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Alimentação e hábitos para quem quer deixar de se sentir cansado |
Sabe aquela sensação de que estamos muitas vezes cansados, sem causa aparente, e que apenas uma noite bem dormida não resolve? De certeza que já passou por isto. |
A relação da alimentação com o cansaço vai muito além do facto de a comida ser fonte de energia. Os alimentos podem trazer-nos cansaço por não estarmos a dar ao corpo os nutrientes essenciais para que este produza energia mas, ao mesmo tempo, há outros hábitos de vida saudáveis que têm o mesmo ou até mais impacto nesta gestão da fadiga: é o caso do exercício físico e do sono. São três áreas que estão interligadas entre si, afetando brutalmente a qualidade de vida de um indivíduo e, todas juntas, devem contribuir para bons níveis de energia. |
Ora, para isso é muitas vezes necessário levar a cabo uma mudança de hábitos, embora isto possa ser bastante difícil. Por isso é importante aprofundar as causas relacionadas com estilos de vida que levam ao aumento do cansaço. |
Foi a pensar nisso que criei este auto-teste que ajuda a perceber, em seis pontos simples, em que áreas deve atuar para reduzir o seu cansaço: |
- Níveis de hidratação. A desidratação aumenta os níveis de cansaço e reduz os níveis de concentração. Aqui pode encontrar um calculador de hidratação útil.
- Quantidade de café ingerida diariamente. Existe um paradoxo associado à cafeína: a curto prazo, o café ajuda-nos a estar mais alerta, dando um impulso de energia. Mas o efeito cumulativo, ou seja, o impacto ao longo do dia, será o oposto. Exato: o café pode trazer cansaço. Assim, consumir café quando nos sentimos cansados ou com falta de energia vai temporariamente contrariar esses sintomas mas, posteriormente, vamos sentir-nos mais cansados, o que nos faz entrar num ciclo da cafeína, já que a tendência será para irmos buscar mais café. Se chegarmos ao final do dia com muito sono depois de cinco ou seis cafés, é sinal que teremos que reduzir o consumo diário.
Um bom truque para contornar este ciclo da cafeína será, ao reduzir o número de cafés, intervalar alguns com chá verde. Isto permitirá a ingestão de pequenas quantidades de um estimulante (teína) com efeito parecido ao da cafeína, apesar de mais fraco.
- Quantidade e qualidade do sono. Nunca é demais lembrar que dormir é uma necessidade e não um luxo. E que o número de horas que devemos dormir não é igual para todos e muda ao longo da idade. O intervalo de tempo considerado saudável para um adulto oscila entre sete e as nove horas de sono mas, de acordo com os especialistas, só saberá se foi suficiente se acordar bem disposto.
- Por falar nisso… sente sono depois do almoço? Provavelmente terá que consumir quantidades mais pequenas e ter em atenção aos hidratos de carbono. Almoços com grande quantidade de hidratos de carbono vão estimular a libertação de altos níveis de insulina e melatonina, a hormona responsável pelo sono. Uma vez que esta vontade de dormir poderá ser ignorada durante um dia de trabalho, acaba por agravar o cansaço. E não é exclusivo do almoço: este estudo científico compara um lanche rico em açúcar com uma caminhada de dez minutos para perceber quais seriam os efeitos de energia e cansaço nas duas situações. Verificou-se que uma hora após o lanche houve um aumento de energia, mas na hora seguinte o cansaço aumentou. Já na caminhada, verificou-se apenas um aumento de energia.
- Sedentarismo. Ou seja (e reportando-me ao número anterior), exercício moderado ou até ligeiro pode aumentar o nível de energia.
- Antioxidantes presentes na alimentação. Aqui o essencial é perceber se o consumo é diário e diversificado. A falta de consumo de antioxidantes presentes nos vegetais, na fruta, nos frutos secos e nos chás pode levar a cansaço, uma vez que as vitaminas, minerais e em especial os fitoquímicos entram em várias reações do corpo. Já existe evidência cientifica sobre o efeito direto dos polifenóis (que são fitoquímicos) na gestão do cansaço.
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Se, depois de corrigir estes seis hábitos que podem levar ao cansaço diário, continuar a sentir fadiga, deve pensar em aprofundar um pouco mais as possíveis causas ainda relacionadas com a nutrição. Nomeadamente: |
- Dosear os níveis de vitamina B12 e níveis de ferritina (que corresponde aos níveis de ferro armazenados). A vitamina B12 é essencial para a absorção do ferro, e os dois são essenciais para prevenir uma anemia megaloblástica (que se traduz na redução de glóbulos vermelhos devido à falta destes dois nutrientes), que tem como consequência níveis muito baixos de energia. Os níveis de vitamina B12 no sangue não são, muitas vezes, reflexo da ingestão ou não de alimentos, mas sim do nível de absorção que o nosso corpo está capaz de fazer desta vitamina no estômago. Existem por exemplo alguns medicamentos que inibem a absorção desta vitamina, sendo fundamental fazer uma avaliação mais aprofundada por parte do profissional de saúde, caso os níveis estejam muito baixos.
- Poderá também — com a ajuda do profissional de saúde — pensar em suplementação.
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Se, no final deste auto-teste, já identificou algumas mudanças de hábitos alimentares que pode introduzir para melhorar os seus níveis de cansaço, faça-o o quanto antes para assim melhorar a sua qualidade de vida. |
Verdadeiro ou falso? Salada de tomate no inverno faz bem |
Falso. Apesar de o tomate ser um vegetal com bastante valor nutricional, este deve apenas ser consumido na sua época do ano, para que se consiga o máximo dos seus nutrientes e antioxidantes. Já reparou que, se o deixar fora do frigorífico (que é onde deveria ser armazenado), ganha bolor facilmente? É mais um sinal de que é um vegetal do verão e não do inverno. Prefira saladas de agrião, espinafres ou couves cozidas. |
Uma pergunta frequente nas consultas: goji e tâmaras secas contam como fruto secos? |
Não. Goji, tâmaras, ameixas (secas) ou passas são frutas secas e são uma boa fonte de hidratos de carbono, entre outros nutrientes. Mas quando nos referimos a frutos secos falamos em oleaginosas, ricas em gorduras saudáveis. Em termos nutricionais são alimentos completamente distintos, embora se possam complementar. |
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A professora Teresa Paiva é a maior especialista nacional em sono, com quem tive a honra de trabalhar (e ver a trabalhar). Nesta entrevista de 2019 mas sempre atual fala um bocadinho das suas rotinas de sono, humanizando assim a imagem. Além de uma grande médica, é um ser humano admirável. Vale a pena conhecer um bocadinho melhor a opinião desta profissional de saúde. |
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Mariana Chaves é nutricionista clínica, autora do podcast Aprender a Comer, na Rádio Observador, e do livro Dieta Única (ed. Guerra e Paz, 2016) [ver o perfil completo]. |