Os elementos das forças de segurança preparam-se para voltar aos protestos. Depois de nos primeiros meses do ano se ter registado um aumento da contestação, as negociações entre sindicatos e Ministério da Administração Interna, com vista a um aumento do valor pago pelo suplemento de missão, permitiram uma tranquilidade momentânea. Mas, esta sexta-feira, o ministério de Margarida Blasco deixou claro que não vai rever em alta a última proposta colocada em cima da mesa — e a resposta pode passar por novas paralisações na PSP e GNR.
A Plataforma dos Sindicatos da PSP e Associações da GNR esteve reunida esta sexta-feira para decidir o futuro das negociações para o aumento do suplemento de risco. Precisamente quando decorria o encontro entre vários representantes sindicais — e no qual já não estiveram presentes duas das estruturas que abandonaram as negociações no início da semana — terá tido lugar uma conversa informal com o Ministério da Administração Interna, apurou o Observador, tendo a tutela sublinhado que mantinha a proposta apresentada esta terça-feira.
Ao Observador, o Ministério da Administração Interna refere que Margarida Blasco “disponibilizou-se para, até ao final do dia de hoje, sexta-feira, 7 de junho, receber quaisquer contrapropostas das associações socioprofissionais e sindicatos das forças de segurança”. No entanto, acrescentou a tutela, “formalmente, as referidas associações socioprofissionais e sindicatos não remeteram, até ao momento, qualquer proposta”.
E a plataforma mantém a sua posição: não será apresentada nenhuma contraproposta. “Só estaremos disponíveis para nova reunião se estiverem disponíveis para aumentar” o valor pago pelo suplemento de missão, refere ao Observador o representante da plataforma que reúne sindicatos da PSP e da GNR, e também presidente do Sindicato Nacional dos Oficiais de Polícia, Bruno Pereira.
Em comunicado emitido ao final desta sexta-feira, os polícias acusaram o primeiro-ministro, Luís Montenegro, de “estar a faltar ao compromisso que assumiu” com a plataforma a 1 de fevereiro deste ano, “data na qual afirmou que iria ‘reparar’ a injustiça face aos colegas da Polícia Judiciária”. Para os elementos da GNR e da PSP, Montenegro “não deu ainda qualquer passo para o concretizar, estando apenas a introduzir uma atenuação ligeira face à enorme desigualdade que foi concretizada”. Desta forma, apelam que, “tendo em vista uma convergência que amplamente se almeja, e que sobretudo traga paz e dignidade a estes milhares de profissionais, se faça um último esforço no sentido de atingir, mais do que um valor de aumento histórico, um valor que seja historicamente digno”.
A porta fica aberta para que o Governo apresente uma nova proposta. Na última reunião, o ministério de Margarida Blasco admitiu a possibilidade de o suplemento de risco sofrer um aumento de 300 euros (200 já em julho deste ano, e mais 50 euros no início de 2025 e, novamente, no início de 2026). A este valor acrescia a vertente fixa do suplemento, determinado em função do ordenado base de cada militar da GNR e elemento da PSP.
Esse cenário não agradou à plataforma negocial, que exigia um aumento de 400 euros na componente fixa deste suplemento, 100 euros acima da proposta do ministério. Esta sexta-feira, e sem possibilidades de acordo no horizonte, os sindicatos discutiram as novas formas de retomar os protestos, ainda que não tenha ficado definido um plano de ação. Na próxima semana, a plataforma vai reunir novamente, num encontro que não tem ainda data marcada. Dessa reunião deverão sair decisões sobre novos protestos.
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Rutura entre sindicatos. Sinapol não vai continuar negociações
Na reunião desta sexta-feira, apenas um sindicato não esteve presente sem avisar: o Sindicato Nacional da Polícia (Sinapol). Ao Observador, Armando Ferreira, presidente deste sindicato, confirmou que, depois de ter abandonado a reunião das negociações de terça-feira, não voltará ao Ministério da Administração Interna, mesmo que a plataforma que reúne os mais de 10 sindicatos da PSP e da GNR volte a reunir-se com Margarida Blasco.
