Depois de no primeiro impacto após o referendo muito se ter falado de qual será o impacto de uma saída, na economia do Reino Unido, da Zona Euro e no sentimento geral, nos últimos dias, tem ganho forma uma interrogação: o Brexit vai mesmo acontecer ou o (agora) famoso artigo 50 do tratado de Lisboa nunca chegará a ser acionado?
Logo nos dias imediatamente a seguir ao referendo confirmou-se que o (eventual) “plano” dos apoiantes da saída parecia ser negociar as condições de um novo acordo – o mais simpático possível, em que se possa manter no mercado comum, criando barreias a imigração – ainda antes de formalizar a saída. No entanto, tal não só parece impossível, já que nem a Comissão, nem o Conselho Europeu, o aceitam. Sem grandes surpresas, e para evitar que outros países sigam o exemplo do Reino Unido, as negociações para a saída não serão fáceis, pelo menos nesta fase.
Os dois candidatos anunciados ao Partido Conservador falam em cumprir o decidido no referendo, no entanto, não referiram nem quando, nem como… Mas tendo em conta a incerteza, quer do lado dos conservadores, quer dos trabalhistas, não será cada vez mais provável um cenário de eleições antecipadas, em que a permanência na UE será o principal tema? E nesse caso, nas eleições não haverá espaço para um novo referendo, caso a maioria do parlamento seja a favor da permanência?
Os mercados parecem estar descrentes ou da saída, ou das palavras da União Europeia. Ou seja, ou antecipam que a Câmara dos Comuns não aceite que o Reino Unido acione o artigo 50 ou que as palavras mais duras dos lideres Europeus são apenas um instrumento negocial. Tendo em conta os desenvolvimentos dos últimos dias, a primeira hipótese parece mais provável.
Não só as ações europeias e americanas já recuperaram parte da queda após o referendo (ainda que estejam 5% e 2% abaixo) como até o índice inglês Footsie 250 já praticamente recuperou das quedas pós-referendo – o índice composto pelas 100 maiores empresas e mais exposto ao mercado global já está até acima do valor de fecho da passada quinta-feira.
As taxas de juro das obrigações públicas quer americanas, quer europeias, e principalmente do Reino Unido, estão ainda bastante abaixo, já que se antecipa que os bancos centrais ou não subam taxas (FED), ou desçam ainda mais as taxas directoras, ou aumentem os programas de compra de activos (BCE e Banco de Inglaterra). Finalmente, a Libra não recuperou face as restantes moedas, algo que até é positivo para a economia britânica já que uma depreciação da moeda poderá compensar a instituição de pautas aduaneiras
Apesar da grande incerteza presente em todas as estimativas do impacto económico de uma eventual saída, o Reino Unido será sempre diretamente mais prejudicado do que a União Europeia. Não só as exportações do Reino Unido para a União Europeia representam mais do que as exportações em sentido contrário (quase 50% do total versus 10%), mas também, as mesmas exportações em percentagem do PIB tem uma proporção maior – cerca de 10% no caso do Reino Unido e menos de 4% no caso da EU. No caso da zona euro, que é uma economia mais fechada, e onde cerca de 22% do total das exportações vão para o Reino Unido, o impacto no PIB e ainda mais reduzido – cerca de 2,5% (curiosamente praticamente o mesmo valor de Portugal). Claro que estes rácios apenas dão uma noção da ordem de grandeza da exposição das economias, o impacto efetivo nas exportações/PIB dependerá sempre do tipo de acordo após a saída.
O impacto indireto e obviamente mais difícil de estimar e depende não só do acordo após a saída, mas também do tempo que a incerteza atual se manter e de novas ondas de choque nos mercados financeiros. Algumas empresas já anunciaram o adiamento ou congelamento de investimentos. Quanto mais tempo permanecer o Reino Unido sem um primeiro-ministro em plenas funções e sem um plano para o que virá depois do referendo, pior para a economia britânica.
Economista