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JOÃO PEDRO MORAIS/OBSERVADOR

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Miguel Pinto Luz: "Rui Rio está com enorme insegurança em relação ao resultado das diretas"

Acredita que Rio tem parte da culpa pelo surgimento do Chega e IL, mas não exclui Ventura de coligações. Pinto Luz nega taticismo e diz que vai guardar para si voto da segunda volta (caso não ganhe).

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“Luís Montenegro não cheira a troika” é uma frase inusitada, reconhecemos, mas foi dita exatamente assim durante a grande entrevista de Miguel Pinto Luz ao Observador. O candidato à liderança do PSD respondia às acusações que alguns dos seus apoiantes têm feito ao outro challenger de Rui Rio, para dizer que não concorda com elas. Aliás, houve momentos na conversa em que Pinto Luz reconheceu méritos nos adversários, incluindo no atual presidente do partido: “Acho que ele falha muitas vezes na forma, mas acerta muitas vezes nos temas que escolhe para prioridade”.

E ficamos mais ou menos por aí que Miguel Pinto Luz quer que se saiba que é um crítico do Rio. Diz que a liderança do PSD está “com pressa” e a revelar “insegurança” quanto ao resultado das diretas marcadas para dia 11 de janeiro e é isso que, no seu entender, justifica o episódio da nomeação do marido da deputada e porta-voz do PSD para o Conselho Superior do Ministério Público, que tem sido comparado com o familygate do Governo.

O vice-presidente da Câmara de Cascais chega mesmo a acusar a direção de Rio de ser co-responsável pelo surgimento de partidos como o Chega e o Iniciativa Liberal, mas não rejeita negociações à partida com o partido de André Ventura (distanciando-se assim de Montenegro), caso o PSD não consiga maioria absoluta numas próximas legislativas.

“Passista desde a primeira hora, ao contrário dos outros”, Miguel Pinto Luz garante que está na corrida para ganhar e que se não chegar à segunda volta, não apoiará publicamente nenhum dos outros candidatos. Revela ainda qual é a decisão que tomaria se votasse o Orçamento do Estado, agora que já o leu. É precisamente por aí que começamos a conversa.

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[O melhor da entrevista a Miguel Pinto Luz:]

O Orçamento do Estado e a “bipolaridade” de Centeno. “O PSD só pode votar contar”

Tem dito que o líder do PSD só devia decidir o sentido de voto no Orçamento do Estado depois de conhecer o documento. O Orçamento foi apresentado ontem, já terá tido tempo de o analisar, qual é que seria a sua decisão enquanto líder do PSD?
Repito o que disse no passado, não voto contra documentos que não conheço. Desde ontem que foi tornado público o documento e já podemos ter as primeiras luzes. Hoje posso dizer que o PSD só tem uma forma de agir e atuar: votar contra. É mais um Orçamento na sequência dos quatro anteriores que foram apresentados pelo Partido Socialista, que continua a apostar no consumo interno e a não preparar a nossa economia para a grande revolução a que vamos assistir: a economia 4.0. Continuamos a importar mais, as exportações crescem apenas 1%… O governo PSD, o tal da má memória para o PS, foi um governo que foi capaz de aumentar as exportações de 30% para 40%, o que é uma ambição diferente da que o PS nos apresenta.

"Hoje posso dizer que o PSD só tem uma forma de agir e atuar: votar contra o Orçamento do Estado".

Vê pontos positivos neste documento? Consegue identificar novidades que lhe agradam?
Naturalmente que um Orçamento do Estado tem sempre partes positivas. O dr. Mário Centeno é especialista em apresentar Orçamentos que agradam à esquerda, mas depois na sua execução agradam a Bruxelas. Um exemplo disso é os 900 milhões de euros para a saúde: sabemos que 400 milhões de euros desses 900 milhões já estão consumidos pela execução de 2019, ou seja, não há um aumento efetivo. Quando se diz que aumenta 900 milhões, é em relação ao início de 2019, não ao fim. Ele vive sempre nesta dicotomia, percebemos isso agora quando veste o chapéu de Ministério das Finanças ou Presidente do Eurogrupo. Tem sempre esta bipolaridade permanente na sua ação política e nos Orçamentos é igual. O dr. Centeno está a vender-nos 900 milhões de aumento na área da saúde quando na verdade são pouco mais de 120, 130 milhões. É esta forma falaciosa, de tentar enganar os portugueses, com a qual o PSD não pode estar de acordo. Por um lado com a forma, por outro a visão. É um orçamento sem visão, sem apresentar um sonho a todos os portugueses.

