A necessidade de debate traz o risco de exposição. Quando um partido perde, o confronto interno entre alternativas é natural e previsível, mas exige responsabilidade, na medida em que o debate entre militantes é feito na praça pública. Depois das derrotas eleitorais deste ano, o centro-direita será confrontado essa dicotomia: nem sempre a urgência de clarificação anda de mão dada com a recuperação de credibilidade.

Entre os mais distintos, tem sido defendida a ideia de entendimento à direita. Nem o projeto nem a tentação são novidades. Têm raízes profundas – e de sucesso – na nossa democracia e basta conhecer afinidades pessoais entre lados para ver que a distância é hoje mais curta do que aparenta. Mas, tal como a necessidade de debate, a exposição de intenções tem riscos. Este texto é sobre eles.

Do ponto de vista pragmático, tenho a maior das reservas sobre essa exposição de intenções. E por razões muito concretas. O facto de a direita estar constantemente a dizer ao mundo o que vai fazer não a aproximou minimamente da possibilidade de fazer alguma coisa. Olhemos para o exemplo oposto: se o dr. Costa se tivesse candidatado em 2015 com uma ‘geringonça’ contra a coligação PàF, teria conseguido a maioria parlamentar que lhe permitiu governar durante quatro anos? Não, pois não? Se, depois, o dr. Costa tivesse negociado a solução de governo dizendo ao PCP que chegaria a 2019 com um ministro a presidir ao Eurogrupo e a defender superávites, teria chegado a primeiro-ministro? Também não.

A vantagem estratégica do PS está aqui: a direita não tem a menor ideia do que António Costa fará amanhã, mas toda a gente sabe o que a direita gostaria de fazer depois de amanhã. Esta semana foi, aliás, prova disso: o homem ganhou as eleições, está indigitado primeiro-ministro e anda a passear por Lisboa como se estivesse a negociar peixe fresco no mercado de domingo. A direita, que perdeu, assume prontamente um posicionamento para um futuro ainda distante. O PS, que vai governar, assume o mínimo que pode para um futuro que chega amanhã.

De um ponto de vista realista, é importante prepararmo-nos para a possibilidade de não acontecer nada. Isso mesmo: nada. Um dos erros que derrotou politicamente a oposição nos últimos quatro anos foi a falha no diagnóstico. A ‘geringonça’ era um novo PREC e um encore da bancarrota de José Sócrates – e não foi nada disso que aconteceu –, do mesmo modo que a vitória do PS em 2019 trazia a ameaça de uma supremacia da esquerda que não surgiu. Não nego que a absolutização do poder socialista constitui – e constituiu – um perigo para o regime, mas devemos preparar-nos para a possibilidade de simplesmente não se passar nada – no fundo, como nos últimos quatro anos.

Para os que olham para a união do centro-direita como solução, e eu incluo-me neles, a hipótese de ‘ficar tudo na mesma’ deve ser tida em conta. Um PSD com Rui Rio, uma Iniciativa Liberal polarizadora e um Chega anti-sistema não têm interesse imediato nessa solução. E, na política, nunca é bonito ficar a falar sozinho.

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