Rui Rio, em entrevista concedida recentemente, disse que se o Chega moderasse as suas posições, o PSD poderia contemplar a possibilidade de uma aproximação ao partido liderado por André Ventura. Miguel Albuquerque foi mais contundente quando afirmou que o PSD deveria formar uma nova Aliança Democrática (AD) com o Chega, CDS e Iniciativa Liberal como parceiros. Presumo, quiçá erradamente, que a Iniciativa Liberal jamais perverterá o cosmopolitismo liberal, um dos seus mais importantes pilares ideológicos. A não ser, claro, que pretenda reduzir o liberalismo que preconiza a um mero rótulo, destituído de autenticidade ideológica, em nome do tacticismo eleitoral e da possibilidade de remover o PS do poder.

A julgar pelas declarações de André Ventura acerca da condição imposta por Rui Rio, o Chega não parece estar interessado em cooperar com a direita tradicional que, para os fervorosos seguidores da Nouvelle Droite, faz parte do “sistema” a que eles ferozmente se opõem. Parece-me plausível pressupor que Ventura e os seus estrategas acreditem que, se o Chega começar a jogar o jogo das alianças tácticas e do oportunismo eleitoral, o seu partido depressa perderá a sua aura revolucionária. A  crença de que o Chega é um partido outsider e impoluto que, qual força messiânica, transformará fundamentalmente a polis portuguesa, vale ouro (para os seus apoiantes). Qualquer compromisso com os partidos do sistema comprometeria a percepção da sua pureza ideológica. Por conseguinte, a reacção de André Ventura à proposta de Rio não surpreende. De todo. Revela, isso sim, muita sagacidade política, coragem e ambição. Um líder que não cede à tentação de um (potencial) ganho a curto prazo, ganha credibilidade perante os seus eleitores e simpatizantes.

Infelizmente, o líder do Chega, ao contrário dos restantes líderes partidários, parece ter compreendido uma das mais elementares e importantes lições da história política: em tempos conturbados, o povo anseia por clareza e determinação. Foi principalmente por esta razão que Pedro Passos Coelho surpreendeu todos e bateu o PS em 2015, não obstante as agruras da austeridade.

O que surpreende qualquer mortal razoavelmente sensato é a tentativa, por parte de Rio e de Albuquerque, de encetar uma aproximação ao Chega. Não lhes ocorre sequer a possibilidade de que qualquer rapprochement ao Chega possa ser interpretado pelos social-democratas como um inconfundível e muito humilhante sintoma de fraqueza ou até de desespero. O Presidente do Governo Regional da Madeira também parece desconhecer por completo a ideologia do Chega, profundamente influenciada pelas doutrinas da Nouvelle Droite. O Chega não é um partido conservador, como o CDS. É um partido revolucionário de direita, uma ameaça mortal para o conservadorismo democrata-cristão moderado que, como Lobo Xavier diz, com toda a razão (no programa Circulatura do Quadrado), conteve os ímpetos salazaristas de alguns membros do CDS.

A proposta de Albuquerque e o “se” de Rio são, na realidade, duas confissões de inépcia política. Se tivessem dito “nós não conseguimos ganhar sem o apoio do Chega”, o resultado teria sido exactamente o mesmo. Como pode a direita sair deste imbróglio? Quem ganhou as eleições de 2015? Duas perguntas, a mesma resposta.

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