As eleições europeias de 9 de junho trouxeram a debate — entre os principais candidatos, mas também nas redes sociais — os mais variados temas sobre a política e a legislação que se faz em Bruxelas e Estrasburgo. Os temas? Das migrações à guerra na Ucrânia, passando por considerandos sobre diretivas europeias relacionadas com a produção nacional.

Precisamente neste último contexto, há uma pergunta que é deixada a pairar numa publicação de Facebook: “A União Europeia quer determinar o que pode ser cultivado em hortas particulares?”

Publicação no Facebook a questionar a política agrícola europeia.

Publicação no Facebook a questionar a política agrícola europeia.

A publicação não especifica de qualquer forma sobre o que incide esta suposta proibição da União Europeia: frutas e legumes, sementes? Mas a teoria (e as dúvidas) não surgem apenas nesta publicação e não surgem apenas até em português.

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As dúvidas parecem ter origem num artigo publicado num blog alemão (dedicado a causas ambientais como a “adoção de plantas órfãs” e a “quebrar as patentes sobre as sementes”) que acusa a União Europeia de querer “proibir o cultivo de frutas e vegetais em jardins”.

A informação que sustenta esta declaração é quase nula. Em apenas três parágrafos, o autor insiste que, apesar de “ainda não estar decidido”, a União Europeia “quer controlar todas as sementes”. E, para que isso aconteça, a Comissão Europeia vai proibir o cultivo de variedades “antigas e raras”, mesmo nos jardins privados, para garantir que todos os jardineiros e agricultores utilizam sementes “de padrão”.

Ainda assim, a informação é sustentada com uma fonte, uma notícia do Deutsche Wirtschaftsnachrichten. Apesar de o momento ser de campanha para as eleições europeias, o tema não é de agora. Em 2013, este jornal alemão escrevia que, de facto, a União Europeia pretendia “regular” o cultivo de frutas e legumes nos jardins privados. Regular e não proibir, como questionam as publicações no Facebook e o artigo publicado naquele blog alemão.

E para tirar as dúvidas, o que diz a legislação europeia?

A polémica, de facto, existiu. Em 2013, a Comissão Europeia propôs um regulamento ao Parlamento e ao Conselho Europeu “relativa à comercialização de material de reprodução vegetal”, preocupada com a “concorrência desigual para os operadores profissionais no mercado único”. A polémica não tardou e, no mesmo ano, a Comissão Europeia foi obrigada a esclarecer, em comunicado, que “as novas regras da UE para a produção de sementes aplicam-se apenas ao comércio profissional” e deixam de lado os pequenos produtores privados.

Ainda assim, a proposta não passou pelo crivo do Parlamento Europeu. Em 2014, os eurodeputados rejeitavam a “Lei das Sementes”, justificando o sentido de voto com as “deficiências na avaliação de impacto” da Comissão Europeia e com a “criação de encargos administrativos desnecessários para os Estados-membros e os agricultores”.

O regulamento foi rejeitado, e só em 2023 a Comissão Europeia decidiu apresentar uma nova proposta para regular a reprodução vegetal. Já no final de abril de 2024, o Parlamento Europeu votou a favor desta nova proposta, mas com algumas alterações.

Em declarações aos meios de comunicação alemães, o eurodeputado Herbert Dorfmann, relator das alterações propostas pelo Parlamento à Comissão Europeia, garantiu que o novo texto mantém “inalterada” a “liberdade dos produtores”. Também Anna Gray, porta-voz da Comissão Europeia para os temas de saúde pública e segurança alimentar, em declarações ao CORRECTIV.Faktencheck, garante que os pequenos produtores privados vão estar isentos dos regulamentos sobre a venda de sementes.

Conclusão

Apesar de a Comissão Europeia ter garantido, desde o início do processo legislativo, em 2013, que a polémica “Lei das Sementes” se aplica apenas ao “comércio profissional” e não aos pequenos produtores privados, a verdade é que a proposta inicial foi chumbada pelo Parlamento Europeu.

O mesmo Parlamento Europeu apenas aprovou o regulamento a propósito da reprodução vegetal em abril de 2024, mas com alterações que de acordo com o próprio relator mantêm “inalterada” a “liberdade dos produtores”. Não há assim nada além dos receios partilhados nas redes sociais que comprove que a União Europeia quer determinar o que pode ser cultivado em hortas particulares.

Assim, de acordo com o sistema de classificação do Observador, este conteúdo é:

ERRADO

No sistema de classificação do Facebook este conteúdo é:

FALSO: as principais alegações do conteúdo são factualmente imprecisas. Geralmente, esta opção corresponde às classificações “falso” ou “maioritariamente falso” nos sites de verificadores de factos.

NOTA: este conteúdo foi selecionado pelo Observador no âmbito de uma parceria de fact checking com o Facebook.

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