Já não era sem tempo! Com o nosso habitual atraso, o Black Lives Matter chega finalmente a Portugal. Aconteceu dia 10 de Junho, em Peso da Régua, a Minneapolis do Alto Douro. António Costa é o George Floyd português. Só que, como de costume, a nossa versão é mais pífia. A diferença é que enquanto Floyd foi assassinado por um polícia, o nosso Primeiro-Ministro foi vítima de um desenho empunhado por um stôr. É um mártir tão sensível que se calhar é mais correcto chamar-lhe o Boy George Floyd português.
Este caso pode não provar que em Portugal há racismo institucional, mas mostra que há racismo inchuchional, que é o racismo decretado por alguém que diz “inchuchional” em vez de “institucional”.
Parece que estou a fazer pouco da reação de Costa ao ser confrontado com o cartaz. Não é verdade. Estou a fazer pouco, sim, mas aquela não foi a recção de Costa ao ser confrontado com o cartaz. Aquela foi a reacção de Costa ao rever o cartaz, provavelmente pela enésima vez. O confronto do Primeiro-Ministro com o cartaz já tinha sido há muito tempo.
A primeira vez que António Costa se referiu ao famigerado cartaz não foi no passado dia 10, na Régua. Foi no dia 16 de Fevereiro, em entrevista à TVI. Na altura, afirmou: “Não gosto de me ver espetado com um garfo, não é um garfo é um lápis espetado no olho e coisas do género. Mas acho que o direito à greve é um direito legítimo, que deve ser exercido nos termos da lei, e que o direito de manifestação é um direito legítimo”.
É estranho. Se há coisa que tem sido repetida a propósito do incidente de 10 de Junho, é que o cartaz é racista porque António Costa o sente como tal. Costa, não sendo branco, identifica instintivamente o racismo naqueles rabiscos. Ora, se esse entendimento é assim tão imediato, esperava-se que, quando Costa falasse a primeira vez do desenho, sublinhasse o facto gravíssimo de ser racista. Seria, sem dúvida, a sua mais odiosa e saliente característica. Em vez disso, o PM menciona apenas o garfo, aliás o lápis no olho. E a sorrir, o que é bizarro, pois o racismo não tem graça.
Pelos vistos, a percepção do racismo não é assim tão instantânea. Leva 4 meses de reflexão até ser reconhecido como tal. O que é que se terá passado nesse tempo para Costa deixar de encarar aquele cartaz como um desenho chato com um garfo, aliás um lápis espetado no olho, e passar a vê-lo como uma injúria racista? Eu tenho um palpite: foi a CPI da TAP, a queda nas sondagens e a contratação de um renomado especialista em marketing político para tratar da comunicação do Governo. É possível que só uma pessoa de cor seja capaz de distinguir o que é ou não racismo, mas apenas um consultor de relações públicas saiba calendarizar a data do anúncio para alcançar maior efeito.
Atenção, não conheço pessoalmente os profissionais envolvidos, não posso fazer avaliações sobre a sua ética profissional. Mas sei que, tal como eu, são brancos. E, conhecendo-me, sei que eu era perfeitamente capaz de sugerir esta ignóbil estratégia de auto-vitimização de Costa, aproveitando o golpe de publicidade para distrair das trapalhadas do Governo. O mais provável é que o recurso a velhacaria seja um dos traços próprios das pessoas da nossa cor.
Se, como nos é garantido, os indianos, em virtude de terem nascido indianos, possuem características que os superiorizam aos brancos na identificação de racismo, é possível que nós, caucasianos, sejamos portadores de características que nos superiorizam em matéria de infâmia política.
Isto levanta questões interessantes a que os teóricos do novo anti-racismo podiam responder. Há mais algum tema sobre o qual um branco não deva pronunciar-se, por não ter capacidade de entender o assunto, mas uma pessoa de cor possa fazê-lo à vontade, por ter nascido com esse dom? E vice-versa? Sobre que temas as pessoas de cor devem deixar a conversa para os brancos?
Quantos excepcionalismos étnicos existem? Para que outras áreas de actividade as pessoas de cor estão mais bem apetrechadas? Além da capacidade para identificar racismos, com que outras capacidades nascem? Com que mais talentos exclusivos vêm ao mundo os indianos? E os africanos? E os judeus? E os chineses? E há algum talento que indianos, africanos, judeus e chineses não possuam de todo? Há algum atributo inato que recomende um negro para uma actividade específica? E algum atributo inato que desaconselhe um negro para outra actividade?
Para evitar confusões futuras, não era melhor fazer uma lista com tarefas em que as diferentes cores de pele se superiorizam? E uma com as tarefas em que são inferiores? Depois, sob a égide da ONU, hierarquizava-se. No fim, dirigiam-se as etnias para as áreas em que são mais fortes, excluindo-se das outras.
A prova que não há diferenças de capacidades é que não há nenhuma etnia que ainda não tenha percebido onde é que eu pretendo chegar com estas perguntas cínicas.
Quando, há tempos, Costa chamou “ladrão” ao adjunto de João Galamba, houve muita gente a discordar tecnicamente da caracterização. Agora que chama “racista” a professores, ninguém se atreve a desmenti-lo. No entanto, enquanto Costa estudou mesmo para jurista, nunca estudou para vítima de racismo. Ou seja, por mais que uma pessoa pesquise, analise e aprenda, nunca alcançará o conhecimento que, como a fibrose cística ou o daltonismo, só é passado no útero.
Realmente, quem protesta contra os rankings das escolas tem toda a razão. São uma estupidez mal executada. Classificada em primeiro lugar não está a transmissão de conhecimento pelas escolas privadas. Está a transmissão de conhecimento pelas partes privadas.
Um contra-argumento nesta discussão sobre a superioridade dos traços inatos sobre os adquiridos foi dado no próprio bate-boca entre o PM e os manifestantes. Quando António Costa se vira para um professor e lhe diz “o senhor com um cartaz racista devia estar calado”, o professor responde com “é mentira!” Portanto, Costa chama “racista” ao professor e o professor chama “mentiroso” a Costa. Ou seja, António Costa, com os seus genes, percebe de racismo; já o professor, com a experiência adquirida a trabalhar para o Ministério da Educação, percebe de políticos mentirosos.
Não digo que António Costa não mereça ser criticado por pertencer a uma estirpe cujos membros são célebres pela intrujice. Merece, pois. Mas não é o grupo dos indianos que é famoso por isso – não conheço assim tantos para poder generalizar e, dos que conheço, a maioria são pessoas sérias. É o grupo dos primeiros-ministros socialistas eleitos no séc. XXI. Aqui pode-se generalizar à vontade e ser preconceituoso, já que está provado que é 100% dos elementos são intrujões.
A única diferença é que Sócrates se queixava de ser alvo de uma campanha negra, enquanto Costa insinua que há uma campanha baseada na sua pele negra. Cá está: em ambos os casos trata-se de uma intrujice.