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No tema do salário mínimo, só PS e AD convergem: colocá-lo nos 1.000 euros até ao final da legislatura. Os restantes partidos são mais ambiciosos e alguns querem uma nova subida já este ano (à exceção da Iniciativa Liberal, que propõe rever toda a lógica de definição do valor).
Em termos laborais, as ideias que constam nos programas eleitorais são muito variadas e vão desde um “novo impulso” à concertação social — que, se todas as propostas valessem, teria muito para estudar e discutir —; à transparência nos recibos de vencimento e entrevistas de emprego; aos “leques salariais” que impeçam um gestor de ganhar mais num mês do que um trabalhador num ano; a “rearrumação” de feriados; o aumento dos dias de férias (ou a compra de férias); ou à flexibilidade dos horários (o tema em que é mais evidente a clivagem ideológica entre esquerda e direita).
Também há uma palavra para a formação profissional e muitas para os estágios (com partidos da esquerda à direita a defender que sejam pagos). E dois partidos querem criar a figura do “psicólogo do trabalho”.
Quem dá mais no salário mínimo?
900 euros já este ano; 1.000 euros em 2024, 2026 ou em 2028; 1.100 ou 1.150 em 2028; ou ainda acabar com um salário mínimo nacional e atirar a negociação para cada setor. São variadas as propostas dos partidos para o salário mínimo que tende, por si só, a ser tema-quente nas campanhas eleitorais.
Neste capítulo, só PS e AD parecem concordar: os dois apontam a meta para os 1.000 euros em 2028, o final da legislatura. Os socialistas salientam que, para tal, é preciso “diálogo social”. Em Portugal, o salário mínimo é decretado pelo governo após consulta dos parceiros sociais, que não têm chegado a acordo na concertação social. Por isso, tem sido o governo a, unilateralmente, impor os valores. Este ano, o valor dos 820 euros foi inscrito na revisão do acordo de rendimentos e foi dez euros superior ao que o acordo original previa, mas isso não foi suficiente para convencer a CGTP (que, a par da CIP, não assinou o entendimento).
Para a AD, o valor dos 1.000 euros está “alicerçado” no cenário macroeconómico da coligação, tendo em conta o que prevê de inflação e de ganhos de produtividade. Os patrões têm pedido uma fórmula mais previsível para a definição do salário mínimo, que se baseie em métricas objetivas, como a produtividade ou a inflação. Em sintonia, a AD quer garantir que o aumento é definido de acordo com esses critérios, além de propor uma comissão técnica independente sobre “salário digno” que avalie o impacto da subida do salário mínimo no emprego.
Também coloca uma meta para o salário médio: aumentá-lo para 1.750 euros em 2030, “com base em ganhos de produtividade e diálogo social”. Por sua vez, o acordo de rendimentos, que Pedro Nuno Santos quer “atualizar”, inscreve a meta de um aumento de 20% no salário médio mas até 2026 (a vigência da legislatura anterior).
O Chega, por sua vez, aponta para 1.000 euros em 2026 e, para compensar as empresas, propõe um programa de apoio àquelas em que o peso dos custos fixos operacionais seja superior a 30%, por forma a que “consigam fazer face ao aumento”.
Já o Bloco coloca a fasquia nos 900 euros já em 2024, com aumentos anuais correspondentes à inflação mais 50 euros, para garantir que não há perda de poder de compra. E em vez da meta inscrita no acordo de rendimentos de que os salários pesem 48,3% no PIB, fala em 55% até ao final da legislatura. Já o PCP não desiste dos 1.000 euros já em 2024, acompanhado por um “aumento geral dos salários”, num mínimo de 15% e não menos do que 150 euros.
O PAN, por sua vez, acredita que é possível, em 2028, chegar aos 1.100 euros, que resulta de uma fórmula que incorpora “integralmente” a inflação do ano anterior, o crescimento da economia e o aumento da produtividade, acrescido de 10 euros. O Livre vai 50 euros mais longe: no final da legislatura, quer ver o valor nos 1.150 euros.
