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RODRIGO MENDES/OBSERVADOR

RODRIGO MENDES/OBSERVADOR

Notas dos debates. Quem foi melhor: Mariana Mortágua ou Inês Sousa Real, Luís Montenegro ou Rui Rocha?

Montenegro e Rui Rocha apresentaram-se como diferentes, mas compatíveis em temas como impostos, saúde ou justiça. Mariana Mortágua esteve sempre ao ataque com Inês Sousa Real.

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Sem interrupções, mas nem por isso cordial: Mariana Mortágua e Inês Sousa Real repisaram as diferenças entre Bloco de Esquerda e PAN, com Mortágua focada não só em ir listando as próprias propostas, mas, sobretudo, em desmontar as propostas de Sousa Real. O apoio do PAN ao Governo Regional da Madeira esteve no arranque do debate e a porta-voz do BE voltou a ele para vincular Inês Sousa Real às políticas de que diz discordar. A líder do PAN procurou puxar o debate para as causas do partido — e teve espaço para isso, sobretudo quando o tema foi o clima.

O penúltimo dia de debates frente a frente arrancou com o encontro entre Luís Montenegro e Rui Rocha, inicialmente previsto para a sexta-feira passada, mas adiado devido à morte de um familiar do líder do PSD. Na SIC, Montenegro lembrou que a Iniciativa Liberal ficou fora da AD por vontade própria, enquanto Rui Rocha procurou combater o voto útil, garantindo que “a solução para o país” estava mesmo ali, naquela mesa. Em vários pontos, aliás, os dois candidatos apresentaram-se como diferentes, mas compatíveis — por exemplo, na área da justiça ou das Parcerias Público-Privadas na saúde, onde reconheceram haver “terreno comum”.

Pelo contrário, no que diz respeito à Caixa Geral de Depósitos não há qualquer possibilidade de convergência nas posição que os dois líderes defenderam: Montenegro entende que deve manter-se o banco público, a IL insiste na privatização.

Resta um único debate, e talvez o mais esperado: o frente a frente entre Pedro Nuno Santos e Luís Montenegro, os (principais) candidatos a primeiro-ministro, como líderes pelo PS e pela AD. Será esta segunda-feira, às 20h30, na RTP, SIC e TVI.

Depois haverá dois debates televisivos alargados, ambos na RTP, o primeiro logo na terça-feira, dia 20, entre todos os partidos sem assento parlamentar, às 21h00. E o segundo, sexta-feira, dia 23, com todos os líderes dos oito partidos com assento parlamentar, também às 21h00. O debate das rádios, também com Pedro Nuno Santos, Luís Montenegro, André Ventura, Rui Rocha, Mariana Mortágua, Paulo Raimundo, Inês Sousa Real e Rui Tavares, terá lugar segunda-feira, dia 26, às 10h00, e será emitido pela Rádio Observador, a TSF, a Rádio Renascença e a Antena 1. Pode ver o calendário dos debates que restam (e os que já se realizaram) neste gráfico.

Quem ganhou cada um dos debates? Ao longo destes dias, um painel de avaliadores do Observador tem dado nota de 1 a 10 a cada um dos candidatos por cada um dos frente a frente. E explicado porquê. A soma surge a cada dia, no gráfico inicial onde pode ver a classificação geral e saber quem tem estado melhor e quem lidera.

Mariana Mortágua (BE)-Inês Sousa Real (PAN)

Ana Sanlez — Depois do duelo entre Rui Tavares e André Ventura, ouvir um debate a arrancar com uma “nota inicial” fez temer o pior. Felizmente tratou-se apenas de Mariana Mortágua a aproveitar o seu último tempo de antena em debates a dois para falar de Navalny, do conflito em Gaza e dos “tempos sinistros” que vivemos, que Inês Sousa Real complementou com uma saudação a Diogo Ribeiro. Há lugar para tudo nestes debates. Se nos primeiros minutos parecia, de facto, que iríamos assistir a tempos de antena de dois partidos em muito semelhantes, não tardou muito até Mariana Mortágua puxar dos galões e mostrar que veio para marcar território. A líder do Bloco de Esquerda esteve sempre ao ataque, e não poupou o PAN nas suas supostas contradições, como no caso ao apoio ao Governo da Madeira. A animosidade contra um partido que roubou muitos votos ao Bloco nos últimos anos foi evidente. Sousa Real foi muito menos contundente, preferiu a tática de desfiar a lista de propostas do partido aprovadas nos últimos anos (nesta altura qualquer português já sabe que o PAN foi o partido da oposição que teve mais propostas aprovadas na última legislatura). Esteve bem no final ao atacar a proposta do Bloco sobre os juros da CGD, ao afirmar o óbvio: que a medida não pode sair do papel por ser contra as regras europeias.

