António Costa é o grande destabilizador da política portuguesa desde 2015. Quebrou a regra não-escrita de que o partido mais votado deveria formar governo, mesmo que minoritário. Foi sempre assim na política portuguesa até 2015.

Sob a sua liderança, o PS fez pela primeira vez coligações parlamentares, para governar (e não para fazer oposição a governos de direita), com partidos da extrema esquerda que se opõem a princípios fundamentais do regime democrático pluralista e europeu que existe em Portugal desde a década de 1980. Pode argumentar-se que a geringonça durou 4 anos, mas começou a fragmentar-se em 2019, e fracassou em 2021, provocando eleições antecipadas.

Ou seja, António Costa foi incapaz de manter as coligações que formou em 2015, provocando uma crise política. Bem pode culpar o Bloco e o PCP pelo chumbo do orçamento, mas não é fácil de acreditar. Quando há um desentendimento entre quem se entendeu, a culpa é de todos. O passa culpas é visto apenas como desculpas.

Na campanha eleitoral, Costa começou por pedir uma “grande maioria”, uma “maioria clara” que desse estabilidade ao país. Depois, entusiasmado com as primeiras sondagens, pediu mesmo uma “maioria absoluta”, de novo em nome da “estabilidade” (chegando ao cumulo de tratar o Presidente da República como o guardião do bom comportamento dessa maioria socialista).

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Por um breve período, ensaiou uma variante da maioria absoluta, namorando uma coligação com o PAN e o Livre, o que seria na verdade uma maioria absoluta socialista, mas anti-caça e anti-touradas e com um pouco de mais dinheiro para a cultura.

Neste momento, na última semana da campanha, já está disposto a falar com todos (“menos com o Chega”, o que não quer dizer que não o faça), contrariando o que havia garantido aos portugueses. Costa afirmou e reafirmou que preferia demitir-se a negociar com o PSD, e que a geringonça estava morta. Agora, já pode ressuscitar a geringonça e entender-se com o PSD, com a IL e com o CDS.

Já todos os portugueses entenderam que Costa quer falar com todos para continuar como PM. Mas cometeu um grande erro ao pedir a maioria absoluta. Há coisas que não se pedem, merecem-se; ou não, e são os eleitores que decidem. Aparentemente, para os portugueses, Costa não merece a maioria absoluta. Mas o erro foi ainda mais grave quando Costa colocou a maioria absoluta como a condição para a estabilidade. Assim, depois de o PM ter colocado a questão nestes termos, se os portugueses recusam a maioria absoluta a Costa significa que não o olham como um factor de estabilidade, mas de instabilidade. O desfecho natural seria uma derrota de Costa no domingo. Posso estar enganado, mas neste momento, julgo que o cenário mais provável será a vitória do PSD.

Bem sei que Costa prometeu demitir-se se o PS perder as eleições. Mas não é certo que o faça. Já mudou tantas vezes a sua posição, por que razão não poderá mudar mais uma vez? Ou seja, o cenário de 2015, vitória do PSD com maioria de esquerda no parlamento, pode repetir-se. Nesse caso, Costa poderá ser tentado a repetir a geringonça. O Bloco e o PCP estarão de novo disponíveis. E a justificação para uma nova geringonça será a seguinte: evitar um governo de direita apoiado pela “extrema direita” do Chega. Mesmo que Rio garanta que pretende apenas formar um governo minoritário com o CDS e com a IL, as esquerdas vão jurar que as intenções de Rio serão alargar os entendimentos ao Chega. Todos nós sabemos que em Portugal as esquerdas conhecem sempre as ‘verdadeiras intenções das direitas’.

Após as eleições, Portugal voltará a estar dividido entre a “esquerda anti-fascista” e a “extrema direita”. Nada existirá entre as duas. Estará assim aberta a porta para uma nova geringonça. No início de 2022, após uma crise política, eleições antecipadas, no meio de uma pandemia, podemos voltar a 2015, a uma solução que acabou em 2019 e que fracassou completamente em 2021. Eis a definição de instabilidade. E eis o maior perigo para Portugal depois de domingo. Tem um rosto e chama-se António Costa.