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Oleg Orlov e Svetlana Gannushkina trabalham com a Memorial há décadas
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Oleg Orlov e Svetlana Gannushkina trabalham com a Memorial há décadas

FILIPE AMORIM/OBSERVADOR

Oleg Orlov e Svetlana Gannushkina trabalham com a Memorial há décadas

FILIPE AMORIM/OBSERVADOR

Oleg e Svetlana, veteranos da luta pelos direitos humanos na Rússia. "Chamamos guerra à guerra. E sabemos que podemos ser presos por isso"

Oleg Orlov e Svetlana Gannushkina são membros da Memorial — ONG com um Nobel, mas perseguida. Com a guerra, acham que seria "vergonhoso" reformarem-se. Até porque se sentem "responsáveis" por Putin.

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Passou meio minuto desde o momento em que Oleg Orlov, acompanhado de Svetlana Gannushkina, levantou o cartaz que dizia “Paz para a Ucrânia, liberdade para a Rússia” na Praça Vermelha e o momento em que foi algemado pela polícia. Depois da detenção, foi formalmente acusado de violação do artigo 20.2 do Código de Ofensas Administrativas: violação das regras estabelecidas para organizar uma reunião, protesto ou manifestação. O dia era 20 de março de 2022 e esta era já a quarta vez que Oleg era detido desde o início da invasão russa de larga escala à Ucrânia, a 24 de fevereiro.

O julgamento foi kafkiano. A colega Svetlana foi intimada para testemunhar em tribunal. “O juiz perguntou-me: ‘Há um relatório [policial] que diz que estavam ali 700 pessoas. Viu-as?’ E eu respondi ‘Não. Não viu as minhas fotos? Estão anexas ao processo’”, conta a ativista de 80 anos ao Observador, notando que estavam com Oleg menos de dez pessoas. “Na Rússia, costumamos dizer que depois de beber se pode ver a dobrar, mas isso significa só ver duas pessoas em vez de uma, não significa ver centenas de pessoas a mais”, acrescenta entre risos a diretora do Comité de Assistência Cívica, ONG que ajuda refugiados na Rússia. Apesar das fotos e do testemunho de Svetlana, Oleg foi condenado e obrigado a pagar uma multa. Svetlana suspira: “Sabe como em apenas uma célula humana há informação sobre todo o corpo humano? Isto é igual. Uma história, um julgamento, e toda a informação que é necessária sobre o sistema judicial russo. É este o seu ADN.

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Três semanas depois da detenção de Oleg, a porta deste ativista foi pintada com um ‘Z’, a letra que simboliza a “operação especial russa” na Ucrânia. Ali foi também colado papel onde foi escrito “colaboracionista”.

O cenário de intimidação e assédio judicial não é novo para Oleg e Svetlana. Ambos são há décadas membros da Memorial, a mais antiga ONG de defesa de direitos humanos na Rússia. Ao longo da vida — desde que no final da década de 1970 começaram a protestar contra a guerra soviética no Afeganistão, passando pelos tempos negros das duas guerras da Chechénia — foram detidos por participar em manifestações, ameaçados e assediados. Svetlana teve os seus dados divulgados online, com incentivos a que fosse morta. Oleg chegou a ser raptado, espancado e ameaçado de morte na Inguchétia.

Seria de esperar que, à medida que estão mais velhos, o ritmo do seu protesto e da repressão que sofrem abrandassem. Mas não é o caso. Há já alguns anos que a Memorial está debaixo de fogo das autoridades russas, tendo sido declarada um “agente estrangeiro” em 2015 e sendo-lhe retirado o seu estatuto legal em 2021. Nem o Nobel de Paz, que a organização recebeu em conjunto com um ativista bielorrusso e uma organização ucraniana, no ano passado, alterou a situação — pelo contrário, tornou mais evidente que a guerra na Ucrânia colocou estes ativistas do lado oposto ao do governo de Vladimir Putin.

