Aos olhos de Pedro Nuno Santos, “nós hoje temos um PSD que está radicalizado” — a apreciação foi partilhada, esta semana, em entrevista televisiva à CNN Portugal. O candidato a líder do PS desenvolveu o raciocínio e concretizou: no seu entender, um governo PSD-IL seria “muito mais radical do que aquele que nós tivemos no tempo da troika“, em grande medida porque a IL representa um “projecto radical“. Mesmo na oposição, considera Pedro Nuno Santos, este “PSD radicalizado” tornaria difícil negociar entendimentos com o PS em questões de regime. Traduzindo: a estratégia de Pedro Nuno Santos para ganhar o seu partido e depois o país passa por apontar que, à direita do PS, só existem radicais.
Já vimos mil vezes o truque ser aplicado: os líderes socialistas tendem a preparar eleições colocando-se no papel de único garante da normalidade democrática, ostracizando a direita e agitando fantasmas de um fascismo iminente. Ao longo de décadas, na boca dos dirigentes socialistas, Cavaco Silva, Sá Carneiro e Passos Coelho foram perigosos radicais enamorados pelo autoritarismo do Estado Novo. Agora chegou somente a vez de Luís Montenegro ser o alvo dessa calúnia e de Pedro Nuno Santos (o mais provável novo líder do PS) proferi-la. Nada mais do que a velha “táctica do salame”, como escreveu Miguel Pinheiro.
Acrescenta pouco salientar que a argumentação de Pedro Nuno Santos é ridícula, inconsistente e condenatória para metade (ou mais) do eleitorado que, olhando às sondagens, estaria então a alinhar-se com partidos radicalizados. Os socialistas também o sabem e, se insistem na calúnia, é porque acreditam na sua eficácia eleitoral. Ora, é precisamente aí que está o meu ponto: desconfio que essa eficácia se tenha esgotado. É hoje mais provável que essa estratégia eleitoral, que tantas vitórias valeu aos socialistas, contribua para a derrota do PS liderado por Pedro Nuno Santos nas eleições legislativas do próximo Março.
Em primeiro lugar, falta a Pedro Nuno Santos a autoridade política para acusar os seus adversários de radicalismo. Uma coisa foi ouvir, nas décadas de 1980 e 1990, tais ataques nas intervenções de Mário Soares, um homem a quem eram reconhecidas convicções de moderação democrática. Outra coisa é escutar acusações de radicalismo lançadas por Pedro Nuno Santos, um político intempestivo que se orgulhou de ser o rosto da geringonça, que protegeu a união do PS aos comunistas e aos bloquistas, cujas posições são assumidamente radicais (por exemplo, contra o nosso modelo económico) e que, no caso do PCP, se tornaram explicitamente alinhadas com interesses estratégicos russos e, portanto, inimigas da UE e de Portugal. Ao alegar que toda a direita está impregnada de radicalismo, Pedro Nuno Santos tenta vestir o fato do moderado que o país sabe que ele não é, pelo que o único efeito obtido é uma polarização que expõe o seu sectarismo.
Em segundo lugar, as pessoas não são estúpidas e tendem a não gostar que as tratem como se o fossem. O surgimento e o crescimento do CH provocam incontáveis problemas ao centro-direita. Mas oferecem uma pequena vantagem: é hoje evidente o que distingue o centro-direita da direita populista, inviabilizando insinuações credíveis de que toda a direita partilha um projecto radical. Em 2022, o PS ainda conseguiu alimentar essa ilusão, porque o PSD de Rui Rio não se distanciou clara e atempadamente de cenários pós-eleitorais com André Ventura. Mas, para 2024, a clareza de Luís Montenegro na exclusão do CH tirou esse trunfo aos socialistas. E insistir nele, como tem feito Pedro Nuno Santos, é agarrar-se a uma ideia forçada, que poderá animar o eleitorado das franjas à esquerda do PS, mas em que ninguém ao centro acredita.