Até há uns anos, seguia o futebol religiosamente. Mas não era religiosamente no sentido em que uma pessoa se diz “católica por tradição”. Quer dizer, também não era religiosamente como o Bin Laden seguia os ensinamentos do Alcorão. Mas era um religiosamente já bom, ao nível daqueles cultos que enchem pavilhões poli-desportivos e que, só numa tarde, expulsam o demónio dos organismos de alguns três autopullmans de fiéis.
Depois, a vida mudou um pouco e deixei de seguir o futebol. E assim continuaram as coisas até aos últimos meses. Altura em que, para escrever o que quer que seja sobre o governo, e mais especificamente acerca do primeiro-ministro, passou a ser impossível não acompanhar tudo o que é jogo da bola. Isto porque, neste momento, a agenda de António Costa e os calendários da Federação Portuguesa de Futebol, da Liga, da UEFA e da FIFA são mais coincidentes do que membros deste governo e casos de alegada corrupção.
A última destas coincidências forçou o primeiro-ministro a deslocar-se à Nova Zelândia, para assistir ao jogo de estreia de Portugal no campeonato do mundo de futebol feminino. Viagem que, por coincidência, obrigou a uma outra estreia. A de um primeiro-ministro chegar atrasado e sair mais cedo de uma reunião do Conselho de Estado. Em terminologia de gestão de mercadorias, António Costa é, portanto, um primeiro-ministro LIFO: Last In, First Out (e eu convencido que tinha esgotado as chances de aplicar os conhecimentos adquiridos nas aulas do Contabilidade do 10º ano. Que naive). Já em terminologia informal, é mais comum o chefe do executivo ser considerado, não LIFO, mas PÍFIO. Em qualquer dos casos, resta a certeza de nos ter saído uma bela encomenda.
De início, esta deslocação de António Costa à Nova Zelândia pareceu-me apenas mais uma corriqueira afronta ao zé-povinho. Só que não. O primeiro-ministro só foi à Nova Zelândia, porque a Nova Zelândia fica mesmo a caminho de Timor-Leste, onde o líder do governo chegou ontem para uma visita oficial. Vamos lá ver. Fica mesmo a caminho se uma pessoa, ao levantar voo de Portugal, seguir para oeste, bem entendido. Opção que, nesse caso, resulta no caminho mais longo para chegar a Timor-Leste… Mas não interessa. O que interessa é que Costa está em Dili.
E interessa perguntar, igualmente, porque motivo António Costa, tendo parado na Nova Zelândia para ver a selecção portuguesa, não aproveitou para parar em Vanuatu. Isso, sim, foi um escândalo. Que Vanuatu é mesmo ali ao lado, e foi onde, por estes dias, se realizou mais uma etapa da Liga Vanuatuana de land diving. Modalidade percursora do moderno bungee jumping, mas em que são atadas aos pés dos atletas umas absolutamente inelásticas trepadeiras. Um desporto que dizem ser óptimo para quem deseja esticar as costas poupando em osteopatas. E do qual é vedeta maior, Anitelu Chenoweth, ainda descendente do explorador português Pedro Fernandes de Queirós que, em 1606, descobriu aquele arquipélago (eu sabia que não tinha esgotado as chances de aplicar os conhecimentos adquiridos nas aulas de História do 11º ano. Que perspicaz).
Portanto, à atenção do primeiro-ministro. Já para o mês que vem realiza-se a final da Taça Vanuatuana de land diving, na qual Anitelu Chenoweth é apontado como grande favorito. É o mínimo que se pode exigir a António Costa: ir a Vanuatu apoiar Anitelu Chenoweth nos seus saltos para o vazio pendurado por trepadeiras, deixando, por cá, vários interlocutores em reuniões importantes, também eles, pendurados.
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