Um dos factos que mais me tem impressionado nesta campanha eleitoral é o aparente desconhecimento geral de quais são os poderes do Presidente da República.
Aparentemente, a maioria desconhece que o Presidente da República tem apenas três poderes que não dependem de nenhum outro órgão: vetar, demitir o Governo e dissolver a Assembleia da República. De resto, sobra-lhe aquilo a que se tem chamado de magistratura de influência.
Olhando para o mandato presidencial que agora termina, é fácil perceber que Marcelo Rebelo de Sousa não tinha uma boa mão para jogar. Por um lado, tinha o Governo socialista, sem qualquer moral ou ética, capaz de tudo para se agarrar ao poder e dominar a máquina do Estado. Um Governo de tal maneira sedento de poder que fez o que nunca antes o PS tinha feito: um acordo com a extrema esquerda para poder governar. Do outro lado, uma oposição sem qualquer expressão ou força.
Mas, mesmo com má mão, Marcelo foi a jogo. Vetou mais do que qualquer Presidente da República desde o General Eanes, mostrou a porta de saída a vários ministros, não deixou cair no esquecimento casos como os incêndios ou Tancos, tentou proteger as instituições e, sobretudo, tentou sempre impedir o Governo de resvalar para a extrema-esquerda.
Tem-se ouvido repetidas vezes a acusação de que MRS tem sido a muleta do Governo. Só quem não olha para as sondagens (ou não reparou nos resultados das últimas legislativas) pode dizer tal disparate. Muleta do Governo foi a direita, incapaz de apresentar uma verdadeira alternativa às esquerdas encostadas. Nunca nestes cinco anos houve um momento em que o PSD estivesse próximo do PS nas sondagens, tendo os socialistas por diversas vezes estado próximos da maioria absoluta. Marcelo foi o único que conseguiu, de maneira eficaz ainda que limitada, conter o poder socialista.
Sei que muitos preferem bravatas e profissões de fé públicas à prudência de Marcelo. Mas a verdade é que qualquer ameaça do Presidente ao Governo seria absolutamente vã. Encostar o Governo à parede teria tido como único resultado empurrar o PS para as mãos do Bloco e eliminar a única possibilidade de moderação ao seu poder. Era bom que a direita que anda amuada com o Presidente da República percebesse, de uma vez por todas, que foi ele quem impediu que o pântano a que o PS conduziu o país fosse ainda mais fundo. E fê-lo, apesar dos constantes ataques dos bem-pensantes e bravos da direita, que preferiam ver o país a afundar de vez, mas manter-se no seu pedestal!
Percebo que Costa se procure encostar a Marcelo: este é o único capaz de lhe fazer frente. Só não percebo que boa parte da direita não só o deixe fazer, como ainda por cima o ajude, atribuindo ao Presidente culpas que pertencem ao Governo. Que a direita alinhe nesse jogo só se justifica com a sua tendência para o canibalismo.
Nos últimos cinco anos, MRS demonstrou a capacidade política de confrontar o Governo e limitar a extrema-esquerda, tudo isto sem qualquer apoio. Não me parece coisa pouca.
Só isto já seria motivo suficiente para apoiar a recandidatura de MRS. Mas, se a sua habilidade política faz do actual incumbente um bom Presidente, não é apenas por isso que merece a reeleição. Aquilo que mais me impressiona em Marcelo não é a sua mestria no tabuleiro político, mas a sua genuinidade nas relações e nos encontros com os cidadãos. Bem sei que é por vezes espalhafatoso, hiperactivo, chegando a ser cansativo.
Mas a verdade é que nos últimos cinco anos se interessou genuinamente por todos aqueles com quem se cruzou. Nos últimos cinco anos procurou ir ao encontro dos portugueses, sobretudo dos mais esquecidos e frágeis. E não se limitou às visitas de circunstância, mas abraçou, ouviu e falou com aqueles com quem se cruzou. Foi assim em Pedrogão, foi assim nos 10 de Junho no estrangeiro, foi assim nos hospitais, nos lares, nas visitas aos sem-abrigo. Percebe-se nele um interesse real e genuíno pelas pessoas e pelos seus dramas. MRS procurou verdadeiramente ser o Presidente de todos os portugueses, sobretudo daqueles que não estão habituados a ser ouvidos pelo poder.
Já sei que muitos dirão que se interessou, mas que nada mudou. Não é verdade. Houve milhares de portugueses que nestes últimos cinco anos foram ouvidos pela primeira vez. Milhares de portugueses cujas histórias e dramas conhecemos por acção do Presidente. Milhares de portugueses que sentiram, pela primeira vez, que há um político em Portugal que se preocupa.
Evidentemente, que os últimos cinco anos de presidência não foram isentos de defeitos ou problemas. Provavelmente poderia escrever todo outro artigo com os erros e defeitos do actual Presidente da República. Mas há dois factos que me levam a apoiar Marcelo Rebelo de Sousa sem dúvida: é um bom político, mas sobretudo, é um homem bom. E essa conjugação é rara. Só isso, já vale o meu voto.
Jurista