O ensino da medicina não pode nem deve estar centrado exclusivamente no modelo conservador de ensino de diagnóstico prestação de cuidados, mas sobretudo num foco diferenciador: a melhor evidência cientifica disponível e a investigação, combinadas com a realidade da sociedade onde essa medicina é investigada, desenvolvida, prestada e informada. Por isso, FM, ULisboa abre as suas portas à comunidade. Convidando dois nomes incontornáveis da sociedade: mundo da política e da economia da saúde. Pita Barros e Passos Coelho.

Num dos seus artigos “Momentos económicos e não só” o economista da saúde, um dos dois nomes mais citados no mundo, afirmou que o “orçamento para 2023 coloca o peso da despesa em saúde, no conjunto das despesas públicas, no valor mais elevado da última década. Porém, grande parte deste reforço está associado a efeitos preço – não se antecipando um aumento significativo da capacidade de prestação de cuidados de saúde”. Se o SNS é “uma proteção para todos solidariamente” devemos interrogar-nos se “estaremos a viver um novo PPREC) agora na saúde?”, um interrogação que Pedro Passos Coelho lançada no grande debate. Tentámos compreender o atual modelo irracional na saúde: o homem gasta, os incentivos são mal desenhados, existe uma gestão inadequada aos tempos e as grandes unidades de saúde têm vindo a prestar mais serviços. Nas grande áreas metropolitanas, o caso de Lisboa, a oferta privada de saúde era mais focada na hotelaria que no tratamento e prestação. Hoje, a oferta privada responde completamente e estão na vanguarda da tecnologia de ponta em saúde.

Há 30 anos, as carreiras médicas já eram más, hoje são piores e os grandes professores e os grandes diretores, nomes referência por especialidade, já são oferta na saúde privada. Que oferece plenamente mais organização e excelente comunicação com o seu público, maltratado no público. A gestão é rigorosa: o setor público pode ter contas equilibradas ou sobretudo prejuízo. O Estado emite a fatura. Os contribuintes pagam. O setor privado não. O secretário de estado das finanças decide as contas e os números da saúde. A força do privado todos estes anos focou-se na privatização da saúde. daí o PPREC na saúde! Isto tem uma mensagem. E é clara: uma saúde para ricos que podem pagar seguros de saúde ou saúde privada e um SNS para os pobres, que não podem pagar seguros de saúde e não têm outra solução senão esperar. Às vezes, a espera pode significar a perda de vida, o caso de doenças cardio e cerebrovasculares e neoplasias).

Foram estas ideias que quisemos compreender, com as políticas públicas de saúde e as políticas económicas de saúde, com as explicações Passos Coelho e Pita Barros, moderadas por José Manuel Fernandes.

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Na sua lição para a disciplina de medicina baseada na evidência e literacia em saúde, Passos Coelho e Pita Barros combinam o que têm sido as políticas sociais, em Portugal no passado, e o como os alunos do mestrado integrado de medicina (MIM) a veem no presente. Portugal não se dedicou durante muitos anos às questões sociais.

Curiosamente, numa votação inquérito em direto, conduzido por Pita Barros, os alunos votam em primeiro lugar, para se manter “numa carreira no SNS” nas “condições remuneratórias”, seguida da “conciliação com a vida familiar”. E só depois no horário de trabalho. O paradigma mudou. Hoje, com uma Lei de bases completamente virada à esquerda, em que não se dividem os diferentes níveis de responsabilidade, os futuros médicos não se revêm numa carreira que não se foque na meritocracia.