Por outro lado, a Iniciativa Liberal não avança com um valor porque quer alterar toda a lógica de definição do salário mínimo. Diz que quer “evoluir para um modelo setorial de negociação de salário mínimo em vez de uma imposição estatal igual para todas as atividades”. O que propõe é a definição de indicadores que determinem os limites tendo em conta o custo de vida, a proporção do salário mínimo face ao médio e mediano, a produtividade e a taxa de crescimento em geral. O valor seria, assim, definido dentro de um leque. Depois, por setor, os parceiros sociais poderiam definir, na negociação, valores superiores.
Como quer um “novo modelo” para a concertação social, entende que será possível negociar valores nessa sede. “Só na falta de acordo, poderá ser unilateralmente definido pelo Governo” — que é o que tem vindo a ser feito. A IL diz que toda esta lógica dá “maior previsibilidade” e “permite levar em conta a necessidade de aumento da produtividade e do consequente aumento dos salários” como “condição para aumento sustentável do salário mínimo nacional”.
Ainda na questão salarial, os liberais querem dar liberdade aos trabalhadores para escolherem como é que querem receber os subsídios de férias e de Natal — se em dois momentos ou mensalmente, em duodécimos (atualmente, essa decisão obriga a acordo entre as partes). Também quer, como o Chega, mais transparência no recibo de vencimento para que reflita quanto é que as empresas pagam em contribuições sociais pelo trabalhador.
Em termos de transparência, o Chega também quer assegurar que os anúncios de trabalho contêm informação como a identificação do empregador e o valor certo ou estimado da retribuição ou que esta informação seja prestada ao candidato no contacto que precede a entrevista. Neste sentido, o Livre também quer que os anúncios de emprego apresentem uma remuneração mínima associada ao cargo.
Em matéria salarial, a AD volta a propor, tal como o PSD fez para o Orçamento do Estado para 2024, que haja isenção contributiva e fiscal sobre os prémios de produtividade por desempenho no valor de até 6% da remuneração base anual, o que corresponderia ao 15.º mês proposto pela Confederação Empresarial de Portugal (CIP). O Bloco, por sua vez, entende que os prémios devem ser englobados na tributação dos rendimentos do trabalho (com IRS e TSU) em nome da sustentabilidade da Segurança Social.
No Orçamento do Estado para 2024, o Governo introduziu uma medida que não é exatamente igual à da AD, mas semelhante, uma vez que isenta de IRS a distribuição de lucros, com limites, embora sejam considerados para efeitos de apuramento da taxa a aplicar aos restantes rendimentos, o que pode significar um agravamento do imposto a pagar.
Ainda no que toca aos salários, o Bloco tem uma proposta para que sejam definidos leques salariais de forma a que, numa empresa, ninguém possa ganhar num mês mais do que o outro ganha num ano, tanto no setor público como privado. A medida é justificada com as disparidades que existem em várias grandes empresas em Portugal. Se ultrapassar este leque, o Bloco pretende que sejam excluídas de apoios públicos, benefícios fiscais, de participar em arrematações e concursos públicos (também quer excluir da contratação pública as empresas que não negociaram contratos no último ano, incluindo em termos salariais).
Neste ponto do leque salarial, o Livre tem uma ideia semelhante: “regular as diferenças salariais dentro da mesma entidade, estabelecendo um limite máximo para o rácio entre o salário mais baixo e o salário mais alto em cada empresa, organização ou ramo de atividade”.
Mais férias, a semana de quatro dias (com feriados) e maior (ou menor) flexibilidade
O aumento dos dias de férias ou a redução do horário de trabalho volta a juntar os partidos à esquerda do PS, que querem as 35 horas semanais no privado (já é assim, pelo menos à luz da lei, no público) e retomar os 25 dias de férias. Nestes últimos dois pontos, o PAN também concorda e acrescenta: estabelecer que, a partir dos 50 anos, aos 25 dias é acrescido um dia útil por cada cinco anos. O Livre, por sua vez, atira para a discussão 30 dias de férias anuais até 2030, através da “implementação imediata” das 35 horas semanais e dos 25 dias de férias, “planeando progressivamente a redução do tempo de trabalho”.