Com 69 e 80 anos, respetivamente, Oleg e Svetlana continuam a participar em protestos de rua — e a serem detidos

FILIPE AMORIM/OBSERVADOR

“Fazer o nosso trabalho é cada vez mais difícil”, desabafa Oleg ao Observador, numa conversa em Lisboa, onde ambos estiveram para participar numa conferência sobre o trabalho da ONG. “Ninguém nos deixa registarmo-nos legalmente. Isso significa que não podemos assinar contratos, pagar os salários dos nossos trabalhadores, contratar advogados para proteger os nossos funcionários em tribunal…”, desabafa o ativista de 69 anos. ”Não podemos revelar todos os segredos sobre a forma como funcionamos, porque metade do que fazemos é clandestino.”

“Mas podemos falar”, interrompe Svetlana. “Podemos falar”, concorda Oleg. Pelo menos por enquanto.

Repressão estatal sobre a Memorial não é nova. E o Nobel da Paz não alterou isso

Svetlana estudou Matemática e foi professora universitária durante anos. Oleg foi investigador em Biologia. Mas, na prática, ambos dedicaram a vida não às ciências exatas, mas sim ao ativismo. Grande parte desse trabalho foi sempre feito com a Memorial, uma organização histórica na Rússia. Fundada no final da década de 1980, durante a glasnost de Gorbachev, a Memorial começou por se dedicar à revelação dos crimes estalinistas, impulsionada por um dos fundadores, o pai da bomba soviética de hidrogénio tornado ativista anti-nuclear, Andrei Sakharov.

Ao longo do tempo, cresceu para muito mais do que isso, dedicando-se a múltiplos projetos na área da defesa dos direitos humanos na Rússia. Hoje em dia, há 62 organizações dentro da estrutura da Memorial — incluindo o Comité de Assistência Cívica de Svetlana —, a grande maioria com sede em diferentes partes da Rússia, mas também com presença na Ucrânia, Bielorrússia, Cazaquistão, Letónia, Alemanha, Itália e França.

O coração do seu trabalho, porém, continua a ser o de recolha de dados sobre violações de direitos humanos e a partilha em público dessa informação. Desde 2007, por exemplo, que a cada 29 de outubro (véspera do Dia da Lembrança das Vítimas da Repressão na Rússia) ativistas da Memorial se reúnem em frente à antiga sede do KGB — hoje sede do FSB, os atuais serviços de informações russos — para ler em voz alta os nomes das vítimas do terror estalinista em Moscovo — um trabalho que dura o dia inteiro e nunca chega ao fim em cada ano. A ação é replicada em cidades por toda a Rússia, onde são lidos os nomes das vítimas naqueles locais.

Ação da Memorial em que foram lidos nomes das vítimas da repressão estalinista no dia 29 de outubro de 2022, em várias cidades

Tudo graças ao arquivo da ONG, que tem ficheiros sobre 50 mil vítimas da repressão soviética. Mas a organização não se dedica apenas à História: na Chechénia, por exemplo, os elementos da organização fizeram durante anos investigação no terreno sobre violações de direitos humanos.

Se durante anos os ativistas da Memorial tiveram de lidar sobretudo com os constrangimentos provocados por cidadãos individuais — Oleg, por exemplo, já foi processado pelo próprio líder checheno Ramzan Kadyrov —, nos últimos dez anos o assédio tornou-se estatal. Com Vladimir Putin no poder, a Memorial foi oficialmente declarada um “agente estrangeiro”, apesar de desde sempre ter sido uma organização russa.

Em dezembro de 2021, o Supremo Tribunal russo ordenou o encerramento da Memorial Internacional e o Tribunal de Moscovo mandou fechar o Centro de Direitos Humanos da Memorial. As decisões assentaram no facto de a Memorial ter violado as regras a que estava sujeita como “agente estrangeiro”, como o facto de não discriminar essa informação em todos os materiais que publica, online e em papel. A procuradoria acusou ainda a associação de defender “o terrorismo e o extremismo” por ter classificado como prisioneiros políticos pessoas que pertencem a grupos islâmicos ou são Testemunhas de Jeová. E declarou a Memorial como uma associação que “cria uma falsa imagem da URSS como Estado terrorista” e que “branqueia e reabilita criminosos nazis e traidores da Pátria”. A decisão foi criticada publicamente pelo Tribunal Europeu dos Direitos Humanos.

