Longe vão os dias em que a convicção dominante era de que a substituição de António José Seguro por António Costa na liderança do PS permitiria ao partido disparar decisivamente para a ambicionada maioria absoluta. A pouco mais de uma semana das eleições o PS de António Costa luta taco a taco para ficar à frente da coligação que governou Portugal nos últimos quatro anos.

Seja por efeito do desgaste provocado pelos sacrifícios exigidos nos últimos quatro anos (como argumenta José Manuel Fernandes) ou do potencial efeito de voto útil à esquerda (como arrisca Paulo Baldaia ao prever que o PS ganhará com uma vantagem superior a 5 pontos), é certamente possível continuar a considerar o PS como favorito, mas ninguém no seu perfeito juízo dará como assegurada uma maioria absoluta do PS.

Ora, como bem alertou Nuno Garoupa, Portugal (em princípio) não acaba no dia 4 de Outubro e, se não houver uma maioria absoluta, no dia 5 de Outubro podemos de facto estar confrontados com a mais grave crise institucional dos últimos 40 anos. Se do lado da coligação ninguém esperaria vida fácil, vários factores concorreram para tornar também progressivamente mais difícil a vida do PS e de António Costa.

A atracção fatal pelo radicalismo syrizista que seduziu parte do PS não ajudou, assim como não ajudam os persistentes sinais de radicalização interna do partido. Depois, claro, há a inescapável figura de José Sócrates a pairar sobre a campanha e em especial sobre António Costa. A confusão interna em torno das presidenciais também veio na pior altura e o processo de constituição das listas esteve longe de ser o ideal para promover a união e coesão interna do PS. A somar a tudo isto, a acumulação de sinais de recuperação económica, ainda que ténua e pouco consolidada, liquidou a narrativa da “espiral recessiva”.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Restava a António Costa a campanha para arrepiar caminho e se afirmar como alternativa credível mas também nesta dimensão as coisas, como se sabe, não têm corrido até agora particularmente bem, não obstante o acumular de promessas. Como cereja no topo do bolo, António Costa veio adicionalmente garantir não viabilizar o orçamento em caso de vitória sem maioria absoluta da coligação. Isto apesar de num passado não muito distante ter defendido, em nome da governabilidade, a doutrina contrária.

Face à radicalização do PS, um cenário sem maioria absoluta conduzirá portanto aparentemente a uma crise institucional ou a uma “solução” de um governo de coligação do PS com a extrema-esquerda, com tudo o que isso implicaria para o país. Suspeito que muitos analistas e académicos vêem essa possibilidade com bons olhos e a considerariam até uma “normalização” do sistema partidário e um avanço progressista. Não estou no entanto certo que a maioria dos eleitores comuns partilhe essa visão, incluindo uma boa parte do eleitorado tradicional do PS.

Com o país no limiar da bancarrota, cerca de 50% do eleitorado votou PSD ou CDS em 2011. Mesmo fazendo fé nas sondagens mais simpáticas para a coligação, uma parte significativa desse eleitorado está – com boas razões – desiludida ou mesmo zangada com a coligação. Resta saber como reagirão esses eleitores à perspectiva de se absterem ou de votarem em António Costa e acabarem com comunistas ou bloquistas no governo do país.

Professor do Instituto de Estudos Políticos da Universidade Católica Portuguesa