No que toca às férias, a AD não menciona o aumento dos dias mas sim dar “maior flexibilidade” no gozo de férias por iniciativa do trabalho, com a “possibilidade de aquisição de dias de férias, com um limite a definir contratualmente entre as partes”. Ou seja, abre a porta a que os trabalhadores possam “comprar” férias.
Em termos de tempo de trabalho, o Bloco quer, ainda, consagrar na lei a possibilidade de os trabalhadores optarem pela semana de quatro dias, sem perda de rendimento e com redução efetiva do horário semanal (atualmente já existe a figura do horário concentrado que permite trabalhar as mesmas horas mas em menos dias, o que pode, porém, implicar mais horas de trabalho diário para não haver perda de salário; a ideia do Bloco é que haja uma efetiva redução do horário).
A semana de quatro dias foi uma das bandeiras do Livre nesta legislatura, que conseguiu ver implementado um projeto-piloto no setor privado — com efeitos positivos a nível de perceção, pelos trabalhadores, na sua saúde mental e conciliação entre vida profissional e pessoal, mas ainda sem dados sobre a produtividade. O partido de Rui Tavares quer continuar a experiência e levá-la também para a administração pública (algo que estava previsto, mas que não avançou devido às eleições antecipadas).
Quer promover, ainda, a inclusão da semana de quatro dias na contratação coletiva e nos acordos de empresa, e trabalhar para uma experiência a nível nacional. E embora não o refira no programa eleitoral, já disse, ao Público, que o alargamento do projeto-piloto pode passar por recorrer à rearrumação dos feriados em 2026 e 2028 para uma avaliação mais alargada. Se isso fosse feito, “podemos ter um trimestre inteiro de semanas de quatro dias em 2026 e outro em 2028”. Seria, frisa, numa base voluntária.
De forma semelhante, o PAN inscreveu no programa a ideia de garantir que os feriados nacionais que se realizam aos fins de semana possam ser celebrados no dia útil seguinte, e rearrumar os feriados para possibilitar o gozo do dia de descanso por feriado nacional conjuntamente com o fim de semana, quando o feriado ocorra durante a semana.
O partido de Inês de Sousa real também propõe consagrar a terça-feira de Carnaval como feriado obrigatório e generalizar a semana de quatro dias até ao final da legislatura e que seja incluída na contratação coletiva. Numa fase inicial, seria implementada, preferencialmente, em territórios do interior ou com poucos habitantes.
Pedro Gomes: “Numa semana de quatro dias pode haver pessoas que queiram monetizar” o dia livre
Sobre o teletrabalho, quer fomentar o recurso a esta forma de trabalho, “numa perspetiva de sustentabilidade ambiental, coesão territorial e apoio à conciliação da vida familiar”, mas não especifica. Quem também não detalha é a IL, que tem uma medida para “agilizar” soluções “descentralizadas” com medidas de “cariz fiscal“; enquanto o PCP fala em “legislar no sentido de assegurar” a quem está em teletrabalho que todos os equipamentos de trabalho são fornecidos pela empresa, e fixar um valor de ajudas de custo, isento, para compensar o acréscimo de despesa (atualmente, segundo a lei, depende de um cálculo, mas muitas empresas já pagam um valor fixo).
O Livre refere a intenção de “apoiar o teletrabalho para tirar pressão das cidades e povoar zonas menos habitadas”, com o alargamento do direito a trabalhadores com filhos ou dependentes até aos 12 anos imporem o regime (atualmente é 8 anos), assim como grávidas, trabalhadores com doença crónica ou incapacidade igual ou superior a 60% e trabalhadores-estudantes. E garantir a quem está em teletrabalho os mesmos direitos de quem está em presencial, como “apoio da Segurança e Saúde no trabalho” para verificação das condições do local de trabalho em casa, se pedido pelo trabalhador ou profissional de saúde da empresa. O Bloco indica, por sua vez, o alargamento do novo regime de teletrabalho às pessoas com deficiência.
