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Quase 30% das crianças portuguesas entre os seis e os nove anos têm excesso de peso. A explicação pode estar no facto de ser entre os mais novos que se verificam hábitos alimentares mais desequilibrados, segundo dados do último Inquérito Alimentar Nacional: a percentagem de crianças e jovens que não consomem fruta e hortícolas, nas quantidades recomendadas pela Organização Mundial da Saúde (OMS) de pelo menos 400 gramas, supera os 65%. A par disto, 42% dos adolescentes bebe refrigerantes diariamente — destes, 25% bebe aproximadamente dois por dia. E a pandemia de Covid-19 pode ter piorado estas tendências: menos atividade física e alterações alimentares podem ter contribuído para o ganho de peso ao longo deste período.

Estas são algumas das razões que levaram a Direção-Geral da Saúde (DGS) a lançar um “Guia para Lanches Escolares Saudáveis”. E isto porque é dos lanches que provém “cerca de 25% da ingestão energética diária das crianças e jovens” — o que não significa que sejam propriamente saudáveis: batatas fritas, bolachas e bebidas açucaradas são “habitualmente” os produtos eleitos para esta refeição. E a oferta alimentar à volta das escolas também não ajuda a inverter esta tendência: “Na grande maioria dos casos, estímulos ao consumo de produtos alimentares com pouco valor nutricional, juntamente com o forte marketing e publicidade alimentar dirigida a crianças, são fatores que influenciam os seus comportamentos e preferência”.

No guia, essencialmente dedicado a encarregados de educação, mas também a professores, educadores e todos aqueles que possam condicionar o comportamento alimentar das crianças, dá destaque às refeições intercalares com indicações sobre como compor um lanche saudável, dicas, receitas e atividades para fazer com as crianças. Na nota introdutória, a diretora-geral da saúde lembra que “crianças mais saudáveis aprendem de forma mais eficaz”. “É importante investir na capacitação de toda a comunidade educativa, incluindo os encarregados de educação, para uma alimentação saudável”, afirma Graça Freitas.

O top três dos alimentos a incluir na lancheira

Como as refeições intercalares são “muitas vezes os contextos propícios para hábitos alimentares desequilibrados”, a DGS recomenda que os lanches das crianças e adolescentes sejam preparados em casa. Mas reconhece no entanto que representa “um grande desafio para muitos pais”. Para simplificar, o manual nomeia um top três dos grupos alimentares para os lanches:

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Fonte: DGS

Em jeito de resumo, a DGS recomenda que em cada lanche da manhã e da tarde seja incluído “um alimento do grupo dos laticínios, uma peça de fruta e um alimento do grupo dos cereais”. Mas dá outras opções de alimentos a incluir nas lancheiras das crianças e jovens:

90 a 100 gramas de hortícolas crus ou 45 a 50 gramas de hortícolas cozinhados. Embora reconheça que “não é tão comum”, a DGS também sugere colocar hortícolas nos lanches. Alface, tomate, tomate cherry, cenoura ralada, cenoura em palitos, couve roxa, beterraba, aipo, pepino, rúcula, são algumas das opções indicadas. “O ideal é variar os hortícolas ao longo da semana. Para dar sabor pode complementar com a introdução de ervas aromáticas a gosto”, sugere ainda o manual;

20 amêndoas, avelãs ou amendoins, cinco nozes ou uma colher de sobremesa de manteiga de amendoim. Desde que sejam naturais e sem sal adicionado, os frutos gordos como amêndoa, noz, avelã, pinhão, ou amendoim, podem ser incluídos nos lanches das crianças. “No entanto, o seu consumo deve ser feito com moderação pois apresentam um valor energético elevado. Recomenda-se o consumo de cerca de quatro porções por semana (de 20 gramas cada)”, indica a DGS, lembrando que os frutos gordos “podem ser consumidos inteiros” ou “triturados até obter uma pasta para barrar no pão”;

Três colheres de sopa de leguminosas cozinhadas. Também quanto às leguminosas a DGS indica que “podem ser incluídas nos lanches na forma de pasta para barrar no pão ou noutros formatos mais originais”. As leguminosas como, feijão, grão, ervilhas, favas, lentilha e tremoço, “são uma importante fonte de proteína vegetal, fibra e de ferro, bem como vitaminas do complexo B”.

As porções, as idades e sugestões. Como compor um lanche saudável?