E apesar disso, há partes positivas?
Há partes positivas no Orçamento. Na questão dos filhos, por exemplo, eu próprio serei um beneficiário, tenho três filhos abaixo dos três anos. Acho que todas as medidas que possam ser colocadas no Orçamento que beneficiem a promoção da natalidade devem ser bem-vindas, falta muita coisa a fazer na promoção da natalidade em Portugal.

"Se existir uma segunda volta, e no caso de eu não estar, não apoiarei publicamente nenhuma candidatura".

JOSE SENA GOULAO/LUSA

Uma medida que abrange filhos só até aos três anos é uma medida que promove a natalidade?
Promove pouco, por isso é que acho que este orçamento sabe a pouco. Este Partido Socialista é isso mesmo, são pequenos fogachos que tentam enganar alguns, mas não enganam todos nem conseguem enganar sempre.

Mas acha que o país tem recursos para fazer melhor do que fez Mário Centeno e António Costa?
Recursos tem. Ainda hoje saiu um relatório do Tribunal de Contas onde se percebe onde é que podíamos estar a encontrar recursos.

"Mário Centeno é especialista em apresentar Orçamentos que agradam à esquerda, mas depois na sua execução agradam a Bruxelas. Tem sempre esta bipolaridade na sua ação política".

Está a falar das PPP na saúde?
Estou a falar das PPP na saúde, por exemplo. Hoje é claro que a PPP de Vila Franca de Xira reduz despesa efetiva e aumenta a capacidade de execução de serviço. Pior, hoje o relatório ainda é muito mais claro quando diz que o hospital de Vila Franca é o segundo melhor hospital em termos de despesa por utente. E qual é o primeiro? É outra PPP, de Braga. Isto é sinalizador de que o modelo das PPP funcionou e prestou bons serviços aos portugueses. Constantemente há um enviesamento ideológico por parte desta esquerda liderante no nosso país, contra estes modelos de PPP, mas não avalia o que interessa: o impacto que tem nos nossos concidadãos. O PS olha para o terceiro setor como uma ameaça ao estado social, e tem esta visão estatizante de tudo o que são serviços públicos. O estado social não tem que ser só garantido pela Administração Pública. O serviço que o Estado é obrigado, do nosso ponto de vista, pode e deve ser prestado por privados. Um terceiro setor que hoje é fervilhante. Temos um terceiro setor com IPSS, com misericórdias, com associações, que hoje fervilha e que responde às necessidades que os portugueses anseiam.

OE com excedente orçamental? “Ter contas certas é sempre positivo”

O facto de haver, pela primeira vez, excedente orçamental é um ponto positivo?
Este excedente orçamental é paradigmático de como a esquerda olha para as contas públicas. A obsessão pelo défice e pelos excedentes orçamentais é à esquerda que existe.

Está a falar do Partido Socialista? Bloco e PCP não estão muito entusiasmados com essa possibilidade…
À esquerda do PSD. Repare que o PSD era muitas vezes acusado de ser o partido obsessivo com essa questão dos défices. Sempre fomos um partido de contas certas, a direita em Portugal sempre foi de contas certas. O PS chegou tarde a essa necessidade de termos contas certas. São contas certas à custa de cativações, de dividendos do Banco de Portugal, de juros baixos. Não à custa de qualquer reforma do Estado, mas sim com pior qualidade de serviço dos cidadãos. A escola pública, por exemplo, não serve os nossos concidadãos. Quando hoje olhamos para os rankings e vemos os privados nos topos, isso diz muito da incapacidade de escolha que hoje os portugueses têm. Hoje não há liberdade de escolha. Os ricos podem escolher e os pobres não podem escolher. Temos uma esquerda que lidera este país que está obsessiva em acabar com os contratos associação, sempre que existe a palavra iniciativa privada é algo que tem de ser combatido de alguma forma. Isso vai ao arrepio do que é a visão que o PSD tem que ter para o país e este Orçamento não espelha essa visão de país.

"A obsessão pelo défice e pelos excedentes orçamentais é à esquerda que existe".