A AD também fala em “promover a flexibilidade no local de trabalho“, em termos de horário, teletrabalho e licenças parentais, “permitindo que os pais ajustem os horários para melhor conciliar as responsabilidades familiares e profissionais”. Ou seja, já alude à ideia de flexibilização de horários, com mecanismos como a adaptabilidade (que permite que numa empresa o trabalhador possa fazer mais horas num dia, ou semana(s) e compensar mais tarde, desde que no período em causa a média de horas não seja ultrapassada). Esta figura não costuma ser vista com bons olhos pela esquerda por entender que pode ser sinónimo de horas extraordinárias não pagas. O Chega também menciona a promoção de “incentivos fiscais” a empresas com políticas amigas das famílias, flexibilização de horários para mães e pais e “incentivo ao teletrabalho”.
No capítulo da flexibilidade, o partido de André Ventura sugere, ainda, mudar o regime de horário flexível dos trabalhadores com responsabilidades familiares quando ambos os progenitores têm a mesma entidade empregadora, para que pelo menos um possa ter horário flexível. Mas não especifica, em concreto, a alteração que quer fazer.
A AD, por sua vez, inscreveu uma “maior adaptabilidade dos tempos e modos de trabalho de forma a dar resposta aos desafios que o equilíbrio entre vida pessoal e profissional colocam aos trabalhadores e empresas”, com o reforço da possibilidade de um trabalhador transitar, ainda que de forma temporária, entre regimes de horário de trabalho. Ou mesmo um “enquadramento flexível” de transição entre durações do período normal de trabalho semanal, mesmo temporário, com um “possível” ajuste percentual da remuneração, “permitindo um contacto mais ligeiro” com o mercado laboral se isso for desejo do trabalhador. Ou seja, maior flexibilidade que permita ao trabalhador, temporariamente e se o entender, reduzir horários de trabalho, mas com redução salarial proporcional.
A IL, por sua vez, quer “restabelecer mecanismos de flexibilidade no horário” desde que por acordo entre entidade patronal e trabalhador. Refere-se aos bancos de horas individuais, que acabaram com as alterações à lei laboral, em 2019, mas que quer ver de volta (só se mantiveram os grupais, que são determinados por acordo com um grupo de trabalhadores). Os bancos de horas são semelhantes ao regime de adaptabilidade e preveem que o acréscimo de horas trabalhadas seja compensado com dias de férias ou de descanso.
Neste sentido, os liberais entendem que o horário normal de trabalho pode ser aumentado até duas horas por dia, 50 horas por semana e 150 horas por ano. Esse banco daria ao trabalhador, na visão da IL, “maior flexibilidade na forma como pretende ser compensado pelo trabalho que realiza fora do horário”, uma vez que pode ocorrer “sob a forma de redução do trabalho exigido de forma proporcional ao trabalho realizado fora de horas”.
Já o Livre quer rever e aumentar a dotação orçamental do existente “Programa para a Conciliação”, de forma a promover a flexibilidade de horários, os horários adaptados, ou definir horas limites para reuniões; e reforçar a fiscalização do “direito a desligar”.
Por outro lado, o PCP fala em revogar “as normas que instituem sistemas de bancos de horas e de adaptabilidade” e o “combate ao prolongamento da jornada diária”. E garantir que a semana de quatro dias não implica um aumento do horário diário ou diminuição do salário ou outros direitos. Na mesma linha, o Bloco propõe a criação de um livro verde sobre o tempo de trabalho que faça um levantamento da extensão do recurso à adaptabilidade e aos bancos de horas, assim como ao trabalho noturno. Também sugere o combate à “desregulação dos horários” e limites à figura da “isenção de horário“.
Visões antagónicas na lei laboral: deve ser mais fácil despedir e contratar?
A esquerda tem várias propostas, muitas delas repescadas, para mudar a lei laboral, revertendo nalguns casos leis do próprio governo de António Costa ou do Executivo de PSD/CDS. Já do lado da direita, a AD e a IL têm propostas que, resumidamente, visam mais flexibilidade. São visões antagónicas sobre o que a lei laboral deve fazer. O PS, por sua vez, não propõe grandes alterações de substância.
