Não tenho dúvidas de que a crise foi provocada pelo PS e sobretudo por António Costa, mas estou com dúvidas sobre a real intenção. O que sei é que o que aconteceu, a meio de uma legislatura cair um governo PS, não é novidade. Foi assim com Guterres, com Sócrates e agora com Costa. O fator comum destas crises é o facto de sempre que as coisas começam a correr mal o PS sai do governo, culpando uns e outros, considerando-se sempre do lado da razão e com cenas teatrais de incredulidade para com quem discorda da sua opinião. Aliás foi isso que fez nas últimas semanas, dizendo que não considerava possível a esquerda não aprovar um orçamento que era o mais de esquerda de todos os tempos.

Sabemos hoje, pela quantidade de demissões no Serviço Nacional de Saúde que as coisas não estão a correr bem no reino do, na palavra do Governo, reforçado SNS. Basta ler as últimas notícias, de norte a sul do país começam a destapar-se, no pós-covid, os males sociais que a geringonça ajudou a agudizar. Greves e mais greves! Na educação os males são ainda piores, com a agravante de termos sindicatos amorfos que apenas marcam greves depois de orçamentos aprovados. Adiante.

O PS, no pós-crise sanitária, em plena campanha autárquica, apostou forte na promoção do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), associando-o ao PS e achando que os portugueses não conseguiriam discernir que esse dinheiro é dos portugueses e não deste ou daquele partido. O que se percebeu também foi que a bazuca não vai resolver os problemas reais de cada um de nós. Não melhora, por exemplo diminuindo o tempo de espera do SNS, para uma consulta de especialidade (estomatologia está com quatro a seis meses de espera) ou a antecipação de uma cirurgia. Não melhora, pois os combustíveis aumentam a cada semana, com a cegueira ambiental que impera, e nem a “gorjeta” que o governo anunciou minimiza o problema numa sociedade fustigada por impostos. Não melhora, pois o mais provável é que a inflação faça subir as taxas de juro e assim teremos um país próximo da rutura. Apercebendo-se disso o governo o que faz? Foge. Mas porquê?

O governo promoveu a crise política porque ainda assim calculou que este seria o melhor momento para ir a votos. Como se sabe os efeitos da crise sanitária estão longe do auge e o PRR fará o seu papel paracetamol – não cura mas mantém-nos sem dor. Num futuro próximo as dificuldades irão com certeza criar mais descontentamento e colocar a nu que os últimos seis anos de geringonça, primeiro assumida depois dissimulada, não foram, nem de perto nem de longe, anos de melhorias significativas, apenas algumas ilusões de descongela aqui e recupera com uma taxa acolá, para além da técnica de cativação usada durante todo o primeiro mandato. O objetivo desta austeridade escondida, onde a classe média paga mais impostos que em 2011, onde o micro subsídio tem sido solução – IVAucher é um belo exemplo – foi o de tornar os portugueses cada vez mais dependentes de um super-estado e consequentemente eleitores garantidos.

Na realidade, o que a geringonça fez foi debilitar a sociedade através de políticas económicas que não criam riqueza, apenas reparte, através de subsídios do Estado, a pobreza. Com o apoio incondicional das esquerdas mais extremas, criou nos portugueses uma cultura de ditadura das minorias que em vez de unir em torno daquilo que nos une, prefere separar e até tribalizar. Chegámos assim, em seis anos, praticamente à cauda da União Europeia em quase todos os indicadores económicos. Um Estado que quer ser cada vez mais tentacular e uma sociedade cada vez mais dependente. Precisamos mesmo de uma mudança de rumo, com ideias claras de um país com propósitos sociais amplos e económicos de progresso. Para isso há que dar tempo, legítimo, para que às legislativas se apresentem os melhores líderes de cada partido, ou os mesmos com legitimidade reforçada, com projetos consistentes para o país aproveitando o PRR, mas sobretudo estruturais. Só assim garantiremos que os próximos anos não nos mantenham na decadência socioeconómica a que a geringonça nos trouxe.

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