Pegando no já habitual The World in 2019 do The Economist e revisitando 4 dos 12 temas que nos traz Daniel Franklin fica-se com uma ideia negativa do mundo. Repeguem-se os temas, quentes, e faça-se uma breve análise.

1. “O vento económico está a mudar. A meio do ano os EUA irão bater o record para o período mais longo e ininterrupto de expansão económica. No final do ano poderão estar à porta de uma recessão. A taxa de crescimento da China irá decrescer enquanto que a da Índia irá subir. A Síria do pós-caos entrará numa fase de crescimento económico que a colocará no topo dos crescimentos. Por outro lado, assistir-se-á ao definhar da Venezuela e do Irão. Na Europa, a Itália andará a braços com uma crise financeira”.

Apresentado desta forma parece um pouco um ano terrível.

A verificarem-se estes factos e perante um abrandamento, senão um cenário recessivo por parte dos EUA, a Europa, como é tradicional, sofrerá em consequência. Portugal, em particular na Europa, estaria mais vulnerável ainda. Com um nível de dívida elevadíssimo, a simples conjetura de que as taxas de juro possam subir torna o dinheiro mais caro e o investimento mais baixo. Muitos sectores iriam sofrer, do imobiliário ao turismo, da restauração à tecnologia.

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As bolsas, americana e globais por arrasto, mostraram um mês de Dezembro impróprio para cardíacos. Os ganhos anuais nos EUA foram eliminados e a subida das taxas de juro pela FED, procurando relançar a inflação, prejudicam quem quer levantar dinheiro para investir. As obrigações poderão tornar-se mais atractivas mas o crescimento das empresas mais contido, na medida em que o dinheiro será mais caro. Ora este simples facto – subida das taxas de juro de referência americanas – embora não comporte qualquer mal, em si mesmo, poderá levar a um efeito de redução do interesse no mercado acionista (e a uma pior avaliação das empresas) e a correções acentuadas, senão a um bear market (esteve-se quase lá no final do ano 2018).

O que será preocupante para Portugal? Bom, uma constipação nos EUA pega-se sempre à Europa. Uma qualquer vulnerabilidade na Europa trará uma gripe certa a Portugal. Não será complexo prever, a verificarem-se estes factos, um abrandamento acentuado da atividade económica com reflexos quase imediatos no alimentar, no turismo e no imobiliário. Este último, e em particular a mediação e todos os negócios à volta dela, seriam fortemente afetados. É pôr os olhos nas casas de compra e venda de ouro quando o valor do ouro desceu. No imobiliário será o mesmo. Uma descida no imobiliário – mesmo que se mantenham preços nas zonas nobres de Lisboa e Porto – colocará um travão na atividade de forma séria e o mercado depurará os inúmeros negócios de baixas barreiras à entrada e à saída.

Mesmo que esta previsão acabe por não estar certa, e oxalá não venha a estar, o certo é que começam a existir alguns sinais de abrandamento no imobiliário, sobretudo em zonas menos nobres. Sem ser catastrofista, será bom pensar no assunto. E equacionar a questão: prefere-se uma crise já ou só daqui a uns tempos? Pergunta de resposta complexa.

2. “Os mercados irão convergir. Mas de que maneira? Será que o mercado americano de ações retrairá ou o resto do mundo subirá? A aposta inteligente seria no segundo movimento. No entanto, as empresas americanas deverão aproveitar a vida enquanto podem: os bons tempos para a América Inc. não irão durar muito.”

Esta afirmação parece pouco credível e mesmo especulativa na sua natureza. Uma queda no mercado acionista americano, que já vem sendo prevista há muito, iria certamente ter influência no mercado europeu e asiático. Uma queda americana espalhar-se-ia pelo mundo inteiro. E o mundo inteiro não ficará imune, nem tão pouco crescerá, com o decréscimo do mercado americano.

A parte boa disto é que continuaremos, pelo menos em 2019, a ter taxas de juro na europa a valores baixos pelo que o efeito crise, embora com impacto, não será tão elevado quanto se as tivéssemos mais elevadas. Ainda assim, o contágio americano à Europa é inevitável. E mais inevitável ainda é o efeito psicológico. EUA inseguros implicam que, psicologicamente, o mundo estará vulnerável e inseguro. E o investimento, nestas alturas, diminui drasticamente. O que faria com que as economias, todas, abrandassem.

Como é mais que certo os fenómenos económicos são cíclicos. E o ciclo positivo já durou bastante mais que o normal. Por isso, e na dúvida, é preciso estar atento aos sinais de abrandamento que se multiplicam.