Mesmo que essa iniciativa privada dependa quase exclusivamente do Estado? Porque muitos desses colégios privados que se viram em situações económicas difíceis foi porque, deixando de ter a comparticipação do Estado, deixaram de ter viabilidade económica…
Na maior parte dos casos que refere, a questão é que não havia oferta pública que acudisse e que garantisse a oferta necessária de Educação. Essa é a maior parte da realidade dos contratos de associação. Há alguns contratos de associação onde há, de alguma forma, uma conflitualidade entre oferta pública e oferta privada em excesso, o que do meu ponto de vista até é bom para haver competitividade, para se perceber o que é que a iniciativa pública faz, o que é que a iniciativa privada faz, e quem faz melhor. E quem fizer mais, melhor e com menos, terá sempre a minha escolha. As PPP da Saúde são claras: fazem mais, melhor e com menos. O relatório do Tribunal de Contas é claro: são mais 76% de serviços prestados, o que é impressionante.

Considera então, só para ficar claro, que é um ponto positivo o Governo ter um excedente orçamental no fim do próximo ano?
Sim, contas certas é sempre positivo.

O pagamento da dívida é uma prioridade?
Objetivamente. Nós temos de desalavancar o país, pagar dívida pública, não podemos onerar permanentemente as novas gerações. Temos de ser sérios e perceber que só podemos gastar aquilo que temos. Mas temos de gastar o que temos de forma diferente, de forma mais eficiente, e isso é o que não fazemos. E não fazemos porque temos esse dogmatismo programático que está quase enraizado no Partido Socialista.

"Hoje não há liberdade de escolha. Os ricos podem escolher e os pobres não podem escolher"

“Não tenho complexo em estar ao lado do BE ou PCP se forem medidas boas para os portugueses”

E apesar de estar contra o Orçamento do Estado em toda a linha acha que o PSD devia apresentar propostas de alteração no sentido de o tentar melhorar?
Sem dúvida nenhuma. Isso é um papel que cabe à oposição. Uma oposição confiável é uma oposição que apresenta sempre alternativas. E o processo orçamental em Portugal é sempre muito participado, o que permite ao Parlamento apresentar essas alternativas. O PSD deve fazê-lo em sede própria.

Mas nem sempre o fez.
Nem sempre o fez, e às vezes erradamente. Do meu ponto de vista, o PSD tem de deixar isso claro: que orçamento alternativo apresentaria. Que mudanças apresentaria aos portugueses se fosse governo. Porque é essa incapacidade de distinguir hoje o PS do PSD que nos impede de sermos um partido maior, liderante. Hoje confunde-se muito o PS com o PSD. E acho que a oferta é clara: na nossa oferta há opções reais de qualidade que fazem a diferença na prestação do serviço público. E isso hoje não é claro. Hoje não conseguimos identificar uma bandeira do PSD, uma diferença do PSD para o PS, e este mundo cinzento da política nunca é bom. É boa a clarificação de águas. É bom sentir-se bem as diferenças, porque só na diferença é que podemos tomar decisões.

E acha que seria uma erro o PSD voltar a aparecer na fotografia ao lado do Bloco de Esquerda e do PCP a defender uma medida que venha no programa do PSD? Falo da redução do IVA da eletricidade, que é uma proposta eleitoral do PSD, mas também é do BE e do PCP.
Não tenho nenhum complexo em estar ao lado do BE ou do PCP se forem medidas boas para os portugueses. Não tenho nenhum complexo em viabilizar orçamentos que sejam bons para os portugueses. A prioridade do PSD são os portugueses, nunca a agenda do próprio PSD. A agenda do PSD é uma segunda agenda, a primeira agenda de um PSD liderado por mim será sempre a agenda dos portugueses. Sempre. Não temos de ter qualquer complexo de estar ao lado de forças políticas que não partilham dos nossos valores ou da nossa maneira de ver. O mundo não é a preto e branco, não é binário. Não sou maniqueísta, acredito no diálogo e nos pontos de contacto.

"Não conseguimos, hoje em dia, identificar uma bandeira do PSD, uma diferença do PSD para o PS, e este mundo cinzento da política nunca é bom"

Portanto, se a redução do IVA da eletricidade é uma proposta que consta do programa eleitoral do PSD, o PSD deve avançar na mesma com essa proposta.
Já tornei público que não sou a favor dessa proposta, mas o PSD hoje não é o PSD liderado por mim. Portanto, o dr. Rui Rio e a direção do PSD tomarão a decisão que entenderem nesse setor. Eu concordo mais com a visão progressiva, que depende do consumo, tenho uma visão mais virada para a política ambiental, defendo que o roteiro para a neutralidade carbónica deve estar no centro da ação política, e, desse ponto de vista, acho que medidas que incentivem o consumo da eletricidade sem serem elas próprias pedagógicas, não são positivas.

