Pornografia, masturbação e amores secretos. São estas as três acusações feitas à Organização Mundial da Saúde (OMS) através de uma publicação partilhada no Facebook. No dia 22 de abril, um utilizador desta rede social escreveu que este organismo internacional “quer que crianças dos 6 aos 9 anos aprendam sobre pornografia online, a masturbarem-se e a ter um amor secreto”. A publicação não é, no entanto, acompanhada por qualquer referência a declarações dos responsáveis da OMS ou a documentos oficiais que tenham sido publicados sobre esta matéria.

Neste contexto, as únicas recomendações feitas pela OMS que conjugam crianças e sexualidade têm data de 2010 e podem ser encontradas no documento intitulado “Padrões para a Educação Sexual na Europa“. Apesar de o documento ter quase 15 anos, as recomendações têm sido revistas ao longo dos anos e foi elaborado numa altura em que, lê-se logo no prefácio, a Europa enfrentava “muitos desafios relacionados com a saúde sexual: aumento da taxa de HIV e outras doenças sexualmente transmissíveis, gravidezes não desejadas em adolescentes e violência sexual”.

Além disso, as recomendações têm como alvo os adultos responsáveis pela educação sexual das crianças e jovens — como professores, por exemplo — e não as crianças e jovens diretamente. “Estas normas facilitam o desenvolvimento de planos de estudo adequados e, ao mesmo tempo, podem ser úteis para a introdução da educação sexual integral em todos os países”, lê-se no documento.

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Em relação às acusações feitas na publicação partilhada no Facebook, a OMS não recomenda que crianças que têm entre 6 e 9 anos “aprendam sobre pornografia online”. Num dos capítulos deste guia, a OMS refere que “a juventude está exposta a demasiadas novas fontes de informação”. E é neste contexto que surge a pornografia: “Os meios técnicos atuais, sobretudo os telemóveis e a internet, transformaram-se em pouco tempo em importantes fontes de informação. Mas muita desta informação, em especial a que está relacionada com a sexualidade, está distorcida, desequilibrada, pouco realista e [é] um pouco degradante”, lê-se no documento, que dá como exemplo “a forma como se representa a mulher (pornografia na internet)”.

É por isso que, continua a OMS, são necessárias novas formas de educação sexual: “Para contrariar e corrigir a informação e imagem enganosas” que aparecem na internet, sobretudo relacionadas com pornografia. Por isso, neste ponto, a OMS não sugere o consumo de pornografia a crianças, uma vez que dá recomendações aos adultos para que possam mostrar, de forma segura, que as imagens que aparecem na pornografia estão longe da realidade.

Depois, em relação à masturbação, a OMS também não recomenda que as crianças aprendam a fazê-lo ou que exista um incentivo. Aqui, é referido que, entre os 12 e os 15 anos, “a masturbação pode aumentar, mais em rapazes do que em raparigas”. E, mais uma vez, numa perspetiva de informação para adultos e não para as crianças.

Já entre os 0 e os 4 anos, num dos quadros é feita a referência à “masturbação da primeira infância” e as recomendações vão no sentido de “falar” e “expressar necessidades, desejos e limites” e não, mais uma vez, de incentivar qualquer prática nesse sentido. E entre os 6 e os 9 anos mantém-se a tendência: diz a OMS que os adultos devem usar linguagem sexual não ofensiva e mostrar que existe “necessidade de privacidade” nestes contextos.

Por último, existe neste documento, de facto, a referência a amores secretos. No entanto, o contexto em que surge não é o mesmo que o da publicação do Facebook, que sugere que a OMS incentiva as crianças a encontrarem um “amor secreto”. O que é dito no documento é que, de acordo com evidência cientifica, surgem nestas idades “amores secretos e o primeiro amor”.

Conclusão

A informação partilhada no Facebook é falsa. A publicação sugere que a OMS incentiva as crianças a ver pornografia, a mastrubar-se e a ter amores secretos. No entanto, o documento da OMS chamado “Padrões para a Educação Sexual na Europa” dá ferramentas aos adultos para conseguirem lidar com as diferentes fases das crianças e jovens. E estas fases incluem, obviamente, pornografia (que a OMS aconselha a explicar que aquilo que é visto na internet não corresponde à realidade), masturbação (que a OMS indica que é uma fase natural da vida das crianças) e amores secretos (que a OMS relaciona com os primeiros amores).

Assim, de acordo com o sistema de classificação do Observador, este conteúdo é:

ERRADO

No sistema de classificação do Facebook este conteúdo é:

FALSO: as principais alegações do conteúdo são factualmente imprecisas. Geralmente, esta opção corresponde às classificações “falso” ou “maioritariamente falso” nos sites de verificadores de factos.

NOTA: este conteúdo foi selecionado pelo Observador no âmbito de uma parceria de fact checking com o Facebook.

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