“Não fico eufórico quando as sondagens são muito boas”

Na entrevista desta segunda-feira no ISEG, Luís Montenegro foi confrontado com a possibilidade de representar uma liderança social-democrata “frouxa”, espelhada nos resultados de sondagens que colocam o PS – com 27,6% das intenções de voto se as legislativas fossem hoje – à frente do PSD, com 24,1%.

Perante as antevisões de eleições que não lhe dão margem de governação, Montenegro destacou que as “sondagens são um bom elemento de trabalho”, mas garantiu: “Não fico eufórico quando elas são muito boas e também não fico deprimido quando elas são menos boas”.

O presidente do PSD não tem dúvidas que as sondagens acusam um “desgaste enorme do PS” e desculpou-se com a duração de um “ano e poucos meses” da sua liderança para as dúvidas que os portugueses possam ter em relação à sua capacidade de ocupar o lugar de primeiro-ministro.

O certo é que, recuando até junho de 2023, Montenegro considerava, graças às então recentes sondagens, que seria “natural” que o PSD vencesse as próximas eleições legislativas. E até ia mais longe ao dizer que a vitória social-democrata seria com “maioria absoluta”.

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No dia 15 de junho, no mesmo dia em que o líder social-democrata discursou na abertura do Conselho Nacional do partido, foi publicada uma sondagem da SIC e Expresso que dava 31% dos votos ao PS e 30% ao PSD. Mesmo perante um resultado em que os sociais-democratas não ultrapassavam os socialistas, Montenegro cavalgou naquilo que classificou como uma “oportunidade enorme quando 50% das pessoas se declaram predispostas a votar à direita do PS”.

Na altura, ressalvou que não anda “ao sabor da sondagem do dia”, mas descrevia o resultado das sondagens de uma forma eufórica ou, no mínimo, muito entusiasmada.

Portanto, Luís Montenegro não está a ser rigoroso quando diz que nunca ficou “eufórico” com resultados de sondagens. Em junho utilizou precisamente os resultados de uma sondagem que colava o PSD ao PS para concluir, de forma entusiástica, que via nos resultados um bom ponto de partida para uma vitória social-democrata com maioria absoluta.

ERRADO

“Das três vezes que tivemos ajuda externa foi sempre na base de Governos socialistas”

Montenegro não perdeu a oportunidade de imputar culpas a António Costa e às sucessivas governações socialistas. “O PS tem sido ciclicamente responsável por desequilíbrios nas contas públicas em Portugal”, acusou. O líder social-democrata recordou ainda as três vezes que Portugal necessitou de receber ajuda externa em democracia e garantiu: “Foi sempre na base de Governos socialistas”.

De facto, Portugal foi intervencionado três vezes pelo Fundo Monetário Internacional (FMI): em 1977, 1983 e 2011. A intervenção mais recente, ainda fresca na memória de muitos, foi arma de arremesso entre os dois maiores partidos com os sociais-democratas a acusarem os socialistas de levarem o país à bancarrota e o PS a acusar o PSD de “ir além da troika“. Por muito que se debata se a execução foi para além do acordado, não há dúvidas que o processo negocial que antecedeu a chegada do FMI a Portugal em 2011 foi durante um governo do PS de José Sócrates. Além disso, esse governo tinha sido o responsável pela situação a que o país chegou, pois tinha governado nos seis anos anteriores.

Relativamente à primeira intervenção, em 1977, justificada pela alta taxa de desemprego, uma inflação crescente, a desvalorização do escudo e uma forte conflitualidade política pós 25 de abril, era o PS de Mário Soares que estava no Governo. Ou seja, neste caso eram igualmente os socialistas que lideravam o Executivo quando a ajuda externa chegou ao País.

Porém, seis anos depois, a situação não é tão clara. Em 1983, quando se deu a segunda intervenção, o Governo era formado por uma coligação pós-eleitoral PS/PSD liderada por Soares — um governo de “bloco central”,  criado após as legislativas de abril desse ano. Como recordava o Público em 2011 a degradação das contas públicas que levou à ajuda externa do FMI em 1983 começou com um Governo da Aliança Democrática (AD), que teria promovido políticas que — no entender do ex-governador do banco central Silva Lopes — tinham o único fim de “promover a vitória eleitoral do PSD-CDS”.

“Subiram os gastos orçamentais, valorizou-se o escudo, dificultou-se a vida aos exportadores, subiram as importações. Em resultado, o défice das transações correntes subiu de cinco por cento do PIB em 1980 para 11,5 por cento em 1981 e 13,2 em 1982. A dívida externa aumentou de 467 milhões de contos em 1980 para 1199 milhões em 1982”, recordava o jornal.

