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A vitória convincente dos republicanos: como Trump ganhou as eleições e alargou a base eleitoral |
Cidades republicanas, bastiões democratas e um condado dividido. Ao longo da Route 66 que foi percorrida nas oito edições da newsletter Até à Casa Branca, o Observador fez paragens em locais bastante diferentes entre si. Mas há algo que, à luz dos resultados das eleições presidenciais de 2024, é uma constante nessas oito etapas: em todas, Donald Trump subiu o número de votos face a 2020. |
Até em Los Angeles, a última paragem da Route 66 e que se tornou num bastião do Partido Democrata nas últimas décadas, Donald Trump subiu cinco pontos percentuais (de 27 para 32%). Já Kamala Harris perdeu seis pontos percentuais em relação a Joe Biden (passou de 71 em 2020 para 65%). |
O Partido Republicano venceu as presidenciais e também controlará o Senado. No que toca à Câmara dos Representantes, os votos ainda estão a ser contados, mas os republicanos estão, neste momento, numa posição confortável para também triunfarem naquele órgão. A confirmar-se, seria uma vitória em toda a linha para Donald Trump — e um desastre eleitoral para os democratas. |
O que levou à vitória do Partido Republicano? Donald Trump conseguiu motivar a base eleitoral a ir efetivamente votar e conseguiu cativar o voto de alguns indecisos e minorias que não votaram nele em 2020. Por sua vez, os simpatizantes democratas tiveram mais dúvidas: terão ficado mais em casa e alguns preferido mesmo votar nos republicanos. Em todas as oito paragens da Route 66 (Chicago, Saint Louis City, Kansas City, Tulsa, El Paso, Maricopa e Los Angeles), Kamala Harris perdeu votos. |
O exemplo mais paradigmático dos oito é o condado de Maricopa, no Arizona, um swing state, que passou das mãos dos democratas para os republicanos. Em 2020, Joe Biden obteve 50% dos votos, ao passo que Donald Trump 48%. Agora, o republicano angariou 51% dos votos, enquanto Kamala Harris 47,5%. Ainda que a corrida tenha sido novamente renhida, notou-se uma perda de votos de um lado e o ganho de votos no outro. |
Neste condado do Arizona, 45% dos eleitores são brancos, 31% latino-americanos e 12% negros. À falta de dados que digam apenas respeito apenas a Maricopa, o que aconteceu em termos nacionais pode ajudar a explicar a viragem para Donald Trump. O número de eleitores brancos, que historicamente votam mais no Partido Republicano, votaram mais. Em 2020, tinham ido 67% de brancos às urnas, em 2024 foram 71% — e isso foi um bónus para os republicanos. |
Mas também houve uma viragem entre as minorias norte-americanas. Os latinos votaram mais em Donald Trump. Apesar da retórica anti-imigração, o republicano angariou 46% dos votos entre os latinos (o maior resultado de sempre, segundo a NPR), sendo que entre os homens a intenção de voto foi bastante mais elevada. |
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O voto masculino foi um dos principais trunfos de Donald Trump e o calcanhar de Aquiles na campanha dos democratas. Mesmo entre algumas minorias e os mais jovens — grupos que tradicionalmente votam mais no partido de Kamala Harris —, os homens votaram menos no Partido Democrata do que no passado e mais nos republicanos. Apesar de as mulheres terem votado mais nestas eleições, isso não foi o suficiente para reverter a tendência. |
Donald Trump nunca escondeu que quer levar a cabo um ambicioso programa de deportações de imigrantes ilegais — algo pouco apelativo para um latino-americano, mesmo que até esteja numa situação regularizada. Contudo, o estado da economia foi o principal fator que levou muitos a optar pelo voto no Partido Republicano. Juan Proaño, diretor-executivo da Liga dos Cidadãos Latino-Americano Unidos, explicou aos Los Angeles Times que, em particular os homens, “responderam certamente à mensagem populista do Presidente eleito e focaram-se principalmente em problemas económicos, como a inflação, os salários ou até apoio à reforma da imigração”. |
A economia foi um dos temas que, apesar de ter sido debatido nestas eleições, esteve longe de ser o tópico central da campanha do Partido Democrata. Kamala Harris teve de lidar com o aumento do custo de vida do mandato de Joe Biden, prometendo governar de forma diferente da do Presidente. Embora a situação económica tenha estabilizado nos últimos meses, a perceção da economia não era a melhor entre os norte-americanos e muitos estavam insatisfeitos. Não acreditaram igualmente nas propostas da democrata — dando um voto de confiança a Donald Trump. |
