A DGS tomou a decisão de não recomendar a vacinação universal de crianças e adolescentes dos 12 aos 15 anos. A única indicação será nos casos com comorbilidades associadas. Por outro lado, abre a possibilidade deste grupo etário poder fazer a vacina, caso haja uma prescrição médica.

Esta recomendação da DGS não me surpreende, atendendo a certas vozes contra a indicação da vacina nestas idades, invocando risco de miocardite pós inoculação. Mas este adiar na tomada de posição, com necessidade de aguardar por mais estudos científicos, faz parte da sua política nos momentos importantes, tal como aconteceu noutras situações anteriores. O não reconhecimento da importância do uso de máscara no início da pandemia é apenas um dos exemplos. Por incrível que pareça, também naquela altura a DGS estava à espera de mais estudos e provas científicas para chegar a alguma conclusão.

Afirmar que as vacinas podem provocar miocardite é uma verdade científica, mas não podemos esquecer que a Covid-19 também provoca a mesma inflamação, para não falar de outras sequelas graves já amplamente divulgadas.

Era importante a DGS informar melhor a opinião pública sobre a percentagem de miocardite em cada uma das situações, para os pais poderem decidir se querem ou não que os seus filhos sejam vacinados. Não é esta mensagem que temos passado à população adulta ao longo destes meses sobre a importância da vacinação? Que os benefícios são maiores que os riscos?

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Dizer que a maior parte das crianças já foram infetadas não chega para justificar a não vacinação universal deste grupo. Onde estão os números que dão credibilidade a esta afirmação?

Esta faixa etária, agora não contemplada, pode ficar infetada com outras variantes mais agressivas que certamente irão surgir a curto e médio prazo. Posteriormente irão contagiar as pessoas mais velhas. Muitos cidadãos não quiseram ser vacinados por pura opção individual. E mesmo as pessoas já vacinadas com duas doses podem ficar infetadas pelo vírus. A vacinação não garante cem por cento de imunidade e vai perdendo a eficácia progressivamente. No início da pandemia, tive a oportunidade de disser numa entrevista à Agência Lusa, em 23/2/2020, a seguinte frase: “Só com medidas corajosas é que podemos ganhar terreno. Se tivermos medo de atuar vamos perder o timing ideal”. Infelizmente, ao longo destes 18 meses, este “timing ideal “ tem faltado muitas vezes.

Este “timing ideal “voltou a não surgir agora, porque era importante que a população estudantil dos 12 aos 15 anos fosse vacinada pelo menos com uma dose antes da abertura das aulas. Há países, como, por exemplo, a nossa vizinha Espanha, onde esta faixa etária já pode usufruir da vacina anti-Covid-19.

Não acredito que Espanha tenha tomado esta decisão de vacinar as crianças e os adolescentes de ânimo leve, sem se basear em evidência clínica. A Autoridade Sanitária espanhola assumiu esta decisão. Em Portugal, não será certamente por falta de coragem que os profissionais de saúde deixarão de prescrever o que é indicado: vacinar, vacinar e vacinar mesmo neste grupo, para o bem da Saúde Pública e em defesa destes jovens que têm os mesmos direitos da população adulta.

A Madeira tomou a decisão certa quando aconselhou vacinar todos os jovens dos 12 aos 18 anos. Foi a decisão mais sensata e zelou pelos interesses da população estudantil,  protegendo indiretamente os cidadãos mais velhos.

Tal como noutras situações em que a DGS demorou a tomar a decisão certa, tenho esperança que a curto prazo encontre a tal evidência científica tão importante para assumir uma posição adequada à situação que estamos a viver.

Neste momento não existe nenhuma razão científica válida para que este grupo etário não seja incluído no plano universal de vacinação. Os benefícios são superiores ao risco de miocardite. Caso não fosse assim, Espanha e Estados Unidos, entre outros países, não informariam da importância da vacinação à população jovem. As outras vacinas que são aplicadas às crianças e adolescentes também não são isentas de riscos, mas continuam a ser recomendadas, fazendo parte do Plano Nacional de Vacinação.

A própria Agência Europeia de Medicamentos (EMA) concluiu que há uma relação entre casos muito raros de miocardite em pessoas que foram imunizadas com as vacinas da Pfizer-BioNtech ou da Moderna para a Covid-19, nomeadamente em jovens com menos de 30 anos, mas os benefícios da vacinação continuam a ultrapassar largamente os riscos. Ambas as vacinas usam a tecnologia RNA mensageiro. Segundo alguns estudos, poderá ser esta a causa da inflamação do miocárdio, mas carecem de confirmação.

Portugal tem seguido a orientação da EMA. Não se entende o porquê desta hesitação. Atitude prudente ou defensiva? Na minha perspetiva não foi mais do que falha no “timing ideal “ para a vacinação universal deste grupo dos 12 aos 15 anos. Infelizmente…