Escolher os lanches da manhã e da tarde é um equilíbrio entre as preferências dos mais novos e as necessidades nutricionais — que variam consoante a faixa etária, mas não só. Também variam conforme estejamos a falar do lanche da manhã ou do lanche da tarde. “O lanche da tarde poderá ser idêntico ao pequeno-almoço, enquanto que a merenda da manhã deverá ser uma refeição mais ligeira”, alerta a DGS.

A composição nutricional dos lanches por grupo etário e por refeição (Fonte: DGS)

Assim, as porções que devem ser dadas aos mais novos variam consoante a idade. Por exemplo, uma criança entre os três e os nove anos devem ingerir apenas uma porção de fruta (entre 100 a 150 gramas) distribuída pelas duas refeições intermédias. Já um jovem dos 1o aos 18 anos pode ingerir entre uma e duas porções. Para ajudar a perceber como compor um lanche, a DGS tem no seu manual duas tabelas: uma com as quantidades que poderão ser distribuídas pelos dois lanches, por idade, e outra com um exemplo prático:

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Para tornar a tarefa de fazer lanches mais fácil, o guia da DGS também divide vários alimentos por três grupos. A verde, os alimentos a privilegiar: opções alimentares mais saudáveis, com nutrientes essenciais e com baixo teor de sal e/ou açúcar e/ou gordura. A amarelo, os alimentos a consumir “de vez em quando”: alimentos que contêm nutrientes essenciais, mas têm geralmente elevados teores de sal e/ou açúcar e/ou gordura. Por fim, a vermelho, os alimentos a evitar: alimentos que contêm elevados teores de sal e/ou açúcar e/ ou gordura e não fornecem geralmente nutrientes essenciais. Em duas tabelas, a DGS divide em listas os alimentos que pertencem a cada grupo e, depois, identifica as características nutricionais dos grupos de alimentos de acordo com essas três categorias:

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O guia faz uma sugestão de ementa semanal para o lanche da manhã e da tarde, de segunda a sexta-feira, para duas faixas etárias diferentes: dos três aos nove anos e dos 10 aos 18 anos. Uma sugestão que, segundo a DGS, mostra que “é possível ter uma ementa variada e com mais de 90% de alimentos que se enquadram no grupo dos alimentos a privilegiar“.

A sugestão de ementa semanal para dois lanches e duas faixas etárias (Fonte: DGS)

Por fim, o guia indica a “bebida que não pode faltar na lancheira”: a água. “Ofereça uma garrafa reutilizável e atrativa com que as crianças se identifiquem e incentive o consumo de água ao longo do dia”, sugere a DGS, lembrando que a desidratação “pode ser responsável por sintomas como dores de cabeça e cansaço afetando também a capacidade de concentração, atenção e memória”. O guia indica ainda os valores de referência de água que devem ser ingeridos diariamente, por idade e por sexo.

Valores de referência para a ingestão de água proveniente de bebidas

Pão de leite não é pão e os sumos de fruta não são fruta. As dicas para mostrar que “nem tudo o que parece é”

O guia dedica também uma secção para que quem organiza os lanches da criança não cometa erros ao substituir produtos saudáveis por outros aparentemente semelhantes. É o caso do pão, que é um alimento recomendado mas que acaba frequentemente por ser substituído pelo pão de leite. Só que “as diferenças entre a quantidade de açúcar e de gordura entre o pão de mistura e o pão de leite são bem visíveis”, explica a DGS.

Fonte: DGS

Outro dos erros apontados pela DGS diz respeito às comparações feitas entre a composição nutricional dos refrigerantes e dos leites aromatizados, como leite com chocolate, ou dos iogurtes, tendo por base o seu teor em açúcares. “Esta comparação direta é errada”, indica o guia. E porquê? Por três razões:

  1. Porque nos laticínios, como o leite e os iogurtes, cerca de 5 gramas de açúcar por 100g de produto diz respeito à lactose, um açúcar simples presente naturalmente no leite;
  2. Porque os laticínios fornecem outros nutrientes essenciais, como, por exemplo, proteína e cálcio;
  3. Porque muitos iogurtes apresentam uma quantidade de açúcar superior à do leite com chocolate, pelo que a leitura de rótulos é essencial em qualquer alimento, mesmo daqueles que nos parecem “saudáveis”.

Fonte: DGS

O guia aponta também que barras de cereais e bolachas “não são geralmente uma boa opção”. “São geralmente piores opções comparativamente aos flocos de cereais e pão” e “apresentam geralmente um teor mais elevado de açúcares e de gordura”, lê-se no guia.