Helena Matos — Desde já apresento as minhas sinceras desculpas a todas as pessoas de quem disse que falavam como se tivessem engolido uma cassette. Inês Sousa Real repete frases inteiras a uma velocidade estonteante. É uma cassette a correr em fast forward. Já Mariana Mortágua controlou o tempo e os temas. A bem da lucidez a dado momento Inês Sousa Real e Mariana Mortágua pararam de falar da transição climática e da descarbonização (assuntos de que me parece que ambas são profundamente desconhecedoras) e chegaram ao velho dilema do trabalhar a grosso ou a retalho que assola revolucionários versus reformistas: para Mariana Mortágua não faz sentido a aposta na aprovação de medidas soltas como o PAN fez na Madeira ao que Sousa Real contrapôs com a decisão do BE de votar contra o Orçamento de Estado de 2022 que na sua opinião só gerou instabilidade. No fim deste debate que foi também o último para o BE, Mariana Mortágua talvez tenha usado o seu talento para as matemáticas para calcular quantos votos terá captado esta noite entre o eleitorado do PAN.

Pedro Jorge Castro — Numa luta entre um partido em vias de extinção (o PAN) e outro em risco de encolher ainda mais e passar a caber num táxi (BE), não se desperdiçam oportunidades para conquistar votos. Mariana Mortágua, mais política e ideológica, esteve sempre ao ataque no debate contra o PAN. Inês Sousa Real não se ficou, defendeu-se de forma pragmática, elencando medidas que já conseguiu aprovar e pondo em causa medidas inconcretizáveis do programa do Bloco. Mas Mariana Mortágua foi mais eficaz a apontar as posições difíceis do PAN na Madeira e nos Açores e terá ganho aí.

Rui Pedro Antunes — Há uma parte do voto verde (alterações climáticas) e de defesa animal (na luta contra as touradas) que antes caía direitinho no Bloco, mas que o PAN foi conquistando nos últimos anos. Mariana Mortágua sabe-o e, por isso, não está para brincadeiras. Tentou, por isso, explorar aquilo que irrita mais o eleitorado de esquerda: o posicionamento do PAN ao lado da direita e o facto de nem sequer se assumir de esquerda. E foi mais-do-que-eficaz nessa estratégia. Mortágua começou por lembrar o acordo na Madeira com Miguel Albuquerque, que, que neste momento, é um património tóxico para o PAN. Depois disso atacou a descida do IRC no ponto mais sensível para o partido ambientalista: é que dessa forma, acusa o BE, o PAN também vai dar benefícios a essa gigante poluidora do grande capital: a Galp. É um argumento que a líder do BE não teve problemas em utilizar contra o PAN como se estivesse em frente ao líder da AD. Mas não ficou por aqui: ainda lembrou que o PAN viabilizou um orçamento de Bolieiro ao lado dos conservadores defensores das touradas CDS e PPM. Sem conseguir responder à altura, Sousa Real só conseguiu atingir a líder do BE quando acusou Mortágua de ter preconceito ideológico, firmando a ideia naïf de que o PAN não se preocupa com o rótulo de esquerda ou direita, mas com pessoas e animais (o que resulta com parte do seu eleitorado peace and love). Ainda assim, enquanto Sousa Real utilizava as suas alegações finais para celebrar o facto de estarem ali duas mulheres líderes partidárias a debater, Mortágua não teve contemplações e, minutos antes, disferiu outro duro golpe: “As soluções para o país estão numa maioria e na esquerda”. Ora, a “esquerda”, como a líder do BE fez questão de dizer o debate todo, não inclui o PAN.

Sara Antunes de Oliveira — O problema de quem prefere ser morno é que nunca chega para aquecer quando está muito frio e ninguém quer por perto quando está muito calor. Haverá dias, claro, em que até cai bem. Mas são poucos. Inês Sousa Real pôs o PAN nessa posição e começa a ficar claro que pode pagar um preço alto por isso. Sobretudo quando apanha pela frente uma Mariana Mortágua imparável. Se Sousa Real metralhava o debate com propostas e insuflava vitórias com um desfiar de medidas que, garantiu, só avançaram por causa do PAN, Mortágua metralhava a adversária com as incoerências e ambiguidades de um partido que acha que pode estar disponível para apoiar todos sem se comprometer com as políticas de ninguém. E isto ao mesmo tempo que conseguia afirmar-se em áreas em que o PAN devia ser mais forte, como o clima e a energia. Os eleitores descontentes do PAN devem ter percebido a dica.

Luís Montenegro (AD)-Rui Rocha (IL)

Helena Matos — Debate não vi nem ouvi, mas achei interessante assistir ao ensaio geral do que Luís Montenegro e Rui Rocha dirão na primeira reunião pós legislativas, isto, claro, se a AD ganhar as eleições e, não menos importante, se feitas as contas a AD não concluir que a IL prejudicou substancialmente os seus resultados ao não aceitar integrar a coligação. Mas, por agora, esses acertos ainda estão longe e Luís Montenegro aproveitou esta agradável conversa com o seu eventual parceiro de governo para falar para o eleitorado de centro esquerda: declarou-se contra a privatização da CGD (Rui Rocha, que esteve melhor na defesa da sua proposta sobre a baixa do IRS, aqui não foi tão eficaz a defender a privatização da CGD) e defendeu o SNS como base do sistema público de saúde. Resumindo, não aconteceu debate algum, mas sim um aproveitamento tático do tempo televisivo: o líder da AD aproveitou a presença do líder dos liberais para falar para o centro esquerda. E o líder dos liberais aproveitou para afirmar a IL como interlocutor de um futuro governo de Montenegro. Quem ganhou? Até se pode dizer que empataram. mas dou a vitória a Montenegro, seguindo o parecer de Rui Rocha, que tratou e olhou durante todo o debate para o líder da AD como o homem que manda na mesa.