No lado da esquerda, Bloco e PCP repescam muitas ideias que têm sido cavalos de batalha nos últimos anos. Os dois partidos concordam no restabelecimento do valor das compensações por despedimento tal como estava antes da troika (atualmente é de 14 dias por cada ano de trabalho, mas querem que seja um mês). Assim como a reposição do princípio do tratamento mais favorável (norma que estabelece as matérias laborais que só podem ser alteradas por contrato coletivo se este fixar critérios mais favoráveis do que o Código do Trabalho, que já se aplica a algumas matérias, não a todas), o fim da caducidade (que permite que contratos coletivos caduquem) ou a reposição do valor a pagar pelas horas extraordinárias, uma reivindicação apoiada pelo Chega (essa reposição foi feita mas apenas acima da 100.ª hora).
O partido de André Ventura também quer que as horas extraordinárias estejam isentas de IRS e Segurança Social e reduzir em metade a incidência contributiva e fiscal sobre o subsídio de turno.
O Bloco propõe, também, consagrar como obrigatório o subsídio de alimentação pago pelas empresas (hoje é opcional) e restringir a contratação a prazo apenas às situações de substituição temporária e sazonalidade. Defende ainda que se limitem os fundamentos e a duração do trabalho temporário a um máximo de seis meses. Está, também, nos seus planos proibir despedimentos, exceto por justa causa, em empresas com resultados positivos no ano anterior.
Os trabalhadores por turnos aparecem, também, em vários programas eleitorais. O Bloco fala em dar-lhes “mais direitos”, com a consagração legal da obrigatoriedade de subsídio de turno ou maior acompanhamento médico, tal como o PAN que pretende rever os critérios de compensação e descanso. O PCP, por sua vez, inscreve a “limitação legal do trabalho em regime de turnos e laboração contínua”. Aliás, os comunistas querem proibir que os estabelecimentos de venda ao público, incluindo centros comerciais, abram aos domingos e feriados.
Em relação aos trabalhadores independentes, o Bloco exige a regularização dos chamados falsos recibos verdes, instituindo metas anuais “ambiciosas” para a Autoridade para as Condições de Trabalho (ACT), e incluir um critério de exclusão de empresas com “situações precárias irregulares” em contratos com o Estado. O PCP também fala na adoção de um plano nacional de combate à precariedade e falsos recibos verdes. E o Livre quer estabelecer uma retribuição horária mínima para os trabalhadores independentes e aumentar o valor a partir do qual deixam de estar isentos de IVA e retenção na fonte.
No seu programa, o Bloco também indica o combate ao “abuso” de outsourcing e promover a participação de representantes eleitos dos trabalhadores em cargos de gestão de empresas com mais de 250 trbaalhadores.
Vários partidos também se debruçam sobre o trabalho nas plataformas digitais (como Uber, Bolt e Glovo), com o Bloco a pedir que se elimine a figura do intermediário (mais comum nos TVDE do que nos estafetas) da presunção de laboralidade (a nova lei prevê que o contrato de trabalho possa ser reconhecido com o intermediário em vez de com as grandes empresas). Os bloquistas, admitem, aliás, incentivos à criação de plataformas digitais públicas e cooperativas, designadamente na área dos transportes e das entregas. Da mesma forma, o PCP quer que o cumprimento da lei seja assegurado de forma a garantir o reconhecimento de vínculos e de direitos como férias pagas ou horário máximo de trabalho.
Por sua vez, o PAN mostra preocupação com os efeitos das alterações climáticas na saúde dos trabalhadores e inscreveu uma medida para adaptar a legislação laboral de forma a estabelecer regras de limitação de prestação de serviço que “envolva a exposição do trabalhador a fenómenos climáticos extremos“. Também quer criar um fundo nacional de transição justa que permita assegurar a reintegração profissional dos trabalhadores afetados pela crise climática.
Também propõe “apoiar a fixação de migrantes digitais nas áreas de baixa densidade populacional”, desenvolver campanhas de informação e criar estratégias de prevenção do burnout, assim como rever o sistema de quotas de emprego para pessoas com deficiência.
Na direita, além das alterações já referidas, a AD traça como meta “reduzir a população com contrato a termo” e desenvolver um “programa que estimule a contratação de doutorados pelas empresas“.