Ainda sobre o Orçamento do Estado, a hipótese de os deputados do PSD Madeira poderem viabilizar o documento não lhe causa nenhum incómodo?
Não. O PSD tem de colocar o interesse dos portugueses em primeiro plano, e portanto, os deputados por maioria de razão também têm de colocar os interesses de quem os elegeu. Logo, os deputados da Madeira têm de colocar os interesses do eleitorado da Madeira em primeiro plano. Isto não quer dizer que não haja uma hierarquia de interesses que tem de ser avaliada a cada momento.

Sobre a regionalização: "Estamos abertos a pensar um modelo possivelmente híbrido, com a criação de algumas regiões".

JOÃO PEDRO MORAIS/OBSERVADOR

O que é que está no topo dessa hierarquia?
Há o interesse nacional que se sobrepõe sempre ao interesse da Madeira, de Lisboa, de Bragança ou Braga e que tem de ser medido a cada momento. Os deputados da Madeira são pessoas sérias, que também veem o interesse nacional. Entendo e aceito que possam ter uma posição em relação ao orçamento, se o interesse nacional não estiver em causa.

E se estiver?
Aí o líder do partido tem de obrigar a uma disciplina de voto. Neste orçamento não me parece que isso esteja em causa, o que está em causa é uma avaliação política do orçamento — é um orçamento mau politicamente. E o PSD a nível nacional deve avaliá-lo como sendo mau para os portugueses, de continuidade dos últimos quatro anos, sem reformas estruturais, sem desafogar as famílias e as empresas. Mas, por outro lado, é um orçamento que permite à Madeira avaliar circunstancialmente se serve os interesses da região autónoma.

Na terça-feira, Rui Rio dizia que este orçamento trazia um aumento da carga fiscal, mas esse foi o único comentário que fez, para já, ao orçamento. Acha que por esta altura o líder do PSD já devia ter tomado uma posição sobre o sentido de voto?
Não, isto não é uma corrida de 100 metros para ver quem toma a decisão em primeiro lugar. O dr. Rui Rio tomará a sua decisão nos timings que entender, não temos de andar aqui a fazer pressão para o dr. Rui Rio tomar uma posição.

"Não tenho nenhum complexo em estar ao lado do BE ou do PCP se forem medidas boas para os portugueses. Não tenho nenhum complexo em viabilizar orçamentos que sejam bons para os portugueses"

“Sou um passista desde a primeira hora, ao contrário dos outros candidatos”

No discurso de apresentação da sua candidatura escolheu elogiar alguns ex-líderes do PSD: Francisco Sá Carneiro, Aníbal Cavaco Silva e Pedro Passos Coelho. Entretanto já disse que se identificava mais com Pedro Passos Coelho, mas que era Miguel Pinto Luz. Em que aspetos é que essa comparação lhe é favorável?
Eu admiro muito Pedro Passos Coelho, ao contrário do que algumas notícias fizeram querer parecer ao dizer que a minha candidatura era uma espécie de albergue espanhol porque tinha muita gente que não concordava com ele… Eu sou aquilo que se pode chamar ‘um passista’ desde a primeira hora. Nenhum dos outros candidatos nesta contenda interna foi passista desde a primeira hora. Eu fui apoiante de Passos Coelho desde a primeira vez, quando ele perdeu as primeiras eleições.

Estamos perante uma espécie de competição para ver quem é mais herdeiro do passismo? Se Miguel Pinto Luz, se Luís Montenegro?
Era isso que eu ia dizer. Parece quase uma competição para ver quem é mais herdeiro do passismo. Isso não existe. Respeito muito o homem, o primeiro-ministro, o estadista, alguém que foi capaz de ultrapassar o cabo das tormentas neste país. Admiro-o porque convivi com ele, tive oportunidade de pertencer às suas equipas, por isso a admiração é profunda.

Sem perder muito tempo nos ataques aos adversários, ainda assim Miguel Pinto Luz foi marcando as diferenças: "Sou Passista desde a primeira hora, ao contrário dos outros"

JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

Mas concretamente, quais são as características de Pedro Passos Coelho com as quais se identifica, que vê em si também?
Desde logo o sentido de Estado, colocar sempre o interesse nacional acima do interesse pessoal, ser alguém que se identifica com a vida pública como aquilo que mais me motiva, mais me realiza, e portanto, nesse aspeto, identifico-me com Pedro Passos Coelho. Na forma de liderar, de congregar, também. Pedro Passos Coelho, logo que foi eleito, foi buscar Paulo Rangel, Zé Pedro Aguiar Branco… essa forma de tentar juntar um partido que é tanto maior quanto melhor souber somar é uma visão que partilho com ele. Tenho uma visão também sobre o Estado e o papel do Estado que também é semelhante, portanto, é muito mais o que nos une do que o que nos separa. Mas sobre essa competição de quem é mais herdeiro do passismo, acho que isso é redutor para um partido que se quer grande. Penso que nenhum de nós os três tem a ganhar com isso. Somos todos herdeiros de um legado enorme: do passismo, do mendismo, do menezismo, do ferreirismo, do cavaquismo…

Do rioísmo?
Do rioísmo também. E eu não sou daqueles que sacode a água do capote. Já elogiei Rui Rio em muitas temáticas. Acho que ele falha muitas vezes na forma, mas acerta muitas vezes nos temas que escolhe para prioridade. Eu costumo dizer que sou muito mais próximo do dr. Rui Rio e Luís Montenegro do que sou de António Costa, e não digo isto porque é engraçado dizer, digo porque é mesmo assim.

"Eu sou aquilo que se pode chamar 'um passista' desde a primeira hora. Nenhum dos outros candidatos nesta contenda interna foi passista desde a primeira hora".

Diz que não há essa competição, mas um apoiante seu chegou a dizer que a candidatura de Luís Montenegro “cheirava a troika”. Isto não é uma competição entre o passismo bom e o passismo mau?
Eu tenho muitos apoiantes que não concordaram e não se reveem no período do passismo. Por exemplo, José Eduardo Martins foi alguém que não esteve com Pedro Passos Coelho, mas respeita-o enquanto homem, estadista, político. Nós não estamos todos de acordo em relação ao passado, mas estamos todos de acordo em relação ao futuro.

Não concorda, então, que Luís Montenegro cheira a troika?
Não, não concordo com essa afirmação, naturalmente. Luís Montenegro não cheira a troika. Era incongruente da minha parte dizer isso até, Luís Montenegro não foi membro de um governo durante o período da troika e eu fui, ainda que por um período muito curto. Mas de maneira nenhuma posso dizer isso…

Chega e Iniciativa Liberal são “responsabilidade do PSD e da liderança do PSD nos dois últimos anos”

Não se revendo nessa crítica, quais são afinal as suas grandes diferenças em relação a Luís Montenegro? São os dois desafiadores do atual líder, mas em que é que se distinguem?
Em relação a Luís Montenegro a minha posição é clara: primeiro, não acredito nesta solução milagrosa da agremiação de todas as siglas à direita do PSD para ganhar eleições. Não acredito nisso até porque os factos são evidentes. Das siglas à direita do PSD, uma elegeu cinco deputados e está numa crise interna profunda (o CDS), depois temos mais duas siglas, a Iniciativa Liberal e o Chega, que, do meu ponto de vista, são epifenómenos. E são epifenómenos porque o PSD não foi capaz de dar resposta a essas ansiedades do eleitorado.

"Acho que ele [Rui Rio] falha muitas vezes na forma, mas acerta muitas vezes nos temas que escolhe para prioridade".

Acha que o Chega é um epifenómeno ou tem potencial de crescimento?
Tem potencial de crescimento, naturalmente, porque a população reclama, e bem, em áreas específicas como a segurança e áreas onde o governo não devia estar e está. Mas, por outro lado, o PSD não foi capaz de dar resposta a estas áreas. Estes partidos só aparecem porque o PSD não foi capaz de dar resposta nestas áreas. Reparem: a Aliança nasce no seio do PSD, a Iniciativa Liberal nasce no seio do PSD (o primeiro presidente da Iniciativa Liberal era militante do PSD), e o Chega também nasce no seio do PSD. São três forças partidárias que nascem no seio do PSD, parecem quase o Vox e o Ciudadanos em Espanha. Isto é fruto de o PSD ter iniciado uma cruzada quase estéril em busca da pureza ideológica do partido — o tal regresso à social-democracia que o dr. Rui Rio advoga, e o recentramento do partido que não agrada a toda a gente, nomeadamente aos liberais e aos que têm uma posição mais à direita dentro do PSD…

