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Maria Gralheiro

Maria Gralheiro

TeleSaúde. Até ir a uma consulta de dentista pode ser à distância

Mais de metade das consultas médicas nos Estados Unidos já são feitas à distância. A “revolução” já chegou a Portugal, dizem especialistas reunidos na eHealth Summit, em Lisboa.

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Se o leitor for um doente crónico — algo que mais de 50% dos portugueses são — não estranhe se, numa das próximas consultas com o médico que o segue ele lhe perguntar o que acha de, na próxima vez, falar sem estar olhos nos olhos. E não estranhe, também, se ele lhe entregar um aparelho de medição de tensão arterial, por exemplo, que vai enviar uma leitura para o hospital, todos os dias e de forma automática. A “revolução” da TeleSaúde está a chegar à Europa e já chegou a Portugal.

Esta é a garantia de vários especialistas que se reuniram no final da semana passada no Parque das Nações, para a segunda edição da eHealth Summit, uma organização dos Serviços Partilhados do Ministério da Saúde (SPMS) em que os vários milhares de participantes puderam não só assistir às palestras e mesas-redondas (com cerca de 200 oradores) como, também, visitar a área de exposição onde cerca de 80 empresas e 45 startups apresentaram as suas propostas para a inovação no setor da saúde.

O que melhor se faz em Portugal em 'ehealth'

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O eHealth Summit 2018 decorreu entre 20 e 23 de março na Altice Arena e PT Meeting Center, no Parque das Nações em Lisboa. A iniciativa promoveu fóruns e conferências sobre temas como estratégia, cibersegurança, envolvimento da indústria, desmaterialização, literacia do cidadão e eprocurement digital. O evento anual é um meio para promover “o que de melhor se faz em Portugal na área do ‘ehealth’ (informática aplicada à saúde)”, explicou Henrique Martins, o presidente dos Serviços Partilhados do Ministério da Saúde (SPMS), organizador do evento.

A tal consulta à distância que lhe pode ser sugerida num futuro encontro com o seu médico — e o tema mais alargado da TeleSaúde — foi uma “revolução” discutida em várias palestras e numa mesa-redonda em que o cardiologista Daniel Ferreira, do Hospital da Luz, contou como funciona o centro digital clínico que fundou, em conjunto com uma colega neurologista, no hospital lisboeta.

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Esse centro digital clínico já envolve mais de 50 médicos no Hospital da Luz, com 12 especialidades diferentes que já estão a usar meios digitais para monitorizar à distância a saúde dos utentes e para fazer consultas médicas de acompanhamento de doentes crónicos através de videoconferência.

Até um colega da estomatologia, conta o cardiologista Daniel Ferreira, já perguntou ao coordenador do projeto se não pode dar consultas à distância. “Julguei que era brincadeira, mas afinal era para uma coisa muito específica, o acompanhamento de doentes com disfunção da articulação do maxilar”, pelo que até mesmo aqui — numa consulta de dentista — pode fazer sentido haver uma teleconsulta.

Quem está doente fala com o “Dr. Google”. Quer uma segunda opinião? Vai ao “Dr. Yahoo”

80 empresas e 45 "startups" na zona de exposições

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Além das conferências, na zona de exposição era possível assistir ao trabalho dos enfermeiros no centro SNS 24 ou ver como funciona a receita eletrónica numa farmácia “a fingir”. Várias empresas apresentaram, também, soluções inovadoras para a saúde. Uma das propostas mais oportunas era da farmacêutica Pfizer, que mostrou aos participantes a aplicação móvel (app) que está prestes a ser lançada e que gere as vacinas de toda a família — sejam do Plano Nacional de Vacinação ou não. A “app” vai chamar-se Vaximate.

Acabaram-se os tempos d’”o senhor doutor manda, diz Daniel Ferreira. Hoje, os doentes querem envolver-se na gestão da própria saúde, já não são passivos, e isso está ligado também à digitalização. O doente de hoje já está habituado a usar os meios digitais para saber mais sobre a sua doença. “E não são só os mais jovens, os mais idosos também procuram informação porque até têm mais tempo livre e fazem muitas pesquisas”, defendeu o clínico na palestra que promoveu no eHealth Summit.

De um modo geral, “a maioria das pessoas quando tem algum problema vai perguntar ao Dr. Google. E quando quer uma segunda opinião vai ao Dr. Yahoo”, comenta o cardiologista Daniel Ferreira, que defende que os médicos também devem ter a responsabilidade de prescrever informação clínica, isto é, orientar os doentes para sites onde podem encontrar mais informação fidedigna e acessível sobre as suas doenças.

Os doentes já fazem os próprios diagnósticos. E muitos acertam

É esta maior proatividade do lado dos doentes que, a par dos progressos tecnológicos, faz com que tendências como a TeleSaúde sejam cada vez mais prevalentes. Muitos doentes crónicos — não todos, sublinham os especialistas — têm condições (e vontade) para colaborar com a monitorização da sua doença, recorrendo a equipamentos tecnológicos concebidos para esse fim. E faz sentido para muitos doentes (e também para os hospitais) que além do acompanhamento presencial haja consultas à distância.