Especificamente sobre a contratação sem termo, a IL entende que os trabalhadores estão hoje sujeitos a períodos de aviso prévio “demasiado longos” quando se despedem, pelo que quer diminuir este prazo “até duas semanas, de acordo com o grau de dificuldade expectável para o empregador o substituir”.
Em termos de legislação laboral, os liberais querem “evoluir” para um regime de “flexisegurança” em que as saídas e entradas no emprego são mais flexíveis mas, diz, “o apoio e segurança na procura de emprego é maior”. Por exemplo, “pretende-se aumentar as situações que permitem o acesso ao subsídio de desemprego, reduzindo a duração máxima desse subsídio“. E propõe remeter mais condições contratuais para a contratação coletiva e negociação individual, como os mecanismos de mobilidade, os períodos experimentais ou o tempo de trabalho. Os liberais mostram ainda intenção de uniformizar as relações de emprego do setor público com as do privado acabando com o que dizem ser “discriminações”.
Concertação social com nova cara e muitos temas para discutir
A concertação social é um órgão consultivo que junta governo com as confederações patronais e centrais sindicais. Foi nesta sede que o governo firmou o chamado acordo de rendimentos e é onde o governo leva a discussão o aumento do salário mínimo.
O PS garante, no programa eleitoral, que não vai desistir do acordo de rendimentos, que vigoraria até 2026, mas fala em “renovar” os compromissos que nele constam e alargar o seu horizonte, assim como “reforçar” os meios para o viabilizar. E atira para esta sede a discussão sobre o “instrumentos de melhoria das situações laborais das empresas” como o “aumento da transparência sobre os níveis de rotatitividade” (quando a empresa recorre muito a contratos a termo) e sobre os leques salariais praticados.
Já à direita, a ideia comum é dar um novo rosto à concertação social. A AD garante que irá dar “um novo impulso“, procurando maior convergência entre empresários e trabalhadores “em torno do objetivo de aumentar a produtividade”.
A IL também quer fazer alterações neste órgão e tem várias sugestões para o efeito: fala em aumentar a “transparência” das taxas de filiação de cada parceiro social, que teria de divulgar regularmente o número de empresas afiliadas (no caso das confederações) e o número de trabalhadores inscritos em cada sindicato e central sindical como um todo.
Também prevê alargar a concertação social a outras organizações, com níveis de representatividade “mínimos”, incluindo aqueles que não têm representação sindical, por entender que, atualmente, a concertação social pode não representar o tecido empresarial e trabalhadores em Portugal. Tem, ainda, em mente, um novo modelo orgânico em que o presidente (do Conselho Económico e Social, onde funciona a concertação social) seja nomeado pelo Presidente da República sob proposta do Governo (atualmente é nomeado pela AR) e sujeito a uma audição prévia na AR. Já Chega, PAN, Bloco e PCP não têm uma menção à “concertação social” no seu programa eleitoral.
O Livre, por sua vez, tem a ideia de promover, nesta sede, o debate sobre o “Programa da Conciliação”, que já existe, com vista à melhoria da conciliação entre vida pessoal, familiar e profissional e que o partido quer rever e alargar.
Vários outros temas são atirados para a concertação social: o debate sobre a sustentabilidade da Segurança Social, no caso do PS e da AD; o salário mínimo (incluindo a IL); o aprofundamento da proteção laboral dos trabalhadores das plataformas digitais (como a Uber, Bolt e Glovo) (PS); o reforço dos meios alternativos de resolução de conflitos em matérias laborais (PS); diálogo sobre a segurança e saúde no trabalho (PS); chegar a novo acordo até 2030 sobre formação profissional (PS); a criação de sistemas complementares de Segurança Social (PS); negociar critérios de representação empresarial e sindical mínimos para publicação de portarias de extensão das convenções coletivas (AD); definição das regras da relação laboral ajustadas à realidade de cada setor (AD); formação e qualificação (AD); convergência em torno do aumento da produtividade (AD).
