1. Apelidar António Costa de habilidoso é, cada vez mais, um eufemismo político — é mesmo uma forma suave de não lhe chamar aldrabão. Costa engana, omite, esconde e até mente com uma regularidade que já impressiona. É verdade que a habilidade (leia-se eficácia) com que o faz diferencia-o dos restantes políticos mas, ‘no final do dia’, a realidade económica dos portugueses não melhorou, nem vai melhorar, com as fantasias ou ilusões de António Costa. Pelo contrário.

Portugal não só continua a perder poder de compra para a média da União Europeia (UE) como foi no mandato de António Costa que este indicador inverteu uma tendência de recuperação depois do mínimo de 75,2% da média da UE atingidos em 2012: descemos de 77,2% da média da para 76,6% em 2017 — ligeiramente abaixo dos 76,8% atingidos em 2016. Ou seja, estamos ainda mais longe do nosso melhor resultado: 84% em 1999.

O nosso crescimento económico de 2,8% em 2017, apesar de ter sido comemorado com fogo de artifício pelo Governo como o mais elevado elevado do séc. XXI português, não só foi apenas o 20.º mais elevado do ranking da UE, como países do ‘nosso campeonato’ estão a crescer muito mais do que Portugal: Irlanda (7,2%) República Checa (4,3%), Estónia (4,9%), Letónia (4,5%), Lituânia (3,8%), Eslováquia (3,4%), Eslovénia (5%) e Hungria (4%). Isto já para não falar da Espanha que cresce há três anos consecutivos acima dos 3%, cavando um buraco cada vez maior para Portugal.

As perspetivas para os próximos quatro anos do Banco de Portugal e da Comissão Europeia são ainda mais arrasadoras para Portugal: depois de um resultado ligeiramente acima dos 2% em 2018, é bastante provável que voltemos a crescer abaixo desse valor. Ou seja, deveremos ter quatro anos de desaceleração económica com um crescimento anémico que provavelmente fará com que Portugal seja ultrapassado pela Eslováquia em termos de poder de compra, depois da Estónia e da Lituânia já o terem feito.

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Portanto, quando ouvimos os auto-elogios de António Costa pelos feitos do seu Governo é destes números que temos de recordar. Porque são estes dados que permitem perceber se o país está no caminho certo para cumprir o grande desígnio do regime democrático: assegurar aos portugueses um poder de compra dentro da média europeia. Bem pode Costa garantir que não se deixa iludir pelos seus feitos que o registo de auto-elogio não passa disso mesmo — de uma grande, tremenda e irrefutável ilusão.

2. A verdade é que não nos podemos queixar. Os avisos estão à nossa vista desde que António Costa se coligou com os partidos mais retrógadas e conservadores do nosso espectro político-partidário e prometeu virar a página da austeridade — que, agora, são só “anos difíceis”.

A ausência de reformas dignas desse nome que permitam colocar o país a crescer anualmente mais do que 3% — e bem mais do que a média da União Europeia. Para tal, é essencial atrair investimento direto estrangeiro, face à descapitalização do nosso sistema financeiro e das nossas empresas. Apesar de termos melhorado a performance, ainda estamos muito longe dos países de leste do ‘nosso campeonato’.

Em vez de tentarmos reduzir a nossa carga fiscal sobre a produção e as empresas, assim como sobre as famílias, seguimos o caminho inverso: batemos o record de impostos do Estado em percentagem do PIB. Nunca como hoje se cobraram tantos impostos sobre a riqueza do país. Se somarmos as contribuições sociais, estamos a falar de 36,9% do PIB em 2017. E com tendência para subir em 2018.

Pior: no que diz respeito a impostos sobre a produção e importações, Portugal tem uma taxa de 15,1% do PIB — superior à da UE (13,6%).

Uma vez mais, os países do ‘nosso campeonato’ da UE seguem o caminho contrário com uma carga fiscal realmente competitiva para atrair investimento direto estrangeiro: Irlanda (23,5% do PIB), a Roménia (25,8%) e a Bulgária (29,5%).