Portanto, o que está a dizer é que o aparecimento do Iniciativa Liberal e do Chega é responsabilidade de Rui Rio?
É responsabilidade do PSD como um todo e, naturalmente, da liderança dos dois últimos anos. Porque não fomos capazes de dar resposta a esse eleitorado, antes pelo contrário, dissemos ao país: “Nós vamos recentrar o PSD, vamos regressar à social-democracia”. O que é que é isto? Eu sou social-democrata e, para mim, o projeto da social-democracia em Portugal é muito claro: espelha-se naquilo que Sá Carneiro fez quando implementou em Portugal uma verdadeira democracia liberal do estilo europeu, mas também se espelha naquilo que Cavaco Silva fez quando abriu a economia à iniciativa privada, abriu a comunicação social a privados, privatizou setores da indústria que estavam nacionalizados, abriu a economia sem complexos ideológicos e, ao mesmo tempo, foi alguém capaz de infra-estruturar o país, fazer escolas, fazer ferrovia, rodovia, alguém que criou a regulação de mercados que não havia… Isto é ser social-democrata.

O que está a dizer é que o PSD, como um todo, falhou e isso resultou na proliferação destes partidos à direita. Mas se rejeita esses partidos, e diz que são epifenómenos, como é que o PSD volta ao governo? Só conseguindo maioria absoluta?
Dando soluções para os problemas dos portugueses. Na área da segurança, na área do ambiente…

"Partidos como o Chega e o Iniciativa Liberal só aparecem porque o PSD não foi capaz de dar resposta em áreas específicas como a segurança e áreas onde o governo está e não devia estar".

Diálogo com o Chega. Porque não? “Se António Costa pode dialogar com Catarina Martins…”

Indo falar para o eleitorado que dispersou para o Chega e o Iniciativa Liberal?
Claro. Na área do ambiente, da cultura, dos liberais, todos eles estão dispersos: nós não temos discurso.

Então, só resta trabalhar para uma maioria absoluta do PSD?
É trabalhar objetivamente para uma maioria absoluta. Se não chegarmos à maioria absoluta, temos que ter uma política de alianças, naturalmente. E aí temos de olhar para os partidos à nossa direita…

Se o Chega se mantiver no espectro político nos próximos anos, entra nessa aliança?
Deixe-me dizer uma coisa: em qualquer aliança com o meu PSD, tem de ser o PSD a liderar a agenda, a liderar os valores, o programa, tudo. Isto é condição sine qua non.

Mas não rejeita que o Chega faça parte dessa aliança.
Eu não me sinto limitado nas minhas capacidades enquanto líder do partido de poder falar com todas as forças políticas no centro-direita. Todas. E aqui está algo que me diferencia de Luís Montenegro, por exemplo. Se deixamos o dr. António Costa falar com a dra. Catarina Martins, que olha para o modelo venezuelano como a panaceia universal para todos os problemas do país, porque é que nós não podemos olhar para todo o espectro partidário que está representado no parlamento e podemos falar, dialogar? Podemos não chegar a entendimento, mas podemos manter linhas de diálogo desde que seja claro que os valores são os nossos, o programa é o nosso, a agenda é a nossa.

"Devemos trabalhar para uma maioria absoluta. Se não chegarmos à maioria absoluta, temos que ter uma política de alianças. E aí temos de olhar para todos os partidos à nossa direita. Todos". 

“Não apoiarei publicamente nenhuma candidatura” na segunda volta

O seu slogan de candidatura — “O futuro diz presente” — sugere várias leituras. Uma delas é a de que está marcar território nestas eleições para preparar um aprofundamento desta ambição política no futuro. Rejeita esta interpretação?
Ainda bem que o slogan espoletou essas múltiplas visões. “O futuro diz presente” é mesmo isso, é nós dizermos que há um conjunto de quadros no PSD, mais novos e mais velhos, porque o partido não é feito só dos mais novos ou só dos mais velhos, e o futuro não pode ser feito sempre dos mesmos rostos. São esses rostos que queremos trazer agora, homens e mulheres de enorme valor e de enorme talento que andam esquecidos, escondidos na máquina, mas também fora do partido, e é isso que a nossa candidatura representa: queremos que possam dizer presente já hoje. Por isso, a ambição é ganhar as eleições no próximo dia 11 de janeiro. Não há ambição de posicionamento tático.

Não há outras interpretações?
Outra das interpretações que foi feita é de que havia já negociações com outras candidaturas. Que fique muito claro: estou nestas eleições para ganhar, e espero, se existir segunda volta, estar nessa segunda volta. O dr. Rui Rio e o dr. Montenegro depois terão de tomar uma decisão sobre o que farão nesse cenário: se apoiam a nossa candidatura ou não. E esse é o nosso posicionamento. Não fugimos dessa linha de ação.