Razões para alarme? Ainda não. Ainda…

3. “O Brexit verifica-se. E com a saída do Reino Unido da Europa as recriminações irão intensificar-se. A Comissão Europeia será renovada, haverá um novo parlamento e uma nova figura à frente do Banco Central Europeu.”

A 29 de Março comemorar-se-á o dia da independência britânica? Depois de 46 anos ligado à Europa o UK irá mesmo querer afastar-se da Europa comunitária? Ninguém tem uma resposta definitiva. O facto é que provavelmente a celebração nem será assim tão efusiva, a existir. E o Reino Unido ficará mais amuado que outra coisa. E mais sozinho. E as promessas que viriam com a saída não serão assim tão fantásticas. Apesar do acordo de saída não ser mau para o Reino Unido, a verdade é que tem de ser ratificado parlamentarmente. E, à data, isso não está assegurado.

Acresce a isto, ainda, que a ideia de liberdade é, hoje em dia, uma ideia pueril num mundo absolutamente conectado. Os obstáculos criados podem ser maiores, bem maiores na prática, que as virtudes da independência. A Europa restante, sem UK, irá também sofrer a perda e sairá enfraquecida. O Brexit parece ser, incontornavelmente, um jogo de perda:perda bilateral.

No meio do impasse e à espera da votação parlamentar há ainda o lado mais colorido da coisa. Nasceu uma banda “Breunion Boys” com inspiração nos Take That, e seu local de origem, a apelar à reunião da Europa.

Mas e se não houver acordo parlamentar (Câmara dos Comuns) até 29 de Março? Ou se se decidir fazer um novo referendo? Há muito do futuro da Europa que está nas mãos dos britânicos. Talvez não pelas melhores razões, mas está.

Por isso, 2019 trará uma nova Europa. Um Brexit. Um Breunion. Ou nenhum dos dois. Até 29 de Março ficaremos a saber uma boa parte da história sendo que a restante, a mais complexa de implementar, porque na prática, ficará sempre para depois.

4. “Não há forma de esconder a tecnologia. Seja inteligência artificial ou reconhecimento facial, a tecnologia estará em todo o lado. Mas o pico de Sillicon Valley foi provavelmente atingido porque os gigantes tecnológicos estarão agora, e mais que nunca, debaixo dos holofotes da regulação.”

Para terminar este artigo com ideias emprestadas de Daniel Franklin, há que referir o lado negro da tecnologia. Ou seja, ainda não há robots capazes de matar, como no “Terminator”, mas a regulação torna-se absolutamente fundamental para que a Inteligência Artificial tenha futuro conjunto e proveitoso para a humanidade.

As possíveis consequências não desejadas ensombram, assim, o brilhantismo da tecnologia e as suas potencialidades. As pessoas podem ditar mensagens escritas em vez de as escrever tal como pedir uma música a um aparelho inteligente sobre o balcão da cozinha (Alexa, por exemplo).

Porém, estas mesmas pessoas poderão começar a dar usos insólitos ou mais negros a essa mesma tecnologia.

A mais séria das questões coloca-se ao nível da privacidade das pessoas. Os perfis que se constroem de cada indivíduo, pelo facto de ter comprado on-line, pesquisado, lido ou postado podem ser assustadores pelo que a melhor forma de olhar para este problema não deve vir tanto da regulação da inteligência artificial, ela mesma, mas antes da forma como os dados pessoais são recolhidos, processados e armazenados. E nessa linha há um trabalho infindável a fazer.

Tudo misturado e olhando estes quatro tópicos, em doze, do editorial do The World in 2019, pode-se sempre pensar positivo (ao contrário de Daniel Franklin) e concluir com: 1) o crescimento continuará e o ano 2019 apresentará performances e condições económicas favoráveis em todo o mundo; a China e os EUA juntarão forças, os mercados irão subir e a sombra recessiva dos EUA não passará de uma sombra. Por cá, o turismo, o imobiliário e a restauração continuarão em alta; 2) Os mercados irão convergir mas apenas em alta. E os aumentos das taxas de juro americanas ficarão congelados sine dia; 3) O Reino Unido não aprovará o Brexit e, em contrapartida, porá de novo à votação o Remain or Leave sendo que, desta vez, a permanência ganhará de forma expressiva e tudo voltará aos seus melhores dias; 4) A Inteligência Artificial será regulada com inteligência (passa-se a redundância) e a humanidade verá não sombras mas apenas o sol tecnológico mais brilhante a ajudar as suas decisões e a facilitar a sua vida.

Acredita nisto quem quiser, lado mais negro ou mais positivo. Numa lógica de probabilidades, zero (0) não será a probabilidade associada à visão do editorial do The Economist nem ao seu contrário. Um (1) também não. Onde ficaremos? No final do ano faremos novo balanço. Afinal, o futuro é já este ano.