“Como base naquilo que aconteceu, não há qualquer hipótese”, refere Armando Pereira, acrescentando que “o Sinapol já não está nas negociações”. Aliás, este sindicato só volta a reunir-se com Margarida Blasco “se o Governo disser que vai dar um suplemento igual ao da PJ a todos”.
Neste momento, abandonadas as negociações, o Sinapol está a tentar encontrar uma solução através dos grupos parlamentares. Também ao Observador, Armando Ferreira avançou que já foram realizadas reuniões com a Iniciativa Liberal, PCP, PSD e CDS. Apesar da reivindicação da maioria dos sindicatos se fixar no aumento de 400 euros, este sindicato quer que o aumento chegue perto dos 600 euros, tal como aconteceu com a Polícia Judiciária no final do ano passado.
As últimas propostas
As propostas da tutela foram evoluindo a cada nova reunião com a plataforma negocial. As primeiras duas propostas começaram por dividir os suplementos em três categorias, deixando de lado o sistema de suplemento bipartido. No primeiro documento apresentado, estabelecia-se um aumento de 7% para guardas e agentes, de 9% para sargentos e chefes e de 10% para oficiais.
Estes valores seriam sempre calculados tendo como referência o ordenado do comandante-geral da GNR e do diretor nacional da PSP, que é fixado pela tabela remuneratória única e pela posição 86 — que corresponde a 5.216,22€ brutos mensais. Assim, o aumento seria de 365 euros para guardas e agentes, 469 euros para sargentos e chefes e 625 euros para oficiais.
Recusada esta proposta, a ministra Margarida Blasco voltou com a mesma fórmula, mas com mais dinheiro. A segunda proposta estabelecia um aumento de 10% para guardas e agentes (521 euros), de 12% para sargentos e chefes (625 euros) e de 14% para oficiais (730 euros) — um aumento de 156 euros face à proposta anterior.
Já na última reunião, que decorreu esta terça-feira, Margarida Blasco apresentou duas propostas. A primeira foi de imediato recusada pelos sindicatos e passava por aumentar já este ano a componente fixa do suplemento em 190 euros e aumentar 40 euros no próximo ano. No fundo, a tutela aceitou um aumento faseado, mas apresentou apenas mais 50 euros do que na última reunião.
Só a segunda proposta, que estabelecia um aumento de 300 euros, não foi de imediato recusada pelos sindicatos, apesar de a reunião ter acabado da mesma forma que as anteriores: sem acordo.
O movimento Inop
No início do ano, em menos de 48 horas, um grupo conseguiu reunir quase 16 mil membros numa rede social e dar início a uma série de protestos a nível nacional, que passava por declarar os carros da PSP e da GNR como inoperacionais — daí nasceu o nome movimento Inop.
Assim, todos os carros que apresentavam algum tipo de problema e que, até esta altura, circulavam normalmente, passaram a ficar estacionados à porta das esquadras e a ser declarados “inoperacionais”. As avarias reportadas eram várias: mudanças, problemas no motor, pneus carecas, vidros partidos, luzes avariadas. Depois disto e, uma vez que os agentes não são obrigados a utilizar meios que não assegurem a devida segurança, começou a ser dada ordem para que os agentes fossem a pé até aos locais onde estavam a ser reportados incidentes.
Na base dos protestos estava a aprovação do suplemento de missão para a Polícia Judiciária, cujo diploma foi promulgado por Marcelo Rebelo de Sousa no final do ano passado. Este suplemento de missão veio substituir o suplemento de risco e está reservado aos inspetores da carreira de investigação criminal, da carreira de especialista de polícia científica e da carreira especial de segurança da PJ.
No caso dos inspetores da carreira de investigação criminal — que corresponde ao valor mais elevado de suplemento –, estes elementos recebem 996 euros de suplemento de missão, o que representa um aumento de 518 euros em relação ao valor anterior. Já para os especialistas de polícia científica, o valor deste suplemento pode variar entre os 797,55 e os 864,02 euros e, por último, para a carreira especial de segurança da PJ, o valor do suplemento fixa-se no 664,63 euros.