“Não acho que o Nobel esteja a contê-los de forma nenhuma. Dez dias depois de o termos recebido, eu própria fui declarada como ‘agente estrangeira’. Isso significa que tenho regularmente de entregar um relatório de 80 páginas completamente inútil.”
Svetlana Gannushkina

“Se não fosse pelo Nobel, talvez eles já nos tivessem esmagado completamente e acusado de crimes mais graves”, alvitra Oleg, cofiando o seu pequeno bigode branco, para se referir ao Nobel da Paz. Svetlana interrompe para dizer que discorda dessa avaliação: “Não acho que o Nobel esteja a contê-los de forma nenhuma. Dez dias depois de o termos recebido, eu própria fui declarada como ‘agente estrangeira’. Isso significa que tenho regularmente de entregar um relatório de 80 páginas completamente inútil.”

Em concreto, diz, tem de declarar cada despesa da sua associação de apoio a refugiados, nem que sejam três mil rublos (cerca de 30 euros) para alimentação de alguém. E responder a perguntas como “Durante este período, financiou alguma organização terrorista?” “Às vezes sinto-me tentada a fazer uma cruz no ‘Sim’ e depois dizer ‘Sou uma velhinha de 80 anos, enganei-me…’ para ver o que acontece”, diz Svetlana, com um brilho traquina no olhar que a faz parecer muito mais jovem naquele momento.

O Nobel também não tornou a Memorial mais conhecida na Rússia, dizem ambos os ativistas. O que não é surpresa numa associação tão antiga. Em dezembro de 2021, um estudo do Levada — o centro de sondagens mais independente do país — dava conta de que um terço dos russos conhecem a ONG e, entre esses, mais de metade tem uma opinião positiva da Memorial. Para além disso, 46% dos que conhecem o grupo consideram que as sentenças judiciais foram “políticas”.

“Aquilo que o Nobel mudou é que nos tornou mais conhecidos fora da Rússia”, acrescenta Oleg. “E, o mais importante de tudo: deu-nos mais energia para continuar. A situação atual é muito difícil, é fácil ficar-se deprimido. O reconhecimento dos nossos esforços ajuda-nos a continuar.” O dinheiro do prémio, conta Oleg — “podemos contar isso?”, pergunta Svetlana; “eu tenho dito a toda a gente”, responde o colega — será usado para apoiar famílias ucranianas em que um dos membros tenha morrido na guerra como civil e para reforçar o apoio aos presos políticos na Rússia. São cerca de 300 mil euros — uma vez que, em 2022, a distinção foi atribuída a três figuras e entidades distintas e o prémio (de quase um milhão de euros) é dividido em partes iguais — destinados, em partes iguais, às duas frentes de batalha ativista que a associação quer apoiar.

Situação atual na Rússia “é muito pior” do que durante as guerras na Chechénia

O humor “depressivo” que os membros da Memorial sentem agravou-se particularmente nos últimos tempos, desde que a guerra na Ucrânia começou. A repressão não é uma coisa nova para o grupo: Natalya Estemirova, que trabalhou com a jornalista Anna Politkovskaya na Chechénia, foi morta em 2009 (Politkvoskaya já tinha sido assassinada três anos antes); Oyub Titiuev, responsável da organização nessa região atualmente, está a ser acusado por posse de droga; Yuri Dmitriev, da Memorial em Karélia, está a cumprir uma pena de prisão de 15 anos por abuso sexual. As acusações judiciais são denunciadas por muitos dentro e fora do país como politicamente motivadas, à semelhança das que levaram à detenção de vários líderes políticos da oposição, como Alexei Navalny.

