A invasão na Ucrânia é um “confronto entre civilizações”, entre o mundo democrático e o autocrático, e também uma “guerra existencial” para a Rússia e para a Ucrânia — sendo que só um pode vencer. Quem esboça este cenário é Borys Tarasyuk, atual representante de Kiev no Conselho da Europa, em Estrasburgo. O ex-deputado, que esteve no parlamento ucraniano durante 18 anos, e ex-ministro dos Negócios Estrangeiros acredita que os “sonhos dos russos” serão deitados por terra. Mas admite que uma eventual entrada da Biolerrússia no conflito possa desequilibrar as forças na guerra
Primeiro num encontro com jornalistas e, mais tarde, numa entrevista ao Observador no Parlamento Europeu, Borys Tarasyuk reforçou por mais do que uma vez que a solução passa por terminar o conflito o mais cedo possível e depois “desmilitarizar a Rússia”. Não com um intuito “provocativo”, mas apenas para que as tropas de Moscovo não consigam “restaurar as suas capacidades militares”, evitando que no futuro “ameacem novamente” outros países. “É a Europa que está enfrentar a Rússia” e a Ucrânia é apenas um “objeto para punir o mundo democrático”.
Demonstrando o seu apoio a Volodymyr Zelensky e revelando que votou no Presidente ucraniano em 2019, o diplomata critica o ex-chefe de Estado Petro Poroshenko: “Estava a usar a sua posição para se enriquecer a si e aos seus negócios”.
Ambassador Borys Tarasyuk held a press conference for 14 Portuguese journalists "Ukrainians have a say: how Europe is helping us".#StandWithUkraine pic.twitter.com/frIREvxh2F
— Ukraine in CoE (@UKRinCoE) July 7, 2022
O diplomata acredita no bom trabalho de Volodymyr Zelensky para conferir um futuro europeu para a Ucrânia, destacando estar “otimista” com a possibilidade de o país entrar na União Europeia (UE). “70% do trabalho para a adesão está feito”, realça Borys Tarasyuk, que afirma que os restantes 30% dependem da “rapidez de ação do parlamento ucraniano”.
Antevê, por isso, que “dentro de meses ou alguns anos” o país se torne Estado-membro da UE, apesar de não negar que existem problemas que podem obstaculizar o processo de adesão, tais como as questões que têm que ver com a corrupção no país.
“Ucrânia está pronta para a adesão à NATO”
No último comício da NATO, a organização militar não se comprometeu com a adesão da Ucrânia à NATO. Porquê?
É a guerra… Não penso que a NATO esteja pronta agora para falar da adesão.
E acredita que num futuro próximo que isso será possível?
Eu acho que é possível. Primeiro, porque esta guerra levou-nos a novas situações. As forças armadas ucranianas já possuem armas ocidentais. Será muito fácil incorporar a Ucrânia na NATO, muito mais fácil do que na União Europeia. Eu entendo que a NATO não queira falar agora sobre a adesão da Ucrânia, porque ninguém está a sonhar implementar o artigo quinto do tratado de Washington [que estipula que um ataque a um Estado-membro é um ataque a todos]. Mas acredito que a Ucrânia está pronta para a adesão.
Acredita que a Bielorrússia vai entrar na guerra?
É algo que preocupa as forças ucranianas. Sabemos que os bielorrussos não querem entrar na guerra, ainda hoje [na quarta-feira], no Conselho da Europa, falámos com a líder da oposição bielorrussa, Sviatlana Tsikhanouskaya, e discutimos o que se está passar na sociedade bielorrussa. Mas o cenário é preocupante, temos uma fronteira de milhares de quilómetros com a Bielorrússia. Podemos não ter forças militares suficientes para enviar para a fronteira bielorrussa.
Pensa que é um objetivo do Kremlin envolver a Bielorrússia na guerra?
Os bielorrussos já se envolveram na guerra contra a Ucrânia, apesar de não estarem a lutar diretamente contra os ucranianos. Indiretamente já são cúmplices na guerra contra a Ucrânia. A questão é como Alexander Lukashenko [Presidente da Bielorrússia] vai resistir à pressão de Putin para atacar a Ucrânia ou não.
Os países Bálticos, por exemplo, devem recear uma invasão russa?
Nenhum deles quer voltar à gaiola da União Soviética. Acho que depende de pessoa para pessoa, mas considero que não. Por exemplo, o bloqueio de mercadorias de trânsito de Kaliningrado [pela Lituânia] demonstra que não existe medo. A NATO também se está a precaver de qualquer ataque e até já reforçou a sua presença militar na Polónia e nos Estados Bálticos, algo que era contrário ao objetivo de Vladimir Putin.
De que forma avalia a resposta das instituições europeias à crise de refugiados ucranianos?
Não são refugiados, são pessoas deslocadas à procura de apoio temporário. Atualmente, sabe-se que 12 milhões de ucranianos estão deslocados, cinco milhões fugiram para o estrangeiro. Muitos encontraram apoio na Polónia, na Alemanha, na Eslováquia, na República Checa, França e em Portugal. Houve um sentido de solidariedade em vários países da UE, que providenciam vários apoios. Por exemplo, cinco das minhas netas estão em Estrasburgo.
E o restantes sete milhões de deslocados?
São deslocados internos dentro da Ucrânia. Fugiram da guerra porque perderam a casa e agora procuram melhores condições de vida.
Como é que a Ucrânia vê este esforço por parte de outros países?
Estamos gratos a países como França ou Portugal por estes sacrifícios, mas sabemos que podem representar um fardo para os governos.
O Observador viajou a convite do Parlamento Europeu