Miguel Pinto Luz nos estúdios da rádio Observador esta quarta-feira de manhã

JOÃO PEDRO MORAIS/OBSERVADOR

E o Miguel Pinto Luz também terá de o fazer se não passar à segunda volta.
Eu não sou dono dos votos dos militantes. Quem votar em mim votará em liberdade total e absoluta. Portanto, se existir uma segunda volta, e no caso de eu não estar nessa segunda volta, não apoiarei publicamente nenhuma candidatura. Que fique muito claro. Não estou neste processo para alavancar a minha posição política e poder depois negociar numa posição muito mais privilegiada. Não estou na política à procura de honrarias, lugares. Estou, de facto, porque quero que o PSD se renove, que tenha outra vez uma agenda reformista, que perdeu. Que o PSD seja reconhecido pelos portugueses como a única força política com apoio social suficiente para fazer essa transformação na sociedade, que é necessária.

Mas vai exercer o seu direito de voto, se houver segunda volta e não a estiver a disputar?
Naturalmente. E a decisão que vou tomar, em quem vou votar, ficará para mim. Mas esse é um cenário que não coloco. O meu cenário é o de ganhar.

"Se existir uma segunda volta, e no caso de eu não estar nessa segunda volta, não apoiarei publicamente nenhuma candidatura. Que fique muito claro" 

Não admite publicamente outros cenários.
Claro que ninguém compreenderia, e logo eu que sou tão transparente, se não admitisse que sou, dos três, o que tem menos notoriedade. Escolhi uma carreira autárquica, Luís Montenegro escolheu uma carreira no Parlamento, tive uma pequena passagem pelo governo, curta como sabemos, portanto, tenho menos notoriedade. Mas há dois males de que me acusam com os quais não concordo. Um é a idade: também diziam que Pedro Passos Coelho era muito novo na primeira candidatura que fez, e que Manuela Ferreira Leite era muito mais experiente, assim como Pedro Santana Lopes… mas depois viu-se quem é que foi capaz de conduzir o país e retomar a confiança internacional. Outro mal que me apontam é o da notoriedade, e também isso eu acho que tem vindo a ser resolvido. Resolve-se andando de norte a sul do país, indo às ilhas como nós fomos, elencando as zonas ultra-periféricas como prioridade, indo ao interior como tenho ido, mas não esquecendo as áreas metropolitanas. O dr. Rui Rio de certa forma acelerou este processo de guetização do PSD, que está hoje muito ruralizado, sem discurso para as áreas metropolitanas, portanto, também aí eu tenho apostado. É esta forma simbólica de fazer campanha que também sinaliza a forma como estamos nesta caminhada.

Autárquicas de 2021. “Se PSD não ganhar, líder deve provocar novas diretas”

No último congresso escreveu uma carta aberta a Rui Rio onde traçava linhas vermelhas muito claras, e uma delas era que o líder do PSD tinha de ganhar eleições. Naquela altura havia legislativas. Agora há autárquicas. O próximo líder do PSD também está obrigado a ganhar as autárquicas?
Os líderes do PSD estão sempre obrigados a ganhar eleições.

Mas deve sair caso não ganhe?
Deve provocar eleições. Aliás, as próximas autárquicas estão alinhadas com o fim do próximo ciclo, portanto, acho que isso até é saudável. Eu sempre disse, ao longo dos dois últimos anos, que Rui Rio tinha legitimidade para conduzir o partido até ao fim. Nós não podemos destituir líderes partidários pelas sondagens. Tinha legitimidade de ser candidato a primeiro-ministro e ser confrontado com uma eleição nacional. E foi isso que fez. Trilhou o caminho que quis e entendeu, um caminho que dividiu o partido, e que acabou por ser um caminho que conduziu ao pior resultado de sempre do PSD. Rui Rio agora também tem legitimidade para ser candidato. Até mostra responsabilidade ao dizer que quer ser avaliado pelos seus dois anos à frente do partido.

"Os mandatos devem ser cumpridos. Nunca por nunca coloquei em causa a liderança de Rui Rio. Nunca por nunca exigi a cabeça de Rui Rio"

Mas…
O que eu digo é que os mandatos devem ser cumpridos, mas em democracia temos liberdade para emitir a nossa opinião e eu emiti ao longo destes dois anos, fui sinalizando, nos momentos-chave, aquilo que achava que eram erros que estavam a ser cometidos, mas nunca por nunca coloquei em causa a liderança de Rui Rio. Nunca por nunca exigi a cabeça de Rui Rio. Em janeiro, não estive ao lado daquela moção de censura para destituir Rui Rio, porque entendi que Rui Rio tinha de ter as condições para ir às próximas legislativas. O projeto de Rui Rio é que não foi aceite pelos portugueses. E agora o desafio de Rui Rio é maior: explicar aos militantes o que vai fazer de diferente para, desta vez, os portugueses já aceitarem o seu projeto.

