Unido cumpre os requisitos. A Agência Europeia do Medicamento (EMA), no entanto, afirmou esta quarta-feira que ainda não está pronta para aprovar a vacina e que precisa de informações adicionais.

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