Quando Passos Coelho se refere ao PPREC, quer significar Processo Público de Reprivatização em Curso. Na sua lição, pretendia justamente que os nossos alunos do Bloco A e B da disciplina de MBEeLS notassem esse contraste entre o processo revolucionário liderado pela esquerda, que nacionalizou e desestruturou quase tudo em Portugal, e o processo de reprivatização em curso liderado pela esquerda que perversamente está a fortalecer os privados. Pita Barros reforça esta ideia com números: os prestadores públicos representam 8,9 MM€ (48%) e os prestadores privados (inclui medicamentos) 12,2 MM€ (52%). Algo está a funcionar de forma errada. No fundo, são pessoas comuns, os contribuintes – utilizadores do sistema de saúde – os pagadores, são eles que sempre as que pagam a fatura! O total da despesa em 2020 foi de 21 mil milhões de euros, antes pandemia SARS-CoV2, para que não haja desculpas. O sistema não funciona.

Nas realidades sociais não se fazem contas e o preço a pagar depois é muito alto e o endividamento dispara. Trata-se de um problema de gestão, de menor produtividade. As realidades agregadas do SNS e do SS não têm sido tão suficientes como tenta a tutela mostrar. O artº 64 da Constituição reitera que o sistema é universal e tendencialmente gratuito. Enquanto isso, a despesa em saúde dispara. O dinheiro de bolso em saúde pesa cada vez mais. Se há acesso à saúde pública em condições, quem quer pagar do seu bolso? Não há desculpas para isto acontecer. Os números nem sempre são os melhores. Se cada vez mais a despesa privada pesa mais, ou a qualidade da saúde no setor público não é aquilo que os contribuintes esperam ou o tempo não responde com eficiência às doenças. A saúde que é nossa em primeiro! Nunca os seguros pagaram e nunca foram tantos. Algo não bate certo: chama-se desorganização em saúde e gestão dos serviços de saúde. E é preciso comunicar este assunto aos portugueses, aos futuros médicos, aos stakeholders. Contribuir para a literacia em saúde dos portugueses e literacia económica em saúde.

Realiza-se assim o Fórum Saúde.com com a disciplina de medicina baseada na evidência e literacia em saúde (MBEeLS) na faculdade de medicina de lisboa, que se divide em duas partes. A MBE, o conjunto da informação disponível para os diferentes intervenientes na saúde, dos profissionais de saúde à população e dos decisores políticos às políticas de saúde. Este conjunto de informação compreende, entre outras, as áreas do diagnóstico, prognóstico e terapêutica. É assim relevante desenvolver competências sobre onde encontrar, avaliar criticamente e interpretar as diferentes fontes de informação que a constituem. Estas competências são fundamentais para comunicar evidência científica aos diferentes públicos-alvo, pessoas, contribuintes pagadores, para que as virtudes e as limitações da mesma sejam corretamente compreendidas, contribuindo assim para o processo de decisão; e LS conhecer as principais fontes de informação sobre as doenças e terapêutica, criando um maior conhecimento em saúde pelas pessoas, capacitando, influenciando e apoiando as decisões das pessoas em saúde e no desenvolvimento de competências na interpretação de planos de informação, comunicação e de projetos em saúde que promovam a literacia em saúde e para a saúde. Objetivo: visando ganhos na saúde das pessoas, individuais e coletivos e promoção de estilos de vida saudável. Na prática, fazer diferente: empoderar os nossos públicos. Quem decide são as pessoas, doentes ou não.

A MBELS, com o Fórum saúde.com visou capacitar os alunos de medicina da FMUL, este ano coorganizado com o 9º Beyond Med, com dois nomes incontornáveis: Pedro Pita Barros e Pedro Passos Coelho e moderação de José Manuel Fernandes. Um alento ver o grande auditório repleto de alunos, cheio. Participativos e interessados com o que está a acontecer no sistema e terá impacto no futuro do sistema em Portugal.

A lição foi fechada aos meios de comunicação. Estaremos a viver um novo PPREC – Processo Público de Reprivatização em Curso no SNS, levado a cabo pela esquerda? À semelhança do PREC, também conduzido pela esquerda – que se traduziu na nacionalização que desestruturou quase tudo em Portugal? Ficou a ideia, para ser interpretada pelos alunos. O futuro da saúde, afinal, depende destes jovens médicos. Literacia, claro!