Não será por acaso que a Roménia, juntamente com a Polónia, República Checa, Hungria e Eslováquia são dos países da UE que conseguem atrair mais investimento direto estrangeiro, como já recordamos aqui.

Estes dados só provam que o excesso de peso do Estado na economia pode ser o sonho de partidos como Bloco e o PCP — que sonham em transformar Portugal numa espécie de Venezuela em que o regime político toma conta da economia para destruir tudo o que seja privado — mas nada disto é do interesse da prosperidade económica do país.

3. Há muitos outros sinais que continuamos a ignorar. Por exemplo, a excessiva dependência que Portugal começa a ter face ao turismo. O peso deste sector no PIB já é de 9% e vale 20% das exportações. Tem atraído muito investimento em termos de imobiliário mas o excesso de peso do turismo na economia que faz com que a política de baixos salários e de mão de obra com baixo valor acrescentado seja ainda mais preponderante — um factor que contraria uma grandes promessas de António Costa em termos de política salarial.

É bom termos um sector turístico competitivo mas precisamos de ter um sector industrial com perfil exportador igualmente competitivo, sob pena do Ministério da Economia ter de mudar de nome para Ministério do Turismo. A reindustrialização de que falava Álvaro Santos Pereira é fundamental para o futuro do país.

Temos ainda o eterno problema chamado dívida. Apesar da dívida pública ter descido em termos de peso sobre o PIB, não pára de subir em termos nominais. Com a desaceleração do crescimento económico, a situação da dívida vai agravar-se. Já para não falar da subida da Euribor, a taxa diretora mais utilizada nos contratos de crédito da habitação, que se avizinha a partir de 2019.

4. E depois temos os esquecidos. É assim que devem ser classificados os trabalhadores do sector privado no activo — pelo menos, para esta maioria PS/PCP/BE. Não fazem parte dos dois grupos eleitorais core escolhidos por António Costa e os seus parceiros (funcionários públicos e pensionistas), não são representados pelos sindicatos da CGTP e da UGT (a taxa de sindicalização no setor privado e residual) e pagam todo os impostos, taxas e taxinhas impostas pelo Governo sem tossir nem mugir.

Entre professores, médicos, enfermeiros, funcionários judiciais, do fisco, do Serviço Estrangeiros e Fronteiras, entre muitos outros, todos têm direito a reclamar progressões de carreiras, aumentos salariais, menos horas de trabalho (35 horas contra 40 horas) e mais direitos na proteção do trabalho, nos salários e nas pensões. Não é por isso de admirar que, entre 2011 e 2017, o salário médio do sector público tenha subido 6% contra apenas 3% no sector privado.

O país cada vez mais desigual entre a função pública (com 671 mil trabalhadores) e os trabalhadores do sector privado (quase quatro milhões) que está a ser construído pelo Governo Costa não é coisa que tire o sono nem ao Presidente da República omnipresente nem à comunicação social.

5. A Opinião Pública ficou surpreendida com o facto de a manifestação nacional dos coletes amarelos ter sido um enorme flop. Confesso-vos que não faço desse grupo. Enquanto que França é governada por um reformista (o presidente Macron) contra quem os gilets jaunes protestavam, Portugal é governada por um conformista (António Costa) que está focado em ter uma maioria absoluta em 2019. A receita, aliás, é simples: não reformar para manter as regalias de pensionistas e funcionários públicos.

Vivemos uma ficção criada pelo Grande Elias do séc. XXI. Enquanto o personagem de António Silva inventava esquemas para sacar dinheiro aos amigos, António Costa finge ser um otimista irritante para vender a ilusão de que uma maioria absoluta do PS em 2019 levará o país ao caminho da riqueza material e da felicidade eterna com pouco esforço. É provável que, tal como aconteceu com os ilusionistas António Guterres e José Sócrates, seja bem sucedido.

Bom Ano Novo para todos os leitores.