Com os olhos postos na Guerra Israel-Hamas e, agora menos, na Guerra na Ucrânia, vamos tendo pouco espaço para nos ocuparmos com temas igualmente urgentes e importantes. E, no entanto, os sinais de alarme estão aí.
Foi publicado na semana passada, pelo IEP, Institute for Economics and Peace, um think tank sedeado na Austrália, o Ecological Threat Report (ETR), com conclusões que a todos nos devem preocupar.
Este Relatório cobre 3.594 sub-regiões do mundo e 99,9% da população mundial, tendo como objetivo avaliar as ameaças relacionadas com a insegurança alimentar, o risco hídrico, as catástrofes naturais e a pressão demográfica. As suas conclusões são assustadoras.
O IEP estima que, até 2050, 2,8 mil milhões de pessoas residirão em países que enfrentam ameaças ecológicas graves, das quais 1,1 mil milhões irão viver em países com baixa ou muito baixa resiliência social. Sendo a região da África-subsariana (em especial, na Etiópia, na Nigéria, na Somália e no Sudão do Sul) aquela que apresenta um risco mais elevado. A Europa e a América do Norte são as duas únicas regiões onde nenhum país enfrenta atualmente uma ameaça ecológica severa.
Em 2050, cerca de cinco mil milhões de pessoas poderão viver em zonas com insegurança alimentar elevada ou até grave.
Nos dias de hoje mais de dois mil milhões de pessoas, em todo o mundo, estão sem acesso regular a água potável, com 77 países onde o risco de acesso água potável é elevado ou grave, o que significa que mais de 20% da população mundial vive em zonas sem acesso seguro a água potável.
O risco de catástrofes naturais continua a aumentar, existem 44 países com um risco elevado de catástrofes naturais e que apresentam baixa resiliência social, aumentando o impacto destes fenómenos nas populações.
O aumento da pressão demográfica agrava os riscos causados pelas ameaças ecológicas, exercendo pressão crescente sobre os recursos públicos e a resiliência da sociedade. Ora, mais de 40% do mundo deverá registar um crescimento populacional superior a 20% até 2050 e quase metade deste crescimento ocorrerá em países com níveis muito baixos de paz e estabilidade política e social. Os 40 países menos pacíficos do mundo terão mais 1,3 mil milhões de pessoas até 2050. Prevê-se ainda que a população da África Subsariana seja de 2,2 mil milhões, ou seja, mais 60%, até 2050. O crescimento nesta zona será tão elevado que se prevê que a população total de pessoas com idade igual ou inferior a 15 anos na região seja superior à população total da Europa.
Estas previsões alteram, de forma substancial, a forma de ver o mundo, as nossas prioridades, as nossas reflexões e que respostas políticas encontrar e quando e onde as aplicar.
Problemas como que nova Ordem Mundial teremos ganham novos contornos, com o surgimento de poderes emergentes e novas zonas de conflitos. Onde as questões ambientais, as demográficas e, consequentemente, a falta de recursos e o fraco acesso, em especial, a água potável e bens alimentares associado à pressão demográfica, estarão na base da nova discussão política.
Mas não se pense que este será um problema focado e restrito à zona da África Subsariana. A mobilidade humana faz parte integrante da história do Homem e nunca o deixará de ser. As questões migratórias ganharão uma centralidade absoluta perante este cenário. Por isso, enganados estão os que julgam ser este um problema que não afetará, em particular, o continente europeu e o americano. Uma vez que, sem sítio para onde fugir, milhares de pessoas procurarão na Europa e na América do Norte o porto seguro de que necessitam para a sua sobrevivência.
É assim que a Europa precisa com urgência de pensar as suas políticas migratórias e de asilo, ao invés de adiar o problema. A Europa tem de ser capaz de responder e acolher, com dignidade, quem chega ao seu território e, para tal, deve ter definidas, com clareza, as regras de acolhimento de imigrantes, quantas pessoas, para que áreas da economia e definidas políticas de integração, como seja a aprendizagem da língua do país de acolhimento e o acesso à documentação para a legalização destes migrantes.
Por fim e tendo em conta as alterações climáticas, será este o momento ou não de discutirmos novas políticas e novos critérios de asilo? Devemos ou não proceder à alteração dos requisitos previstos na Convenção de Genebra Relativa ao Estatuto de Refugiado, de 1951, para a atribuição do Estatuto de Refugiado, passando a incluir uma noção de refugiado climático ou ambiental?
Com duas guerras, Israel/Hamas e Ucrânia, com o crescimento da influência económica da China, com a instabilidade política nos EUA e com a dificuldade de encontrar consensos em matérias importantes na Europa e o provável nascimento de uma nova ordem política mundial, teremos um dia de olhar para estes temas e para estas variáveis. Espero que não seja demasiado tarde para que, ao invés de uma resposta adequada, tenhamos uma resposta imediata, controversa e em total desrespeito pelos Direitos Humanos e pelo Direito Internacional.