As pessoas, a nível global, estão recetivas a receber este tipo de acompanhamento de saúde à distância”, garante Daniel Ferreira. “A pessoa saudável deveria ir ao médico uma vez por ano, mas uma pessoa com doença crónica controlada já precisa de duas a quatro consultas por ano. E se a doença não estiver controlada — por exemplo, se a diabetes não estiver bem ou se o colesterol não estiver bem — ele vai precisar de um número bem mais elevado de interações com o seu médico. E, como todos sabemos, é difícil nos nossos hospitais e centros de saúde acomodar a quantidade de consultas que são necessárias”.

A juntar a tudo isto, o envelhecimento da população e o aumento da esperança média de vida significa, também, mais doenças crónicas e mais anos a viver com elas. “Por isso, temos de ser criativos”, afirma o cardiologista.

Uma consulta como outra qualquer

Daniel Ferreira conta que, tipicamente, faz uma consulta presencial alternada com duas consultas remotas, no âmbito do centro digital clínico que co-fundou no Hospital da Luz e que funciona há mais de um ano. Os doentes em causa “são pessoas que são nossos doentes, que nós já conhecemos — não são primeiras consultas, nunca — e que nós convidamos a fazer um seguimento em que algumas das consultas possam ser feitas remotamente”, explica o cardiologista. O doente tem de assinar uma declaração de consentimento para participar neste programa.

O centro clínico digital é, desde logo, o depositário seguro dos registos de saúde que o doente regista e envia para, depois, no dia da consulta, serem analisados pelo médico. O médico recorda que “nós, os médicos, já fazíamos isso, dávamos papelinhos para as pessoas irem medindo a pressão arterial e tomando nota, mas a ideia é que isto fosse mais estruturado, igual para todos, e para ser mais fácil a informação ser inteligível no dia da consulta”.

O centro clínico digital do Hospital da Luz já alberga mais de 50 médicos e 12 especialidades, explica Daniel Ferreira, cardiologista que co-fundou o projeto.

“É mais prático e seguro do que o email ou o sms que muitas vezes se manda”, diz Daniel Ferreira, que lembra que outra vantagem de um registo digital bem organizado está ligado à comunicação não programada. “Os doentes quando nos ligam têm expectativa de que não só saibamos perfeitamente qual é a doença do sr. António. Eu não tenho memória suficiente para isso, o meu chip já está gasto, arrisco-me a dar conselhos errados”, acrescenta o cardiologista, notando que, numa teleconsulta, “quando estou a falar com o doente tenho o outro ecrã com toda a informação sobre ele, e tudo o que se fala fica registado como se fosse uma consulta normal”.

Vida mais longa significa mais doenças crónicas

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Entre 2006 e 2014, subiu dois pontos percentuais a percentagem de pessoas com doença crónica em Portugal. Passou para mais de 50% — e muitos não têm apenas uma doença crónica, têm mais do que uma, recorda Daniel Ferreira, cardiologista do Hospital da Luz. Com o envelhecimento da população acumulam-se cada vez mais doenças crónicas — e essas obrigam a um acompanhamento diferente, ao longo de vários anos. E esse seguimento do doente, que muitas vezes é para o resto da vida, tem de “ser uma coisa cómoda e fácil de cumprir, caso contrário muitos vão desistir”.

Uma consulta à distância é tal e qual “uma consulta normal”, mas é uma consulta em que o doente não tem de ir para o hospital, perder uma manhã ou uma tarde no trabalho, ir para o trânsito, pagar estacionamento, ou percorrer vários quilómetros. Basta que o utente se isole numa sala, em casa ou no trabalho, com ligação à Internet.

O utente “é chamado pela nossa secretária para preparar a consulta, para ver se está tudo bem com a imagem e com o som. Depois o médico e o doente falam, analisam os registos e, no final, o médico determina se a próxima consulta será remota ou presencial e o doente faz check out remotamente, com o secretariado, tal e qual como faria se fosse uma consulta presencial. Assim, “eu consigo ver o doente crónico mais vezes por ano do que presencialmente” e este é um método que ajuda a reduzir as desistências por parte dos doentes, que são um problema para quem quer seguir um tratamento à risca.

Do ponto de vista da organização, garante o cardiologista, “nunca pensámos nisto com outro intuito que não ver o que é mais racional para todos”. Esta é “uma consulta normal: o cliente paga o mesmo, o profissional de saúde recebe o mesmo, o seguro paga exatamente o mesmo”. É certo que “isto não é apenas um skype, é mais complicado do que issoé preciso modificar a estrutura operacional do hospital e montar um sistema tecnológico que custa dinheiro”. Mas há economias de escala que se conseguem fazer: “por exemplo, eu com uma secretária qualificada consigo planear para 10 médicos de 10 unidades diferentes”, lembra Daniel Ferreira.

O cardiologista assinala que nos EUA o ano de 2015 foi o primeiro ano em que houve um número maior de consultas à distância do que consultas presenciais. E “isto já está a chegar à Europa”, garante. E já chegou a Portugal.

