Com a taxa de inflação a apresentar números elevados em praticamente toda a zona euro, os efeitos dos sucessivos aumentos observados nos últimos anos continuam a sentir-se na carteira dos consumidores, em particular no que diz respeito aos preços da energia, habitação, alimentos ou matérias-primas. Ou seja, o custo de vida continua a agravar-se. À boleia do aumento generalizado dos preços, nas redes sociais são muitas as publicações que têm surgido a fazer paralelismos entre os valores praticados em Portugal e em outros países do continente europeu. Um desses posts faz mesmo uma comparação direta com o suposto “menor” custo de vida na Suíça.

Na publicação, partilhada nas últimas semanas no Facebook, o autor revela que em “conversas com amigos que vieram da Suíça” chegou à conclusão de que os custos com “habitação, tabaco e alimentação” são mais baixos na Suíça que em Portugal. O post não revela qualquer outra fonte, a não ser essa comparação alegadamente feita por amigos. Ainda assim, são várias as pessoas a refutar essa informação nos comentários da publicação, referindo, por exemplo, que a alegação feita “é uma grande mentira” e que na Suíça “é tudo muito mais caro”. Será verdade que o custo de vida da Suíça é mais baixo que em Portugal?

Olhando para os dados do Eurostat — o Serviço de Estatística da União Europeia (UE) responsável pela publicação de estatísticas e indicadores que permitem fazer uma comparação entre países e regiões —, os números mais recentes que encontramos sobre preços da alimentação, bebidas (alcoólicas e não alcoólicas) e tabaco são referentes ao ano 2022.

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O Eurostat recorre ao Índice do Nível de Preços (Price Level Index — PLI) para comparar os custos de vários bens e serviços na Europa, dividindo “as paridades de poder de compra (PPP) pela taxa de câmbio nominal atual”. O serviço “não foi criado para classificar países” de forma criteriosa, uma vez que “apenas fornece um indicador da ordem de grandeza do nível de preços num país em relação a outros”. Ainda assim, permite ter uma ideia geral do custo de vida praticado nos 36 países analisados pelo Eurostat — e que incluem os 27 Estados Membros da UE, seis países candidatos a integrar o bloco comunitário (Albânia, Bósnia e Herzegovina, Montenegro, Macedónia do Norte, Sérvia e Turquia) e ainda três países que compõem a Associação Europeia de Comércio Livre (Islândia, Noruega e Suíça).

Na lista do Eurostat encontramos Portugal praticamente a meio da tabela no que diz respeito ao bolo total de custos, com um Índice do Nível de Preços na ordem dos 103 — um número ligeiramente acima da média da UE (número fixado no “100”, para efeitos comparativos), mas longe dos valores praticados por alguns países europeus.

Portugal surge mesmo bem abaixo da Suíça, que lidera a tabela dos 36 países com um Índice de 163. Os números nacionais ficam, de resto, sempre longe dos suíços em todos os parâmetros referidos: alimentação (101,2 contra 165,3), bebidas não alcoólicas (129,0 contra 145,0), bebidas alcoólicas (115,1 contra 140,9) e ainda tabaco (89,0 contra 137,7). De acordo com o Eurostat, neste grupo de 36 países, a “Suíça é o mais caro para alimentação, a Noruega para bebidas não alcoólicas, a Islândia para bebidas alcoólicas e a Irlanda para tabaco”.

Já em relação ao custo da habitação, os últimos dados do Eurostat — referentes a 2021 — mostram igualmente Portugal bem abaixo da Suíça, com um Índice de 80,0 contra 196,8. Neste caso, os custos em solo nacional são mesmo inferiores à media da União Europeia, o tal Índice “100” referido anteriormente.

Importa ainda assim lembrar que todos estes números dizem respeito a 2021 e 2022 e, por essa razão, não contemplam a taxa de inflação em meses mais recentes. O Instituto Nacional de Estatística (INE) confirmou nos últimos dias a taxa de inflação de agosto nos 3,7%, pondo assim fim a nove descidas consecutivas ao longo do ano. Os preços dos combustíveis foram o principal fator de aceleração. No que diz respeito aos bens alimentares, o ritmo de subida dos preços abrandou em agosto para os 6,4%, em comparação com os 6,8% registados em julho. Já as rendas da habitação cresceram ligeiramente 0,4% em agosto, relativamente a julho, fixando-se nos 6,94%.

INE confirma aceleração da inflação para 3,7% em agosto, “essencialmente” por via dos combustíveis

A Suíça tem também apresentado uma tendência de estabilização ao longo de 2023. De acordo com a agência de estatísticas suíça, os preços do consumidor aumentaram 1,6% em agosto face ao ano anterior, abaixo da meta de 2% que norteia o Banco Central Europeu. Os preços desaceleraram nos setores de alimentos e bebidas não alcoólicas (4,1% vs 5,3% em julho), mas aumentaram na habitação e energia (2,9% vs 2,7%).

Apesar de não existirem dados que permitam fazer uma comparação direta da realidade nos dois países no último ano, estes números mostram uma descida ou estabilização da taxa de inflação, tanto em Portugal, como na Suíça. Por essa razão, ao contrário do que alega a publicação, não são suficientes para justificar uma subida tão grande, em tão poucos meses, do aumento do custo de vida em solo português.

Conclusão

A publicação é falsa. Para além dos próprios comentários desmentirem a alegação feita pelo autor do post, os dados mais recentes do Eurostat colocam Portugal a meio da tabela dos países europeus onde os preços da alimentação, tabaco e alimentação são mais elevados, bem longe da Suíça, que lidera o grupo de 36 países analisados. Apesar de os números não contemplarem o aumento da taxa de inflação em 2023, mostram que Portugal está longe de ter um maior custo de vida do que a Suíça.

Assim, de acordo com o sistema de classificação do Observador, este conteúdo é:

ERRADO

No sistema de classificação do Facebook, este conteúdo é:

FALSO: As principais alegações do conteúdo são factualmente imprecisas. Geralmente, esta opção corresponde às classificações “falso” ou “maioritariamente falso” nos sites de verificadores de factos.

NOTA: este conteúdo foi selecionado pelo Observador no âmbito de uma parceria de fact checking com o Facebook.

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