Julho, aí está ele todo pimpão. Regra geral, é um mês de decisões. Em Europeus e Mundiais, queremos dizer. Nunca à escala nacional. Até agora. Dois-mil-e-vinte representa uma mudança do paradigma e só vamos conhecer o campeão no sétimo mês do ano, algo inusitado. Quer dizer, já conhecemos campeões em Março (Benfica 1973), Abril (Porto 2011), Maio (uma catrefada), Junho (Benfica 1971). Agora Julho, nem um. É desta. Ainda falta muito para chegar ao destino. Enquanto isto vai e não vai, é obrigatória uma incursão ao passado, á única jornada da 1.ª Divisão em Julho. Dividida em dois momentos.
Duas jornadas, é isso? Dois momentos da mesma jornada. Seis jogos no dia 2, uma quarta-feira. E o sétimo no dia 6, um domingo. É o fascínio do campeonato 1946-47, o primeiro de todos com 14 equipas e sem o sistema de apuramento através dos regionais, o que implica o efeito de subidas e descidas, ainda hoje em vigor. É ainda a época do nascimento do famoso Sporting dos Cinco Violinos, campeão nacional com esclarecedores seis pontos de avanço sobre o Benfica (2.º) e 14 sobre o Porto (3.º). O ataque é arrepiante, 123 golos em 26 jogos. Dá uma média jeitosa de 4,73. Convenhamos, impossível de igualar. Quanto mais de superar.
Curto e grosso: 14 dos 26 jogos resolvem-se com vitórias por três ou mais golos de diferença. Começa bem, em Famalicão, com um esquisito 9-5. E acaba à maneira, em São João da Madeira, com um 6-2. Pelo meio, até o Benfica apanha forte e feio (6-1). Há mais, claro. Belenenses 3-0, Olhanense 8-0. Atlético 9-2 e 6-1, Estoril 5-0, Boavista 4-1, Elvas 9-1, Académica 9-1, Vitória FC 3-0, Famalicão (outra vez) 7-3, Sanjoanense (outra vez) 4-0. Escapam Porto (3-2 e 4-2) mais Vitória SC (3-1, 2-1). De resto é um fartar de vilanagem. O que diz bem da superioridade da equipa treinada pelo inglês Robert Kelly. O rei do golo é Peyroteo (42), seguido ao longe por Jesus Correia (28) e Albano (16).
Bem cedo se definem o primeiro (Sporting) e último classificados (Sanjoanense). Que, curiosamente, fecham a época fora de horas, cinco semanas depois do previsto. O problema é a má planificação da época por parte da federação. Além do aumento de equipas, acresce-se a realização de cinco jogos da Selecção, o último deles a resultar em muito falatório (10-0 da Inglaterra, no Jamor). Sem datas para respirar, suspende-se a Taça de Portugal e leva-se a 1.ª Divisão até Julho.
O cartaz proporciona jogos engraçados, repletos de golos. Só uma excepção à regra. No Lima, insosso 1:0 do Porto ao Atlético. Golo de Catolino, de penálti. A partir daqui, caro leitor, é um forrodobó. No Campo Grande, oito golos. Atenção, o Boavista marca os dois primeiros, por Serafim e Caiado. O Benfica reage a partir do minuto 26, por Melão. E empata antes do intervalo, por Arsénio. Na segunda parte, Julinho, Melão, Melão e Julinho fixam o 6-2. Na Amoreira, mais oito golos. Todos do Estoril ao Vitória FC. Ao intervalo, 5-0. O herói é Mota, autor de um póquer. Vieira e Lourenço, um bis cada. Na Amorosa, seis golos entre Vitória SC e Elvas (3-3). No Freião, o Belenenses dá 5-1 ao Famalicão com hat-trick de Teixeira da Silva. Na Padinha, o resultado mais gordo do dia. Ao intervalo, 7-0. No fim, 12-0. Que dia em Olhão, pobre Académica. O avançado Palmeiro marca todos os quatro golos antes do intervalo. Depois, descansa. Disso se aproveitam Soares (4), Moreira (2) e Eminêncio (2).
Passam-se quatro dias, eis o Sanjoanense-Sporting. Desce o pano, finalmente. O Sporting viaja sem Travassos, expulso na jornada anterior, vs Olhanense. No seu lugar, Armando Ferreira. Que anota o 0-2. Antes, Peyroteo. Depois, Peyroteo, Peyroteo, Peyroteo e Jesus Correia. Acaba 6-2. Os jogadores entram de férias e voltam daí a mês e meio. Mais de 70 anos depois, o futebol proporciona um regresso ao passado. Com início já hoje, em Alvalade.