O navio da República Portuguesa recentemente tornado notícia pelos factos abundantemente conhecidos foi baptizado com o nome do rio Mondego. Este nosso rio é carinhosamente conhecido pela população como o Bazófias, pois bazofiava na época das chuvas com um grande caudal, ficando reduzido no verão a fiozinhos de água, serpenteando por entre a muita areia. Ou seja, é um rio fingido. Ora inunda, ora seca. Não merece qualquer confiança.

As semelhanças entre o Bazófias rio e o Bazófias navio são mais que muitas. Ao que consta, e não foi desmentido, o navio padece de várias avarias graves, que, não o impedindo de navegar, o obriga a fazê-lo em condições de segurança precárias. Não é necessário ser engenheiro naval para se entender, que, se não possuiu as redundâncias obrigatórias – só funciona um motor –, caso este se avarie ficará a navegar ao sabor das ondas. Como, pelas razões conhecidas, o navio não saiu ao mar para a sua mais recente missão, nunca saberemos se aconteceria algum evento desagradável ou se tudo voltaria a suceder “normalmente”. Os exercícios de história alternativa são isso mesmo, alternativos sobre o que poderia suceder, mas não sucedeu. Neste caso, imaginemos a história alternativa de – azar dos – o navio ter saído e ficado imobilizado no oceano por avaria, que seria insuperável sem o auxílio de outra embarcação. Como a missão do Bazófias navio era a vigilância de um suposto barco espião russo e como não estamos em guerra com a Rússia, se a avaria fizesse perigar a vida dos tripulantes do Bazófias navio, seria a embarcação mais próxima – neste caso o vigiado – que teria a obrigação, segundo as leis consuetudinárias do mar, de o socorrer. Teríamos então a suprema humilhação de a marinha portuguesa ser resgatada pela marinha russa que supostamente deveria vigiar. Seguramente, o comandante do Bazófias navio seria demitido – no papel do tradicional bode expiatório – pois nessa situação já se iria convenientemente concluir que o navio não estava em condições de navegar com segurança e não deveria ter aceite a missão. Entretanto como dano colateral, o Almirante Chefe do Estado Maior da Armada ficaria em muito maus lençóis militares e políticos. Mas isto é história alternativa.

O que sucedeu, face à insubordinação de parte da tripulação, foi o cancelamento da missão do navio, um processo disciplinar aos militares insubordinados e o Bazofias navio lá continuará com outra tripulação menos insubordinada a cumprir as suas missões, tal como o Bazófias rio lá vai fingindo que tem suficiente regularidade para merecer o titulo de rio.

Confesso que não sei se a qualidade e eficácia dos meios ao dispor dos nossos serviços públicos, de que os navios da Armada são uma pequena parte, foi sempre assim tão má e só agora demos por isso porque passou a ser notícia, portanto mais um problema estrutural, ou se a degradação acentuada é resultado de opções políticas e orçamentais recentes.

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O que se mostra notoriamente actual é uma situação de inédito descontrolo do desempenho, qualidade e prontidão de quase todos os nossos serviços públicos, sejam na saúde, na educação, no atendimento aos cidadãos etc.

No caso dos militares insubordinados do Bazófias navio, é claro que serão disciplinarmente punidos, pois sabem e não podiam deixar de saber, que estão sujeitos às regras da disciplina militar. Em Portugal nem existe conscrição e, portanto, só é militar quem quer.

O que se mostra surpreendente, ou talvez já nada nos deva surpreender, é o facto de neste mesmo momento uma inteira classe profissional da função pública, os funcionários judiciais, se encontrar em situação de insubordinação permanente, (chamam-lhe greve, mas claro que greve não é isso) comparecendo ao serviço e auferindo o respectivo vencimento, apenas executando as tarefas que muito bem entendem. Tudo isto ocorre há várias semanas, sem qualquer atitude disciplinadora por parte do governo e da respectiva tutela. Parece que aguardam uns pareceres…

Assim, se alguns dos militares, no final do processo, forem dispensados da Armada, sugiro que se candidatem a funcionários judiciais, onde – longe das agruras do mar – cumprirão apenas as tarefas que entenderem e terão uma vida calma das nove às cinco da tarde, com ordenado, diuturnidades, ADSE e subsidio de refeição. Quem é que disse que não se pode ter o melhor de dois mundos?