Na semana passada estiveram em Portugal representantes da OCDE. Mas enquanto aqueles que apresentaram um relatório sobre a investigação científica avançaram algumas ideias interessantes, outros desta organização apareceram, possivelmente em nome individual, associados a ideias bizarras sobre o ensino.
Reconhece o relatório sobre investigação que é necessário prosseguir o investimento na ciência e dar-lhe estabilidade, pelo que critica as “frequentes cativações”. Alerta para a inexistência de uma estratégia global, fala de uma necessária “especialização em áreas de excelência”, critica o “uso ineficaz de recursos escassos”. Sustenta que o financiamento da FCT para bolsas de doutoramento não está a ser direcionado para áreas de investigação prioritárias.
Afirma ainda que o financiamento de “doutoramentos em áreas onde existe pouca procura” é “mau uso de dinheiros públicos” que “encoraja as pessoas a prosseguirem um modelo de formação e carreira que as desvia de opções mais produtivas”.
Mais, alerta para o risco de se “perpetuarem expectativas irrealistas” sobre oportunidades de uma carreira académica e defende a integração de investigadores no mundo empresarial. Finalmente, nota o insuficiente registo de patentes, considera que se deve incentivar a realização de doutoramentos em empresas e defende uma política de bolsas através de programas doutorais.
Ou seja, o relatório da OCDE veio dizer o que já muitos tinham notado, mas que parecia de mau tom notar. Aguardam-se os resultados.
Pela mesma altura, e com a presença também de responsáveis da OCDE, houve uma discussão sobre o ensino que se revelou um ataque concertado à avaliação dos conhecimentos. Sobre o pretexto de atualizar o sistema de acesso ao ensino superior, retomaram-se os velhos e caducos argumentos contra a avaliação dos estudantes.
É claro que pode fazer sentido atualizar o sistema de acesso ao ensino superior, e aí é preciso que se diga claramente como, para se perceber se aparecem propostas novas, justas, equilibradas e que permitam igualmente uma admissão com base no mérito. Mas só por ingenuidade se pode acreditar que é isso que está em causa nas intervenções dos últimos dias. Para a conclusão do Secundário montou-se ao longo dos anos um sistema de avaliação externa e uniforme que é o melhor que existe no país. Foi esse sistema que incentivou um rigor que depois se transmitiu ao Básico, onde finalmente, em 2005, foram introduzidos exames, e permitiu que Portugal começasse a subir nas avaliações internacionais. A pressão tem sido sempre de cima para baixo: para os alunos virem mais bem preparados, sempre mais bem preparados. Não sejamos ingénuos: há quem não goste!
Fala-se também no “dilema” de “ensinar para o mundo de amanhã ou para o exame nacional” O que volta a ser absurdo. Como se o conhecimento fosse inimigo da preparação para a vida!
Critica-se a existência de uma via facilitada para alunos do ensino profissional, como antigamente existia e como parece que se pretende voltar a fazer, mas será mais justo destruir todo o sistema? Claro que o processo de admissão deve ser flexível, sem um modelo igual para todos – mas as entradas em medicina não exigem já exames diferentes dos de filosofia? Até onde deve ir a flexibilização? Até cada um saber apenas aquilo que ele próprio acha que deve saber?
A pressão para acabar com os exames aparece ainda justificada com a pretensa flexibilização curricular. Mas a flexibilização curricular não é nova. Ela apareceu em 2014 exatamente com os 25% de que agora se fala. Só que a flexibilização original preservava as disciplinas essenciais, as metas e a avaliação: cada escola podia seguir o caminho que pretendesse, desde que os seus alunos alcançassem mínimos comuns, avaliados externamente. Só uma flexibilização inimiga da exigência pode querer destruir essa avaliação externa. E desmantelar a avaliação independente seria desonrar um esforço de décadas para melhorar o ensino.