"Não tenho complexo em estar ao lado do BE ou PCP se forem medidas boas para os portugueses", diz Pinto Luz na entrevista à rádio Observador

JOÃO PEDRO MORAIS/OBSERVADOR

A sua estratégia também joga com isso, se não vencer estas diretas? O próximo líder do PSD vai sufragar o seu projeto político às autárquicas, e, se for chumbado, convocam-se novas diretas. Nesse caso, então, Miguel Pinto Luz aparece novamente?
Isso é de um taticismo que eu não me revejo. Eu quero ganhar as próximas eleições e espero ter Rui Rio e Montenegro ao meu lado nos próximos dois anos para termos um grande resultado nas autárquicas. Entendo que ganhe quem ganhar devemos estar unidos. Mas o primeiro sinal de união tem de ser dado pelo presidente do partido. Rui Rio também se coloca numa posição de vitimização, mas quem afastou a maior parte dos seus adversários políticos foi Rui Rio. Houve vários sinais de que era possível construir uma unidade no partido. Quis fazer uma unidade artificial com Santana Lopes no congresso mas era artificial, era plástico, toda a gente percebeu. Mas depois não quis fazer pontes, quis fazer clivagens, cortar cabeças, teve uma postura divisionista. E isso prejudica o PSD e prejudica os portugueses.

“Estamos abertos a pensar um modelo de regionalização híbrido”

Disse recentemente que está na altura de o PSD participar ativamente no debate da regionalização, e ter uma voz sobre isso. Qual é a sua posição sobre a regionalização: a favor ou contra?
A minha posição é clara: de dar início ao debate. Votei contra a regionalização no passado, o modelo alternativo que foi apresentado não funciona, não há coesão territorial, e portanto estamos abertos a pensar um modelo possivelmente híbrido, com a criação de algumas regiões. Mas isso tem de ser debatido com as regiões. Não é uma visão centralista de Lisboa que vai impor regiões neste país. É com debate, é com referendo. Não acredito num modelo de regionalização sem referendo. Mas não sou dogmático: estive contra, mas entendo que o modelo não funcionou. Hoje não existe coesão territorial. Alguma coisa temos de fazer, não podemos meter a cabeça na areia.

Acha que Rui Rio foi imprudente quando indicou o nome de Rui da Silva Leal, marido de Mónica Quintela, deputada e porta-voz do PSD para a área da Justiça, para integrar o Conselho Superior do Ministério Público? Isto não é um caso típico do chamado familygate?
Acima de tudo acho que já uma enorme pressa da parte de Rui Rio para fazer estas nomeações, sabendo que há eleições dia 11 de janeiro. Acho que essa pressa não é saudável para o PSD, e mostra que Rui Rio está com enorme insegurança em relação ao resultado do dia 11, daí querer resolver rapidamente estas nomeações. Está com muita pressa. Além de que demonstra incoerência: eu sou dos que acredita que devemos nomear os melhores, independentemente de graus familiares, mas na política à mulher de César não basta ser, tem de parecer. Portanto, à segunda-feira dizermos que tem de haver transparência e não podermos nomear familiares, e à quarta-feira nomearmos o marido do nosso braço direito, não me parece razoável.

"Rui Rio está com enorme pressa para fazer nomeações, o que mostra que está com uma enorme insegurança em relação ao resultado do dia 11."

O argumento de Rui Rio é de que isto não é uma nomeação direta, mas sim uma indicação que depois é sujeita a votação no Parlamento.
É um falso argumento.

Se perder estas eleições, há algum cargo que ambicione? A presidência da câmara municipal de Lisboa, por exemplo?
Eu exerço com muito orgulho funções de autarca na terra onde a minha família vive, os meus amigos vivem, os meus filhos crescem. Tenho muito orgulho em ser autarca, por isso é que nos últimos 20 anos escolhi esta via.

Mas daria ou não um bom presidente da câmara de Lisboa?
Não coloco esses cenários em cima da mesa. Dia 11 de janeiro tranquilamente esperarei os resultados, se os militantes não me quiserem dar essa confiança naturalmente concluirei o meu mandato na terra que me viu nascer.

[A entrevista a Miguel Pinto Luz na íntegra:]

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