Apesar disso, Oleg e Svetlana são unânimes em dizer que a situação na Rússia hoje em dia, para os defensores de direitos humanos, é muito pior do que alguma vez foi desde o fim da União Soviética. “As guerras na Chechénia foram um período terrível. As pessoas morriam, amigos nossos morreram”, começa por dizer Svetlana. “Mas, ao mesmo tempo, nós dávamos uma conferência de imprensa em Moscovo e apareciam dezenas de jornalistas.” Agora, diz, todos os protestos, todas as denúncias, todas as formas de manifestação estão cobertas por um manto de silêncio.

“É claro que as guerras na Chechénia foram períodos muito negros. Mas hoje é muito pior, quando só dizer a palavra ‘guerra’ é crime. Nós chamamos guerra à guerra. E sabemos muito bem que cada um de nós pode ser preso. Cada um de nós está preparado para acordar um dia com a polícia a tocar à campainha. E depois sermos detidos. E depois sermos julgados. E depois sermos presos."
Oleg Orlov

“É claro que as guerras na Chechénia foram períodos muito negros. Mas hoje é muito pior, quando o simples facto de pronunciar a palavra ‘guerra’ é crime”, acrescenta Oleg, destacando os casos dos deputados municipais de Moscovo Aleksei Gorinov e Ilya Yashin, condenados a penas de prisão por terem ousado falar da situação atual na Ucrânia. “Nós chamamos guerra à guerra. E sabemos muito bem que cada um de nós pode ser preso. Cada um de nós está preparado para acordar um dia com a polícia a tocar à campainha. E depois sermos detidos. E depois sermos julgados. E depois sermos presos.”

Oleg Orlov foi investigador de Biologia, Svetlana Gannushkina foi professora universitária de Matemática

FILIPE AMORIM/OBSERVADOR

Esse clima é acompanhado de um desânimo intenso. Desde que os protestos iniciais contra a guerra na Ucrânia foram ferozmente reprimidos no início da ofensiva, já não é possível mobilizar multidões e fazê-las sair à rua. “Faria sentido fazermos manifestações se conseguíssemos juntar aquelas 700 pessoas imaginárias, mas não conseguimos”, diz Svetlana, referindo-se ao último processo judicial de Oleg, quando foi detido na Praça Vermelha. “As pessoas estão assustadas, têm medo de que os seus filhos, os seus maridos e os seus pais sejam enviados para a linha da frente. As mães, por exemplo, estão muito menos ativas do que foram durante as guerras da Chechénia.”

Oleg vai abanando a cabeça em jeito de concordância. “Conseguiram aterrorizar a sociedade”, afirma. E conta como vai medindo essa temperatura no grupo online que tem com outros colegas de escola, onde há poucos que se afirmam claramente a favor ou contra a guerra. “Um deles uma vez escreveu-me a dizer ‘Achas que não sabemos o que se passa? Achas que somos a favor da guerra? Claro que não, mas sabemos que não podemos fazer nada. Se todos os dias pensarmos na quantidade de pessoas que estão a morrer só vamos destruir a nossa sanidade mental, mais nada.’”

A “injeção de adrenalina do Estado” e a “vergonha” de ser cidadão de um país que invade outro. Por que Oleg e Svetlana continuam a lutar

Oleg e Svetlana também não alimentam esperanças de que a situação possa mudar politicamente. A oposição está destroçada e dividida, como a própria conversa com estes dois ativistas demonstra. Svetlana, que é membro do Comité Político do partido liberal Yabloko, ainda mantém esperança no seu antigo líder do partido, Grigory Yavlinsky, que diz ser claramente anti-guerra. Oleg revira os olhos quando ouve o nome Yavlinsky. “Ele nunca saiu para as ruas, pelo contrário, diz que as pessoas devem evitar manifestar-se”, diz, com desprezo. Os dois começam uma acesa discussão em russo, que termina com Svetlana a dizer que “é melhor falar sobre Putin do que sobre Yavlinsky”, porque pelo menos nesse assunto concordam.

