1 Ponto prévio: entre Bolsonaro e Lula venha o diabo e escolha. De um lado temos um presidente autoritário, claramente militarista e com muitas falhas democráticas, enquanto o concorrente é um ex-presidente que foi investigado em 11 processos por suspeitas de corrupção e outros crimes graves mas que beneficiou de absolvições (duas) e de prescrições para se ver livre das suspeitas.

Certo é que os resultados da primeira volta, conhecidos esta madrugada, criaram uma espécie de sentimento anticlímax. Se olharmos para os jornais nos últimos dias, a vitória de Lula da Silva com mais de metade dos votos à primeira volta encerrava o tema.

Por isso mesmo, quase que aposto que vamos assistir nos próximos dias ao regresso da velha novela favorita da esquerda portuguesa: “O fascismo vai regressar!”

2 É uma espécie de questão sazonal. Sempre que alguém de direita diz algo fora da caixa, algo que vai contra o politicamente correto, é automaticamente apelidado de fascista. Sempre que um partido de direita chega a um Governo europeu, a probabilidade de o fascismo regressar é óbvia e inevitável.

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É verdade que a esmagadora maioria dos que enchem a boca com “o fascismo” e a invetiva “fascista” não sabe do que fala. Nunca leram um livro de história sobre os tão falados anos 20 do século passado, não sabem sequer caracterizar o que foi o nazismo alemão ou o fascismo italiano e espanhol. Não sabem minimamente quem foi Hitler, Mussolini ou Franco. São ignorantes puros e duros.

Daí que confundam Meloni com Mussolini (leiam o André Abrantes Amaral, sff) e, em vez de o ignorarem, queiram fazer de André Ventura uma espécie de Salazar dos pequeninos — o que o líder do Chega agradece.

O José Manuel Fernandes, o Rui Ramos, o João Marques Almeida já descreveram o objetivo dessa estratégia do PS: focar a agenda em André Ventura para ajudar o Chega a subir nas sondagens. Quanto mais o Chega subir, menos hipóteses terá o centro-direita de formar uma alternativa, o que fará com que o PS seja o verdadeiro e único centro da vida política portuguesa.

O objetivo da estratégia da banalização do ‘fascismo’ é fazer com que o PS seja verdadeiramente indispensável para qualquer Governo. Tão simples como isso.

3 Os principais dirigentes do PS de ignorantes não têm nada. Têm objetivos políticos misturados com ambições pessoais que, aliados à gula e à ganância do poder, fazem com que a sua estratégia de banalizar o fascismo seja perigosa para a democracia.

Veja-se o caso de Augusto Santos Silva. É cada vez mais claro que quer concorrer a Belém em 2026 e elegeu o Chega como uma espécie de passaporte para essa candidatura presidencial. Daí que utilize todas as oportunidades no Parlamento para entrar em conflito com André Ventura, arvorando-se em grande defensor da liberdade e da democracia.

Pouco interessa se com essa estratégia está a dar palco às patetices de Ventura e a favorecer a sua vitimização. O que interessa a Augusto Santos Silva é que as televisões e a comunicação social o filmem a tirar a palavra a Ventura, perante a histeria dos aplausos da esquerda e da extrema-esquerda parlamentar.

É difícil ser mais oportunista do que isto mas é o que Santos Silva gosta de fazer.

Depois há outros casos, como o do deputado Pedro Delgado Alves. Há uns dias no Twitter, apelava ao “centro-direita” e aos “democratas liberais de direita” a uma poupança no uso de “detergente” para que não se classificasse dessa forma (de “centro-direita”) uma “coligação que inclui Meloni e Salvini”. Está claro que tem de ser obrigatório o uso da denominação “extrema-direita” — outra expressão tão banalizada como o “fascismo” que quase perdeu a sua utilidade.

Aliás, o tema do Chega e da banalização do que é o fascismo parece uma especialidade de Delgado Alves. Basta consultar a sua página no Twitter para percebermos que o deputado interiorizou muito bem as ordens recebidas.

4 Obviamente que o apelo retórico de Delgado Alves (e outros semelhantes feitas pelas esquerda) não passam de um exemplo sonsice política. Deduz-se, seguindo o seu raciocínio, que Delgado Alves tenha usado uns bons litros de detergente quando o PS se aliou com o último partido comunista relevante da Europa Ocidental.

Onde estavam as suas preocupações com os valores da democracia e da liberdade quando o seu partido formou governo com o apoio parlamentar de uma organização política que apoia às claras ditaduras com a da Coreia Norte ou de Cuba? Será que Delgado Alves terá sentido a sua militância em crise quando o PS se aliou a um partido que nunca reconheceu os crimes do comunismo, nem a ditadura, a tragédia e os diferentes genocídios representados pela União Soviética?

Onde estava Delgado Alves quando o seu partido, em nome da conquista utilitária do poder, se aliou a um partido marxista com o Bloco de Esquerda? Onde se ouviram as suas críticas ao facto de o PS se coligar com um partido que combate o sistema capitalista, que sempre elogiou a Venezuela de Hugo Chavez e que quer construir um sistema alternativo que nem sabe explicar qual é (mas que não deverá andar longe da Venezuela atual)?

5 Certamente que estava do ‘lado certo’ da força, com umas boas doses de detergente por perto, apoiando a conquista do poder pelo poder, custasse o que custasse. Tudo em nome da teoria do ‘derrube do muro’.

Sendo coerente com uma prática de “custe o que custar” (e certamente influenciado pelo nível do debate da campanha eleitoral no Brasil), Pedro Delgado Alves esqueceu-se da sua qualidade de deputado e de vice-presidente do Grupo Parlamentar do PS e não achou nada melhor do que apelidar o presidente brasileiro legitimamente eleito (Jair Bolsonaro) como um dos “filhos da puta” que não devia ser eleito.

É verdade, como Delgado Alves deixa subentendido, que Bolsonaro elogiou em 2019 um militar que foi condenado pelo crime de tortura praticado no tempo de Ditadura. E, repito, algumas das posições de Bolsonaro estão nos antípodas de um democrata.

Agora, classificar um Chefe de Estado de um país irmão como “filho da puta” é de uma violência verbal próxima (ou igual) dos extremistas que Delgado Alves quer criticar do que de um deputado de um partido moderado como é o PS. Na prática, Delgado Alves está a ser um bolsonarista.

Depois de ter pedido desculpa pela atitude da deputada ‘‘lápis azul’ Isabel Guerreiro, esperemos que Pedro Delgado Alves não tenha que repetir as declarações em nome próprio.

Texto alterado às 11h48m