Estava a voltar para casa este domingo à noite quando ouvi na rádio que o Benfica tinha feito um comunicado a pedir que, até ao final da época, os seus jogos e os do FC Porto fossem dirigidos por árbitros internacionais e não árbitros portugueses. Depois da derrota no Clássico de sábado achei que este fim-de-semana o clube não conseguiria bater mais no fundo mas parece que me enganei. Sim, Artur Soares Dias fez uma exibição paupérrima no Clássico, a fazer lembrar arbitragens dos anos 90, mas não foi por aí que o Benfica perdeu o jogo. Até porque o árbitro errou para os dois lados ou acham mesmo que Taarabt não devia ter sido expulso?
É verdade que o Benfica se pode queixar da agressão de Marega a Taarabt que nem sancionada foi, da diferente dualidade de critérios na amostragem de amarelos, de um penalty mal assinalado e que é antecedido de falta ou até do insólito amarelo a Vlachodimos por este ter tirado a bola da mão de um apanha-bolas que se recusava a dar-lha. Isso é tudo verdade, mas o Benfica, na realidade, começa a perder o jogo com a má abordagem inicial de Bruno Lage.
O treinador português erra quando decide não incluir Cervi no onze inicial, optando antes por Rafa no seu lugar e Chiquinho no apoio a Vinícius. Rafa é provavelmente o melhor jogador do Benfica e aquele que mais desequilibra, por isso tem que jogar sempre, aqui nem há discussão. Agora, Bruno Lage devia ter colocado o português na posição de segundo avançado e relegado Chiquinho para o banco de suplentes, chamando Cervi para a posição de médio esquerdo. O argentino é fundamental no processo defensivo da equipa e no apoio a Grimaldo e Ferro, jogadores que deixam sempre muito espaço para o adversário explorar. Sérgio Conceição sabia bem que era por esse lado que o FC Porto podia ser mais perigoso e isso veio a provar-se durante o jogo. Ferro está num péssimo momento de forma, Grimaldo tem muitas lacunas a defender, Rafa não defende tanto como Cervi e o FC Porto aproveitou isso bem, com dois dos três golos a surgirem por esse lado.
E o Benfica só se pode queixar (ainda mais) de si próprio porque na segunda parte Bruno Lage volta a errar na leitura que faz do jogo. Com três pontas-de-lança em campo, o Benfica nem assim conseguiu jogar de forma a capitalizar isso. Na minha opinião, Bruno Lage abdicou demasiado cedo de jogar em posse, algo que até estava a conseguir fazer bem no decorrer da segunda parte, e partiu para o “chuveirinho”. Mas foi confrangedor ver o Benfica a não conseguir fazer esse jogo direto em condições, pois é um futebol que não é o seu, e aqui está o erro de Bruno Lage que deitou tudo a perder: “desistiu” demasiado cedo da identidade da equipa e daquilo que é a sua forma de jogar, para passar ao desespero de colocar mais homens na frente e esperar que, por milagre, uma bola caia perto deles e alguém a empurre para dentro da baliza. Mas essa foi provavelmente a fase em que a equipa foi menos perigosa e o FC Porto até esteve mais perto de dilatar a vantagem, o que prova que ter mais homens na frente não é necessariamente sinónimo de estar mais perto do golo.
Depois deste comunicado do Benfica, naturalmente, o FC Porto respondeu, por Francisco J. Marques, porque esteve é o circo habitual que é montado em torno do futebol português: semana após semana, Benfica e FC Porto digladiam-se na arena mediática dos meios de comunicação, com constantes acusações de ausência de verdade desportiva e falta de mérito do adversário, tentando a todo o custo pôr em causa o sucesso de uns e justificar o mau desempenho de outros. Este bate-boca ridículo entre águias e dragões tem continuado durante o domingo e prevejo que nos próximos dias haverá mais episódios.
(No meio disto tudo, pergunto-me onde anda a Liga Portugal? Chega de hashtags #futebolcomtalento, urge tomar medidas sérias para pôr cobro a esta atitude constante de pôr em causa a verdade desportiva e à escalada de toxicidade que cada vez mais conspurca o ambiente do futebol português. Os adeptos que gostam de futebol, independentemente da sua cor clubística, merecem isso.)
O Benfica pode queixar-se da arbitragem mas, mais do que isso, pode queixar-se de si próprio. Antes de procurar justificar as derrotas com fatores externos, deve olhar para dentro e perceber os erros internos, porque esses sim ajudam a explicar a derrota frente ao FC Porto e podem ser alvo de reflexão para não se repetirem. Porque a verdade é que o Benfica teima em não conseguir dar o golpe final ao FC Porto quando tem essa oportunidade e este fim-de-semana viu a distância para o rival ser encurtada para quatro pontos. Está relançado o campeonato e se os encarnados quiserem revalidar o título vão ter que trabalhar muito. O resto é paisagem.