A mira nos estágios não pagos, apoios à contratação e as ideias para a formação
Há algumas propostas para combater o desemprego e também para melhorar a formação dos trabalhadores. Especificamente sobre os jovens, várias medidas querem garantir que os estágios são pagos: o Chega quer assegurar “estágios profissionais pagos“, o Bloco fala em limitar a utilização “abusiva” de estágios apoiados pelo Instituto do Emprego e Formação Profissional (IEFP) e reforçar a fiscalização aos falsos estagiários e estágios sucessivos para ocupar funções permanentes.
O Chega tem, ainda, uma proposta para reduzir temporariamente em 50% a taxa contributiva a cargo do empregador que contrate jovens à procura do primeiro emprego, até perfazer 30 anos. Também inscreveu a criação de incentivos para que as empresas contratem emigrantes portugueses, com isenção parcial ou total do pagamento de contribuições para a Segurança Social na parte relativa ao empregador.
Já o Livre tem a ideia de substituir a subsidiação de “ocupações precárias, como estágios profissionais e contratos de emprego-inserção por oportunidades reais de formação e inserção produtiva com contratos de trabalho”, assim como alargar o direito a férias para estagiários. E admite mesmo o fim dos estágios não remunerados. O PAN, por sua vez, quer o reforço dos incentivos para conversão de estágios em contratos sem termo e o aumento significativo das bolsas atribuídas através dos estágios profissionais do IEFP.
Já o PS quer “estimular” o contributo dos empregadores para soluções de habitação dos trabalhadores. Era um dos pontos que já constava na revisão do acordo de rendimentos assinado em outubro na concertação social. No âmbito do Orçamento do Estado para 2024, ficou definido que ficam isentos de IRS os benefícios não monetários com habitação, desde que esta seja do empregador.
Já a propósito de formação, os socialistas comprometem-se a assegurar a “plena execução” do acordo assinado em 2021 na concertação social e querem negociações para um novo, até 2030, assim como uma lei quadro de formação profissional e lançar programas de formação especializada de curta e média duração em “setores críticos”. Assim como um reforço na formação dos jovens e jovens adultos e uma “avaliação regular” dos programas promovidos pelo IEFP, em particular estágios e apoios à contratação.
A AD, por sua vez, quer “reestruturar” o sistema de formação profissional, ajustando a oferta para as competências que “serão mais valorizadas” e alargar a diversidade dos cursos técnicos superiores profissionais. Também pretende desenvolver programas que formem quadros técnicos intermédios e focados nas competências tecnológicas e digitais e quer dar cheques-formação.
O Chega também fala em “aperfeiçoar a relação dos estabelecimentos de ensino profissional e universidades com o mundo profissional”, enquanto o PCP quer desenvolver programas de emprego e formação dirigidos a trabalhadores desempregados, com “particular atenção” aos de longa duração.
O Chega quer, também, simplificar o regime relativo aos acidentes de trabalho estratégicas de prevenção dos “riscos psicossociais em contexto laboral”, e como o PAN, avaliar a possibilidade de se criar a figura do psicólogo do trabalho. O PCP também propõe um programa nacional de prevenção de acidentes de trabalho e riscos profissionais.
Segurança Social. Partidos têm muitas ideias que pesam na despesa e só algumas na receita
Por sua vez, a IL fala em facilitar o acesso a creches quando ambos os pais são profissionais liberais ou trabalhadores independentes, permitindo que aceitem crianças com menos de três meses e que o cuidado a essas crianças possa ser prestado em períodos avulsos, flexíveis ou irregulares (por exemplo, um dia ou dois por semana, ou uma semana por mês). A maioria dos partidos concordam, ainda, no reforço dos meios humanos e técnicos da ACT e do IEFP.
O Livre também tem uma proposta para a criação de uma taxa ou contribuição extraordinária aplicada às empresas que despeçam ou extingam postos de trabalho “por introdução de automação e que recorram a software baseado na aprendizagem automática e modelação de contexto por dados para este fim”, ou que tenham uma “assinalável desproporção entre número de trabalhadores e lucro realizado”, – no caso de empresas tecnológicas, por exemplo. Não refere para que fim pode ser usada esta taxa, incluindo se para reforçar a sustentabilidade da Segurança Social.