No lugar de comemorar de forma atabalhoada e improvisada o 46º aniversário do 25 de Abril, seria mais sensato transferir as comemorações para mais tarde, quando a pandemia estiver dominada, e celebrar esse dia a 25 de Novembro. Trata-se não só de uma questão de saúde pública e organização logística, mas também de um acto de justiça histórica.

À excepção das forças políticas da extrema-esquerda (Bloco de Esquerda, Partido Comunista e filiais), os partidos e a sociedade civil democráticos compreendem que, se não fosse o 25 de Novembro de 1975, os princípios ideológicos e sociais do 25 de Abril de 1974 teriam sido espezinhados por uma minoria revolucionária.

Álvaro Cunhal, secretário-geral do Partido Comunista Português, decalcando ideias e métodos realizados por Vladimir Lénine, cujo 150º aniversário do nascimento os comunistas portugueses e “toda a humanidade progressista” assinalam no dia 22 de Abril, não escondia que o seu objectivo era transformar a “revolução burguesa” do 25 de Abril em “revolução socialista”, para a qual as condições amadureciam rapidamente durante o “Verão quente” de 1975.

A tentativa de transformar Portugal na “16ª república soviética” ou numa “nova Cuba livre” foi travada por militares e políticos nacionais que compreenderam que semelhante rumo iria conduzir a uma catástrofe social, económica e política.

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Além disso, as forças democráticas gozavam do apoio de parceiros internacionais, principalmente dos sociais-democratas europeus e dos Estados Unidos.

No plano externo, até a União Soviética tinha clara noção de que a desobediência do PCP em relação às suas ordens no que respeitava à continuação do “processo revolucionário em curso” teria consequências funestas no plano internacional. Recorde-se que, em Agosto de 1975, foi assinada a Acta Final de Helsínquia, que reconhecia a zona de influência da URSS na Europa e previa o respeito por parte das autoridades soviéticas dos direitos humanos. Uma vitória para o Kremlin que exigia o respeito pela primeira parte da Acta Final, mas espezinhava a segunda parte. Ora, se o PCP e os seus aliados continuassem o assalto ao poder, mandariam “por água abaixo” os resultados de longas e aturadas conversações entre a URSS e o Ocidente. Por isso, Moscovo ordenou o fim da experiência revolucionária marxista-leninista-estalinista em Portugal, país membro da NATO.

Existe outra razão para que o 25 de Abril seja comemorado a 25 de Novembro. É que este ano se assinala o 45º aniversário do movimento militar e político que travou a derrapagem da sociedade portuguesa para o totalitarismo de extrema-esquerda.

Por isso, seria sensato, finalmente, juntar as comemorações das duas datas, muito importantes para a História de Portugal. As forças democráticas gozam do apoio social capaz de concretizar esta justiça histórica, há muito tempo adiada.

Todavia, receio que tal não vá acontecer por duas razões:  falta de coragem do Partido Socialista, que continua a não dar muita importância ao movimento do 25 de Novembro, embora nele tenha estado profundamente envolvido o mais importante dos seus dirigentes: Mário Soares, e o receio de irritar as suas “muletas” da extrema-esquerda, tanto mais que estas poderão ser muito úteis no período do pós-pandemia para continuar a governar.

Mais tarde ou mais cedo, o 25 de Abril e o 25 de Novembro passarão a ter igual peso e importância na História de Portugal.