Adolfo Mesquita Nunes, Ana Catarina Mendes, Ana Gomes, António Leitão Amaro, António Lobo Xavier, Assunção Cristas, Cecília Meireles, Fernando Medina, Francisco Louçã, João Cravinho, João Ferreira, João Galamba, Jorge Coelho, José Eduardo Martins, José Luís Arnaut, José Pacheco Pereira, Luís Montenegro, Manuela Ferreira Leite, Marco António Costa, Mariana Mortágua, Marisa Matias, Marques Mendes, Paulo Portas, Paulo Rangel, Pedro Delgado Alves, Pedro Silva Pereira, Rui Tavares, Telmo Correia. Estes 28 políticos têm, ou tiveram durante o último ano, uma participação fixa e regular em programas televisivos. A proliferação de comentadores-políticos é tal que a lista estará possivelmente incompleta e, de resto, não é difícil pensar noutros nomes do passado recente, com destaque para Marcelo Rebelo de Sousa, António Costa ou José Sócrates. De acordo com a revista Sábado, uma estimativa conservadora aponta para um mercado de (pelo menos) 1,2 milhões de euros – estará, muito provavelmente, perto dos 2 milhões de euros anuais.

Mais do que arregalar os olhos perante os salários elevados com que alguns deles são remunerados, importa assinalar o que aqui verdadeiramente está em causa. O problema não são os políticos, que fazem o seu trabalho. O problema também não é o dinheiro nem as estações de televisão poderem ou não ter esta opção editorial – é claro que podem decidir conforme quiserem e, nesse domínio, refira-se que a RTP decidiu abdicar de políticos no activo nos seus programas. A questão problemática que se tem de colocar diz respeito à submissão do debate público às agendas partidárias: uma participação esmagadoramente maioritária de políticos no comentário televisivo empobrece o debate, afunila a discussão, abre portas a interesses ocultos e diminui a missão de escrutínio da comunicação social sobre quem detém o poder político. Numa frase: este modelo de debate público por políticos-comentadores torna a sociedade portuguesa menos informada e, consequentemente, menos livre.

Não é de hoje. O comentário televisivo está há muitos anos minado de spin partidário e de ex-políticos a defender os seus interesses. Veja-se o caso actual de Fernando Medina, presidente da Câmara Municipal de Lisboa, que tem um programa em nome próprio e sem contraditório, no qual “analisa” a actualidade, inclusivamente decisões políticas da qual participa. A linha entre o comentário e a propaganda é, de facto, muito ténue.

O ponto está aqui: se esta for a lente a partir da qual se olha para os fenómenos sociais do nosso tempo, é inevitável que se fique com a visão turva e com uma compreensão manipulada dos assuntos que preenchem a actualidade. Por mais que alguns aleguem que os programas de políticos-comentadores prestam um serviço democrático (de acesso à posição dos partidos), é difícil contradizer o seguinte: nenhum debate televisivo semanal entre políticos é esclarecedor para o público, até porque funciona em circuito fechado, como extensão dos (pobres) debates parlamentares. E quem estiver minimamente informado adivinha, aliás, o que os políticos-comentadores irão defender. Pior: quem acompanha algum destes debates constata, sem surpresa, que importa mais o peso da agenda partidária do que a seriedade na exposição dos factos. Situação económica, desafios da governação, falhas nos serviços públicos – nada disto pode ser discutido nesses programas sem ser pela cartilha partidária e, simplesmente, não há discussão que, nestes termos, tenha qualquer utilidade.

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Pergunta óbvia: para que servem, então, os milhões de euros investidos pelas estações nos políticos-comentadores? Algum interesse terá para as estações, na medida em que continuam a apostar nesse modelo e a pagá-lo. Possivelmente, servirá para manter ligações directas com o poder político, nos seus vários quadrantes. Num país endogâmico e onde toda a rede de poder económico e político janta nos mesmos restaurantes, o modelo empresarial habitual consiste em encostar-se ao Estado ou, no mínimo, em cultivar uma certa proximidade. É, na prática, uma forma de sobrevivência – e lá vai funcionando.

A pergunta menos óbvia mas mais importante é, contudo, se existem alternativas. E, sim, existem. A situação actual beneficia as estações televisivas e os políticos (cuja visibilidade ajuda na subida da hierarquia partidária), mas é também a opção editorial que menos valor informativo e jornalístico tem: oferece narrativas partidárias, em vez de apostar nas investigações jornalísticas, nos estudos e nas opiniões formadas através da pesquisa, algo que uma maior participação de jornalistas, especialistas e académicos traria para o debate público. Não é, por isso, de estranhar que Portugal surja como um caso raro, visto que, nos países europeus, a presença de políticos-comentadores tende a ser reduzida. E, sobretudo, quando nesses países existe, tende a ser equilibrada com contraditório, com investigação jornalística, com informação rigorosa, com debates de peritos e com exigência de escrutínio público. É esse o modelo que faz sentido e que realmente tem valor jornalístico: pluralismo e informação de qualidade para esclarecimento dos cidadãos, em vez de um quase-monopólio de debates que transpiram agendas partidárias.

Dir-me-ão que esta crítica à excessiva participação dos políticos-comentadores tem anos. Sim, é verdade, o problema vem de trás. Mas, em 2019, a prevalência desse modelo tornou-se ainda mais difícil de justificar. Numa época em que a comunicação social puxou para si uma reforçada responsabilidade de esclarecimento do público, de combate às fake news e de escrutínio ao poder político, tem de ser visto com estupefacção que se continue a apostar nas opções editoriais que, precisamente, contrariam essa missão.