– Precisas de ajuda?

Eu estava a tentar fixar na parede uma prateleira de madeira exótica e pesada. Primeiro, tinha marcado com um lápis o local, relativamente à outra parede e ao chão. Depois, tentei marcar os vários pontos onde os parafusos deveriam ficar colocados, de forma a que tudo ficasse perfeitamente nivelado, na horizontal.

E que pesada era o raio daquela madeira exótica!

Quando tentei fazer os furos com o berbequim, deparei-me com o problema de sempre: ou a broca é pequena demais e a bucha depois não entra, ou a broca seguinte é já grande demais e a bucha fica nadar.

Enquanto ruminava furioso sobre o porquê de ser sempre assim e ninguém ter ainda inventado brocas ou buchas de tamanho intermédio, reparei que os furos que já tinha feito estavam talvez uns milímetros desviados da marca do lápis. Uns para cima, outros para baixo, jamais aquela prateleira ia ficar horizontal!

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Eu suava, o pó resultante dos furos sujava o chão, já tinha ferido um ou dois dedos da mão direita, quando a minha mulher, ao ouvir-me falar em termos que habitualmente não uso (afinal eu não rumino para dentro, mas falo sozinho e em voz alta nestas ocasiões), entrou na sala e me perguntou:

– Precisas de ajuda?

Qualquer homem a ler este texto sabe exactamente o que eu senti nesta altura. Certo?

Mas penso que a maioria das mulheres não faz ideia.

A vida é difícil.

Os homens odeiam que lhes ofereçam ajuda não solicitada. Isto é verdade em toda e qualquer situação. Mas é especialmente verdade quando:

  1. aquilo que estão a fazer lhes está a correr mal, a ser um insucesso e um falhanço.

  2. quem oferece ajuda é do sexo oposto.

E a coisa complica-se ainda mais. Porque, sendo verdade que os homens não querem (nunca!) que lhes ofereçam ajuda, é também verdade que gostam que esta surja de forma instantânea e no momento preciso em que a consideram necessária e em que a pedem. No fundo, o que eles desejam é uma mulher perfeita, invisível mas sempre pronta a aparecer de imediato quando solicitada e a fazer exactamente tudo o que eles querem (precisam), mesmo que o não consigam explicar bem por palavras, lendo-lhes os pensamentos se possível.

Também, que raio!, não é pedir muito, pois não?

Por sua vez, as mulheres odeiam ter de pedir ajuda. A ajuda é para ser oferecida, não para ser pedida.

(Minto: isto não é verdade. As senhoras não se importam de pedir ajuda quando a necessidade desta não é óbvia e imediata. No entanto, é possível que o façam de uma forma indirecta, velada e não evidente ou compreensível para qualquer homem.)

Mas o que as põe mesmo fora de si são as ocasiões em que estão obviamente afogadas numa ou em várias tarefas em simultâneo, e o homem presente não está a fazer nada e, mesmo assim, é incapaz de perguntar o que pode fazer para as ajudar.

Qualquer mulher a ler este texto sabe exactamente a que me refiro, não? E a maioria das mulheres seria capaz de imediatamente perceber o que se passava e oferecer-se para ajudar, certo?

Infelizmente, os homens, mesmo perante óbvios pedidos de ajuda, como suspiros prolongados, pequenas exclamações de frustração, ou mesmo frases do tipo “estou tão cansada” e “porque é que nunca ninguém me ajuda nesta casa?”, são capazes de fingir que não se apercebem da necessidade de oferecer os seus préstimos e a sua ajuda (sim, porque é fingimento, nenhuma mulher acredita que seja possível eles não ouvirem ou não perceberem o que se passa).

Como melhorar este estado de coisas?

Homens, quando estiverem em casa, sem nada para fazer, descontraídos, relaxados e felizes, parem imediatamente. O perigo é real e iminente. Tentem perceber onde está e o que faz a vossa mulher. Se ela não estiver em casa ou a encontrarem no sofá a dormitar, tudo está bem, podem continuar na vossa actividade preferida, sem fazerem nada e com o cérebro na “caixa do nada”, a pensar em coisa nenhuma.

Mas se a encontrarem a fazer alguma coisa (e a probabilidade de isso acontecer é elevada), perguntem-lhe se precisa de alguma ajuda. Meus amigos, a vossa felicidade conjugal vai aumentar tanto quanto as coisas que vocês vão passar a fazer em casa.

Mulheres, percebam que os homens apreciam a solidão quando estão a fazer alguma tarefa de complexidade superior ao que uma criança com 4 anos e uma pequena deficiência consegue realizar sozinha. Deixem-os em paz. Mas preparem-se, porque a qualquer momento eles poderão necessitar e pedir ajuda, sempre emergente. Nessa altura, irão estar bastante enervados e pouco disponíveis para responder a perguntas do género de “mas porque é que não viste logo que isso ia correr mal e não começaste por fazer as coisas da maneira correcta?”.

Eu sei que não é fácil. Ter sempre razão é cansativo, acredito. Mas têm de os deixar proteger a sua frágil masculinidade com a ilusão de que são capazes de fazer tarefas difíceis sem a vossa supervisão, ajuda, e palavras sensatas.

Que loucos!

Tenho esperança que este meu texto ajude, pelos menos alguns de vós, a compreenderem melhor o outro. E a compreenderem-se melhor a vós próprios também.

Quanto a mim, a primeira coisa que fiz foi parar para respirar, e agradecer a oferta de ajuda. Depois, pedi que me trouxesse o aspirador para ir apanhando o pó, enquanto eu ia pensando como raio ia conseguir acertar os buracos e as buchas e os parafusos e encaixar os comentários finais de “a prateleira não ficou lá muito direita, pois não?”.