Portugal na vanguarda da TeleSaúde na Europa, garante responsável da Linde Saúde

Já foi criado em Portugal o Centro Nacional de TeleSaúde (CNTS), um organismo integrado nos Serviços Partilhados do Ministério da Saúde (SPMS). Segundo o presidente da SPMS, Henrique Martins, a plataforma tem contribuído para a transformação digital, “eliminando barreiras de acesso e levando o Serviço Nacional de Saúde a todos os cidadãos, por exemplo, médicos de diferentes especialidades, que se encontram em grandes meios urbanos, já podem tratar e acompanhar pacientes que estejam em zonas rurais, ou do interior”.

Em artigo de opinião publicado no Público, Henrique Martins sublinha que “a dinamização da TeleSaúde, em particular das teleconsultas, tem vindo a ser realizada através da criação de condições necessárias e muitos dos postos de trabalho de Unidades Locais de Saúde (ULS) já foram equipados com webcam e microfone”. Entre os projetos estratégicos para 2018 destaca-se o desenvolvimento de áreas como a Telepatologia, a Teledermatologia, a Telenutrição ou os Telecuidados, e a Via verde do AVC, “onde a TeleSaúde já é utilizada como instrumento na triagem e referenciação para tratamento adequado, evitando tempos de espera e contribuindo para a diminuição da mortalidade”, assegura o responsável.

E uma das empresas mais ativas nesta área é a Linde Saúde, que já tem mais de 200 doentes em Portugal a fazer telemonitorização, com projetos em hospitais como o Santa Maria, em Lisboa, os Hospitais da Universidade de Coimbra e o hospital distrital de Portalegre (o Hospital Dr. José Maria Grande). A empresa está concentrada em doenças com grande prevalência no país, como a insuficiência cardíaca e a Doença Pulmonar Obstrutiva Crónica, mais conhecida pela sigla DPOC.

A empresa deu os primeiros passos neste mercado nos primeiros anos da década passada. O principal serviço que disponibiliza, ao abrigo dos acordos feitos com a SPMS, também está ligado à TeleSaúde e à gestão da doença crónica mas distingue-se dos registos que os doentes fazem para o cardiologista Daniel Ferreira (e respetivos colegas) porque, aqui, cada leitura de um bio-sinal (como a pressão arterial) é analisado em tempo real — não fica à espera da próxima consulta para que o médico o veja.

“Nós não nos limitamos a agregar esses dados: sempre que há uma alteração de um parâmetro relevante, temos profissionais com formação clínica que vão contactar os doentes e fazer questionários de forma a perceber se aquele sinal que está alterado corresponde a um sintoma — e se for necessário contacta-se o médico para que ele entre em contacto com o doente”, explica, em conversa com o Observador, João Tiago Pereira, gestor de produto da Linde.

Um exemplo: um doente cardíaco leva para casa um medidor de tensão arterial fornecido pelo hospital (disponibilizado pela empresa) e esse equipamento vai ligar-se à Internet — com a ajuda técnica da empresa, se for necessário — e diariamente o utente vai fazer, neste caso, a medição da tensão arterial. Se algum valor não estiver bem, se a tensão está muito baixa, por hipótese, o doente é contactado imediatamente pela equipa de especialistas do serviço, que vão fazer um conjunto de questões à procura, por exemplo, de outros sintomas, como tonturas ou náuseas.

"A ideia é transformar o hospital cada vez um equipamento mais virado para a doença aguda, ao passo que a doença crónica passa cada vez mais a passar para o doente, para a sua família e para a comunidade"
João Tiago Pereira, gestor de produto da Linde Saúde

É como uma triagem no hospital. “Nós relacionamos aquilo que a tecnologia nos dá mas ligamos isso ao que o doente nos diz. Depois, conforme aquilo que é a análise de cada caso, reportamos ou não ao médico, que caso vá contactar o doente já vai munido de uma série de informações importantes“, explica João Tiago Pereira. Projetos como este fazem com que Portugal já esteja, a par de países como o Reino Unido e a Dinamarca, na vanguarda do que melhor se faz na Europa na área da TeleSaúde, conta o responsável da Linde.

“Se pudermos olhar para o doente numa base diária e formos muito sensíveis a pequenas alterações dos sinais e dos sintomas, conseguimos atuar precocemente, protegendo melhor a saúde do doente e evitando o internamento, que sai muito caro ao Estado“, nota João Tiago Pereira, lembrando, tal como Daniel Ferreira, que o envelhecimento da população cria desafios para os serviços de saúde de todo o mundo que têm de ser resolvidos com criatividade e recurso às novas tecnologias.

A TeleSaúde é uma das respostas a estes desafios e algo que pode ajudar a resolver as ineficiências que são, todos os dias, neutralizadas em todas as áreas da economia e da sociedade. Não falta aos responsáveis ambição e estratégia, diz João Tiago Pereira: “falta é criar mais ferramentas como financiamento para que os hospitais possam contratar de uma forma mais fácil”. Isto porque “a ideia é transformar o hospital cada vez mais num equipamento para lidar com a doença aguda, enquanto a doença crónica passa cada vez mais para o doente, para a sua família e para a comunidade“, remata o responsável da Linde Saúde.

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