Em Chicago, a primeira paragem do Observador pela Route 66, Kamala Harris venceu confortavelmente, mas baixou seis pontos percentuais em relação a 2020, os mesmos números que Donald Trump subiu. “Ele conseguiu os mesmos ganhos [em Chicago face a Kamala Harris] do que em termos nacionais”, sublinha a analista política Laura Washington à ABC, que aponta para a “classe trabalhadora” como principal motor do aumento do número de votos do republicano. |
Para Laura Washington, o foco da campanha de Kamala Harris foi um “erro”, principalmente o facto de ter salientando que a sua chegada à Casa Branca “salvaria a democracia” de Donald Trump. Isso não foi suficiente; a analista política assinala que “tudo o que os eleitores queriam saber era da economia”. E isso era realmente um ponto fraco da campanha dos democratas, enquanto Donald Trump prometia mudanças mais significativas e fazia questão de lembrar as diferenças de preços entre 2020 e 2024. |
O Partido Republicano conseguiu captar o voto da classe trabalhadora, que muitas vezes mora nos subúrbios dos grandes centros urbanos, tradicionalmente democratas. Um desses exemplos ocorreu em Saint Louis, no estado do Missouri. Aquela cidade, a segunda paragem do Observador na Route 66, é um bastião democrata e Kamala Harris venceu com 81%, mesmo assim descendo um ponto percentual face a 2020. É, contudo, uma mancha azul num mar vermelho, uma vez que partilha fronteira com localidades que são fiéis ao Partido Republicano. |
Um voto de protesto contra as condições económicas e o facto de Kamala Harris não ter mobilizado a sua base eleitoral, em particular as minorias, levou a que Donald Trump chegasse novamente à Casa Branca. Os republicanos festejam, enquanto o Partido Democrata vai entrar numa travessia no deserto e poderá agora analisar o que correu mal. |
P.S.: Esta é a nona e última newsletter enviada os leitores no âmbito da cobertura das eleições nos Estados Unidos da América. Obrigado por nos ter seguido — e voltamos daqui a quatro anos. |
O que aconteceu esta semana? |
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- Entre aliados, Trump elege os primeiros nomes para a sua administração
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Donald Trump já começou a compor a sua administração. Com personalidades leais ao trumpismo, o magnata escolheu o antigo responsável pela imigração no seu primeiro mandato, Tom Homan, para o cargo de secretário de Segurança Interna, atribuindo-lhe o cognome “czar das fronteiras” pelas suas medidas restritivas no campo das migrações. |
Susie Wiles foi nomeada como chefe de gabinete da segunda administração Trump. Tendo desempenhado um papel fundamental na campanha (ainda que nos bastidores), Donald Trump acredita na primeira mulher naquelas funções: “Continuará a trabalhar incansavelmente para tornar a América grande novamente”. |
Foi também escolhida a embaixadora norte-americana para as Nações Unidas, Elise Stefanik. A atual congressista eleita por Nova Iorque precisa ainda do aval da Câmara dos Representantes. |
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- Kamala Harris assume derrota e pede aos apoiantes para que a luta não acabe
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A candidata democrata admitiu, no discurso em que reconheceu a derrota nestas eleições, que o desfecho “não era o que queria”. Garantiu que haverá, mesmo assim, uma “transição pacífica do poder”, um princípio “fundamental da democracia” norte-americana. |
Kamala Harris disse que vai continuar na luta pelas causas que defende. “Nunca vou desistir de um futuro onde os norte-americanos podem seguir os seus sonhos, ambições e aspirações”, assegurou a democrata. |
Numa mensagem aos apoiantes, Kamala Harris pediu que se arregacem “as mangas”. “É tempo de organizar e mobilizar” pela luta pela “liberdade e pela justiça” e por um “futuro” que todos “podem construir juntos”. Mas não deixou nenhuma pista no seu discurso sobre qual poderá ser o seu futuro político após a derrota nestas presidenciais. |