Fonte: DGS

Por último, a DGS lembra que os sumos de fruta “não são equivalentes à fruta” nem a “substitui”. “Quando se reduz a fruta ao seu sumo, obtém-se um produto com menor quantidade de fibra e com elevada concentração de açúcar“, refere o guia.

Fonte: DGS

Criatividade, camuflar elementos e atividades com crianças. As dicas para convencer os mais novos a aderir aos lanches saudáveis

Nem sempre é fácil fazer com que as crianças e jovens apreciem os lanches saudáveis e ponham de lado os doces, as batatas fritas e os refrigerantes. É por isso que o guia da DGS dá quatro estratégias para incentivar as crianças e jovens:

  1. Incluir as crianças e adolescentes na compra, preparação e confeção das refeições. “A evidência científica tem mostrado que o envolvimento das crianças na preparação dos alimentos é um fator-chave para a melhoria dos hábitos alimentares”, explica a DGS;
  2. Ser criativo na apresentação dos lanches, apresentar opções coloridas e optar por lancheiras ou outros meios de transporte que sejam atrativos;
  3. Incluir produtos hortícolas e frutas de forma divertida, apelativa e fácil de consumir: palitos de cenoura, tomate cherry, maçã cortada em fatias com um elástico à volta para não oxidar;
  4. Quando a criança ou jovem recusar um alimento ou os equivalentes alimentares, tentar camuflá- los, como, por exemplo, no interior do pão ou misturando com o iogurte.

O guia dá sugestões de atividades concretas para envolver as crianças. É neste sentido que a DGS fornece aos pais materiais para facilitar a tarefa de incentivar os mais novos: uma ementa semanal de lanches; uma lista de compras para pedir às crianças que identifiquem os alimentos que são necessários comprar; e um descoficador de rótulos para que as crianças e jovens possam participar na escola dos alimentos— materiais aos quais pode aceder na fotogaleria abaixo:

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Além destas sugestões e materiais para as atividades, o guia da DGS para lanche saudáveis deixa ainda sete receitas “simples, saudáveis e saborosas”:

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Preparação, transporte e consumo. Os cuidados a ter

O último capítulo do guia da DGS é dedicado aos cuidados a ter na preparação, transporte e consumo dos lanches. “Neste período em que necessitamos de reforçar as medidas de higiene, será muito importante ensinar às crianças e aos jovens as boas práticas de higiene e segurança na cozinha”, aponta a DGS.

Assim, na preparação dos lanches, a DGS recomenda lavar muito bem as mãos antes de iniciar as atividades de culinária e lavar frequentemente durante todo o processo; usar avental e apanhar o cabelo, se for comprido; limpar as bancadas antes de iniciar a preparação e antes da confeção dos alimentos; evitar utilizar a mesma faca, garfo ou colher para alimentos diferentes; não misturar alimentos crus e cozinhados durante a preparação dos alimentos; e lavar bem os vegetais e a fruta antes de utilizar.

Quanto ao transporte dos lanches, o guia sugere que seja dada preferência a alimentos que não se alterem com o calor como o pão, frutos oleaginosos e algumas frutas e hortícolas previamente lavados. Caso contrário, se optar por alimentos mais perecíveis, como iogurtes, queijo, alguns tipos de frutas como melancia, melão, meloa, pêssego, cerejas, devem ser acondicionados numa lancheira ou mala térmica colocando placas frias para manter a refrigeração. Ainda assim, alimentos como os iogurtes devem ser consumidos no lanche de manhã para evitar a exposição a diferenças de temperatura por um período de tempo prolongado. Por fim, os alimentos frescos devem ser lavados em casa e transportados numa caixa fechada ou lancheira.

No momento do consumo do lanche, a DGS recomenda lavar bem as mãos, com água e sabão, durante 20 segundos, antes de iniciar a refeição e não partilhar alimentos nem objetos com outros colegas. E porque estamos em plena pandemia de Covid-19, o guia deixa algumas orientações que devem ser seguidas nos refeitórios das escolas. Além da lavagem frequente e prolongada das mãos e evitar partilhar comida ou objetos entre pessoas, a DGS sugere ainda que durante as refeições sejam adotadas medidas de etiqueta respiratória e que seja mantida uma distância de, pelo menos, um metro, relativamente aos restantes alunos, sempre que possível.