Assim, Luís Montenegro não erra ao dizer que sempre que Portugal precisou de pedir ajuda o PS estava no Governo. Mas em 1983 não estava sozinho, tinha o próprio PSD ao seu lado. Além disso: o governo de AD, liderado pelo PSD, tinha responsabilidades pela forma como geriu as finanças principalmente nos fase final do mandato (em 1982).

ESTICADO

“Os dois congelamentos [da carreira dos professores] que levaram ao período que foi perdido, foram os dois decididos pelo PS”

O líder do PSD aproveitou uma pergunta de um dos membros da audiência que assistia à sua entrevista no Town Hall da CNN Portugal, que decorreu no ISEG, para desviar atenções da contradição destacada pela jornalista que lhe lembrava que os sociais-democratas tiveram poder na Assembleia da República para descongelar em definitivo a carreira dos professores.

Montenegro não respondeu e preferiu destacar a incoerência socialista. Garante que o primeiro-ministro não se deve gabar de ter descongelado a carreira dos docentes em 2017 quando, afinal, “os dois congelamentos que levaram ao período que foi perdido, foram os dois decididos pelo PS”. É mesmo assim?

O social-democrata lembrou na entrevista que o primeiro congelamento decorreu em 2005. E é verdade, a Lei n.º 43/2005 determinou a “não contagem do tempo de serviço para efeitos de progressão nas carreiras e o congelamento do montante de todos os suplementos remuneratórios de todos os funcionários, agentes e demais servidores do Estado até 31 de Dezembro de 2006”. José Sócrates tinha tomado posse em março de 2005, pelo que eram os socialistas que estavam no poder.

O segundo congelamento, tal como relembrado por Montenegro, data de 2011, com Portugal à beira da bancarrota. Foi novamente o Executivo de José Sócrates que, através do Orçamento do Estado de 2011 voltou a congelar as carreiras, descongeladas temporariamente entre 2008, 2009 e 2010.

As carreiras dos professores ficaram congeladas até janeiro de 2018, ou seja, durante toda a governação de Pedro Passos Coelho marcado pela intervenção da troika e níveis de austeridade que deram origem a forte contestação social.

Apesar de o PSD ter mantido o congelamento, conclui-se que o líder do PSD tem razão quando afirma que os dois congelamentos da carreira dos docentes foram promovidos por Executivos socialistas.

CERTO

“Não foi o PSD que inviabilizou a solução Portela+Montijo [para o novo aeroporto]”

Montenegro aproveitou a presença na mesma série de entrevistas em que o primeiro-ministro esteve presente para acusar António Costa de “faltar à verdade” quando se sentou no lugar que ocupava na noite desta segunda-feira.

“Não disse aqui a verdade toda a semana passada sobre este processo”, acusou, referindo-se à escolha de um novo aeroporto para servir Lisboa. E acrescentou: “Responsabilizou o PSD por não ter concretizado a decisão que o Governo anterior, de Pedro Passos Coelho, tinha tomado com a decisão Portela mais Montijo.”

Para Montenegro “não foi o PSD que inviabilizou essa solução”, mas sim “os parceiros que na altura suportavam o PS e o Governo na Assembleia da República”. Ou seja: as câmaras comunistas que não deram apoio político necessári0 para viabilizar a opção em cima da mesa.

Ora, em causa está o indeferimento, em 2021, da Autoridade Nacional para a Aviação Civil (ANAC) do pedido de avaliação do projeto para o Montijo, alegando a falta de parecer positivo de todas as câmaras afetadas pela construção do novo aeroporto — as autarquias da Moita e do Seixal votavam contra.

O Governo propunha então a alteração da lei que fazia depender a decisão da localização da aprovação das autarquias. Ora, Rui Rio, então líder do PSD, recusou viabilizar qualquer alteração legislativa sobre o aeroporto do Montijo para se “adaptar a uma circunstância” em concreto. Neste caso a de impedir que os vetos das autarquias travassem a obra. Rio apelava a que o Governo dialogasse com os municípios em causa.

Mais tarde o antigo líder do PSD mudou de ideias e já assumia que, se a lei se aplicasse a todos os projetos em “cima da mesa”, poderia ser alterada.”Se o Governo abrir a localização do aeroporto de Lisboa, precedida de uma avaliação ambiental estratégica, em que fique em aberto (a localização), no Montijo ou noutro sítio qualquer, nós estamos disponíveis para colaborar com o PS para eliminar a lei do PS e para que as câmaras municipais sejam ouvidas, mas não possam ter o direito de veto”, explicava em setembro de 2021. Acabaria por deixar a liderança do partido depois das legislativas desse ano.

Assim, Montenegro não tem razão quando garante que não foram os sociais-democratas a inviabilizar a solução para o novo aeroporto, embora, de facto o primeiro entrave tenha sido colocado pelas autarquias da Moita e do Seixal.

ENGANADOR