“Putin é alguém que teve uma infância miserável, que foi alvo de bullying, que não teve o suficiente. Nunca estudou muito e não esperava chegar longe. Mas, com Yeltsin, subiu de tal forma que hoje certamente se pergunta ‘Como é que isto aconteceu?’ E a resposta que encontrou foi ‘Tenho uma missão’.”
Svetlana Gannushkina

Ambos conhecem pessoalmente Vladimir Putin, depois de terem estado há anos à mesa com ele, quando eram membros do Conselho Presidencial para os Direitos Humanos — órgão do qual ambos acabaram por se demitir em protesto. E não têm qualquer esperança de que ele possa mudar o atual rumo da guerra. “O retrato psicológico de Putin é muito simples”, diz Svetlana. “É alguém que teve uma infância miserável, que foi alvo de bullying, que não teve o suficiente. Nunca estudou muito e não esperava chegar longe. Mas, com Yeltsin, subiu de tal forma que hoje certamente se pergunta ‘Como é que isto aconteceu?’ E a resposta que encontrou foi ‘Tenho uma missão’.”

À sua volta, acredita Svetlana, também não há ninguém capaz de o desafiar: “Embora muitos achem que esta guerra é uma loucura, não conseguem travá-lo.” E Oleg aponta uma razão para isso: “Putin de certeza que tem muito kompromat sobre eles”, diz, usando a palavra russa que se refere à técnica soviética de chantagear aliados e adversários com informação comprometedora.

Perante isto, dizem, os membros da Memorial só podem fazer uma coisa: falar. E chamar “guerra” à guerra em cada entrevista que dão, na esperança de que essa mensagem comece a ser absorvida por uma população que, ante a mobilização geral, pode começar a mudar de atitude em relação ao conflito. E é então que lhes perguntamos: Com 69 e 80 anos, depois de uma vida dedicada à Memorial, numa fase “pior do que nunca”, com o risco de prisão a pairar sobre as suas cabeças como uma espada… Por que não desistem? Por que não se reformam?

Os dois ativistas russos garantem que a situação atual na Rússia é "muito pior" do que nos tempos das guerras na Chechénia, onde chegaram a ter uma colega assassinada

FILIPE AMORIM/OBSERVADOR

Svetlana é rápida na resposta: “Já me reformei há muitos anos”, diz, como quem considera que a luta pelos direitos humanos não é trabalho. “Todos os dias acordo e começo a receber as chamadas: alguém foi preso, alguém está a ser julgado, um jovem gay vai ser deportado para o Irão e executado, uma mulher no Cáucaso foi alvo de um crime de honra… Tenho de fazer qualquer coisa. O Estado dá-nos uma injeção de adrenalina todos os dias, é impossível ficar deprimido”, partilha, com um sorriso. De seguida, põe um ar mais sério. Hesita ligeiramente antes de voltar a falar, mas acaba por abrir a boca: “Temos uma responsabilidade. Somos cidadãos deste país, também somos em parte responsáveis por Putin.”

Oleg suspira antes de dar a sua resposta. “Já há muito tempo que equaciono a possibilidade de conseguir uma bolsa para escrever um livro de memórias na minha casa de campo”, confessa. “Mas todos os dias há um desafio novo. Ora nos declaram um ‘agente estrangeiro’, ora um amigo meu é preso, ora fecham a organização à qual dediquei 30 anos da minha vida. Desistir e deixar os meus amigos a lidarem com isto sem mim seria… Vergonhoso.” E a vergonha, diz, também está em parte ligada ao facto de ser russo — um sentido de responsabilidade como o invocado por Svetlana, que se tornou mais agudo há um ano, quando a Rússia invadiu vários pontos do território ucraniano. “Há uma guerra agressiva, iniciada pelo meu próprio país, a decorrer. Tenho amigos na Ucrânia. Simplesmente não posso reformar-me.”

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