Miguel Santos Carrapatoso — Rui Rocha tinha de correr atrás e não correu. O grande objetivo do presidente da Iniciativa Liberal era provar que um voto na Aliança Democrática era insuficiente e que valia a pena contar com os liberais. Não conseguiu. Foi um bom serão para Montenegro, que foi tentando provar que o programa da AD (na Saúde, na Caixa, nos impostos) é mais razoável do que o programa da IL. Uma oportunidade perdida para Rui Rocha, que nunca conseguiu sublinhar, como dizia Cotrim Figueiredo, que a IL era o “viagra” do PSD. Hoje não deu nem para chá preto. Valeu porque, numa altura em que André Ventura parece estar riscado das alianças à direita, o bom ambiente entre Montenegro e Rocha permite um voto sem remorsos na IL.

Pedro Jorge Castro — A caminho dos estúdios da SIC, Rui Rocha devia ter ouvido Phil Collins a cantar “Youcan’t hurrylove”. Em vez disso parece ter ido para o debate com Tina Turner a declamar o fantástico mas inoportuno “Let’s StayTogether”. O líder da IL disse que a solução para o país estava naquela mesa, querendo apontar a uma coligação pós-eleitoral, que põe muito em causa a recusa de se coligarem antes das eleições. Rui Rocha esteve melhor no truque dos papéis com dez pontos de entendimento, nos impostos e na Madeira. Montenegro marcou pontos na discussão sobre a Caixa e o SNS. Conseguiu não quebrar pontes para o futuro próximo, em que pode precisar da IL, mas foi mais eficaz a vender o voto útil, que acabará por seduzir muitos indecisos entre AD e IL que não queiram uma vitória do PS a 10 de março. Rui Rocha tem estado a melhorar de debate para debate, mas precisava de mais qualquer coisa para virar o jogo e arriscar perder menos eleitores. Se acabar em casamento, a IL arrisca-se a ter menos força do se tivesse aceite a coligação pré-eleitoral — a confirmar-se esse cenário, comprovará um erro estratégico.

Ricardo Conceição — Todos conhecemos aquele casal em que um termina as frases do outro e ambos são felizes assim. Há uma imagem discutida neste debate que resume esta meia hora de frente a frente: as duas faces de uma mesma moeda. Rui Rocha voltou a sacar de uma folha para entregar ao seu oponente, mas aquela mesa gigante não ajuda ao número. Luís Montenegro pegou no papel com 10 propostas, sorriu e entrou na dança. O líder do PSD foi muito claro na defesa do SNS e na manutenção da CGD na esfera pública. Duas diferenças insanáveis entre IL e AD. Mas, no final, fica esta certeza: quem no centro-direita votar na AD ou na IL saberá que as duas forças se entenderão em caso de necessidade. Nesta mesma moeda, Montenegro será a cara e Rui Rocha será a coroa.

Rui Pedro Antunes — A personagem de ficção Frank Underwood imortalizou a frase: “Se não gostas da disposição da mesa, vira a mesa.” Já Rui Rocha inaugurou um novo conceito: “Se gostas da mesa, coloca uma urna de voto no meio.” O líder da Iniciativa Liberal, com uma frase, conseguiu atirar a dois coelhos com uma única bala: atacar o voto útil do PSD e convencer eventuais indecisos entre a IL e o Chega: “A solução para o País está nesta mesa.” Rui Rocha quis mostrar que, do que depender da IL, o PS não será governo e que, para isso, pode contribuir mais do que Ventura. Se o pós-10 de março se vai decidir entre dois blocos e Montenegro mantém o “não é não” ao Chega, o líder da IL conseguiu firmar bem essa ideia. Rocha falhou onde a IL não costuma falhar: na forma. É a segunda folha A4 que atira para a mesa sem grande impacto. Como o que teve, por exemplo, a lista de organismos públicos desdobrada por Cotrim Figueiredo num debate no passado. Já Luís Montenegro não hostilizou a IL, mas lembrou que quando os liberais recusaram a coligação pré-eleitoral em Lisboa, o PSD ganhou; e quando se uniu ao PS para chumbar o orçamento de Bolieiro nos Açores, o PSD ganhou. O líder do PSD conseguiu — ao mesmo tempo que se impunha como o incontornável candidato a primeiro-ministro do bloco não-socialista (com o apoio descarado da IL) — sossegar o centro: defendeu o SNS como o pilar do sistema de saúde e que a CGD continuará pública como “válvula de segurança”. Ficou claro que o líder da IL tem um lugar à mesa, mas também que quem vai estar sempre sentado no topo é o PSD e Luís Montenegro.

Pode ver aqui as notas dos debates desta segunda-feira, terça-feira, quarta-feiraquinta-feira, sexta-feira e sábado.

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