Hoje sabemos muito mais do que sabíamos há um ano atrás e mesmo muito, mas muito mais, que há dois anos atrás. Parece que passou uma eternidade tal é o avanço da ciência nesta área, bem como em áreas conexas da ciência, e que adquiriram enormes vantagens do esforço de toda a comunidade científica à volta da temática da Covid-19.

Há novas variantes ao ritmo de uma por mês, que deixaram de mudar de nome (opções de comunicação da Organização Mundial de Saúde) e passaram apenas a mudar de número. Parece que agora estamos sempre com a Omicron, mas foi primeiro a BA.1, depois BA.2, e por aí fora e agora estamos com a variante BA.5 a tornar-se predominante por cá.

O ECDC avisou hoje que as variantes BA.4 e BA.5 deixaram de ser variantes de interesse (VOI – Variant of Interest) e passaram a ser variantes de preocupação (VOC – Variant of Concern) e que Portugal neste momento é um país com elevado risco de transmissão. Portugal é o pais do mundo com a mais alta incidência de novos casos a 7 dias e soubemos hoje que a Linha SNS24 atendeu mais chamadas até Maio deste ano do que em todo 2021.

Agora que a economia portuguesa parecia estar a recuperar, com estas notícias arriscamo-nos a perder novamente o Verão com os turistas estrangeiros, por medo destes, ou mesmo por nos colocarem em listas de destinos não recomendados outra vez, como aconteceu no verão do ano passado e há dois anos.

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Sabemos também que apesar das vacinas continuarem a proteger, protegem muito menos com estas variantes. Há já cientistas que advogam que as mutações na BA.4 e BA.5 são tão grandes, que com base no seu perfil imunológico, o vírus já deveria ser chamado de SARS-Cov-3.

Verifica-se que mesmo quem tem 4 doses, mesmo 2 semanas após a mais recente inoculação, é na mesma infectado quando deveria estar no nível máximo de anticorpos neutralizantes induzidos. Não é um bom sinal, nomeadamente quando comparado com os 95% de eficácia da vacina que tivemos contra infecções sintomáticas, contra as variantes anteriores, porque confiamos nas vacinas para nos proteger da doença grave – para evitar hospitalizações e mortes.

E depois essa ilusão da imunidade de grupo, que é cada vez mais um sonho inatingível. Do que se sabe, a cada infecção o vírus torna o nosso sistema imunitário mais sensível aos efeitos deste vírus, que se sabe agora aumenta a reacção imunitária do nosso organismo, provocando infecções em órgãos específicos do nosso corpo, ou pontualmente em casos mais graves, em vários…

Suspeita-se que as infecções hepáticas agudas em crianças sejam resultantes de uma infecção Covid prévia, que latente no organismo do paciente, provoca agora com uma co-infecção com outro vírus, uma infecção aguda do fígado, em linha com o que seria de esperar num vírus com as características SARS-COV-2. Já no princípio deste século (2004) estudos apontavam para as hepatites agudas como sendo resultantes de pós-infecção por SARS-Cov.

Sabemos também agora a que a Long Covid (ou Sindrome da Covid Longa), está presente na maioria dos pacientes infectados com Covid, e não se sabe bem quais os efeitos da mesma no longo prazo. Sabemos que imunidade humoral (anticorpos) não é nada garantida no caso de uma nova variante, e que a imunidade celular (linfócitos T), parece que acaba por ser a causa do síndrome inflamatório que se verifica com a infecção por Covid.

Sintomas como a perda de memória, perda de massa cinzenta, envelhecimento acelerado, potencial cancerígeno do vírus e outros, todos eles ainda não totalmente estudados, são preocupantes, e ainda não sabemos se estes quadros clínicos serão estáveis, regressivos ou evolutivos.

Temos uma situação altamente desfavorável de evolução acelerada do vírus, com aumento de escape imunitário das novas variantes, uma maior transmissibilidade e infecciosidade, uma proteção substancialmente menor contra a transmissão e a infecção, alguma redução na proteção vacinal contra hospitalização e óbitos, uma alta vulnerabilidade da imunidade adquirida por infecção e uma alta probabilidade de aparecerem novas variantes mais nocivas nos próximos meses.

Verifica-se em cima disto tudo, um aumento das infecções nos grupos de risco, nomeadamente nos lares, e começa a aumentar a pressão hospitalar, se bem que ainda abaixo do que se verificou em períodos de aumento de casos idênticos aos actuais.

E perante este cenário, estamos com o mais baixo nível de risco percepcionado da pandemia, as medidas de mitigação são residuais ou inexistentes, e continuamos a aceitar como bom que as pessoas se continuem a infectar. Até porque essa ideia de que o aumento de casos não é importante é perigosa, pois são infecções que geram mais casos, geram Long Covid, geram doenças, hospitalizações, em última instância mortes, e são também a base de novas variantes.

O que se exigia dos governos ocidentais era atenção ao tema, e decisões regulatórias, por exemplo, de melhoria da qualidade do ar em ambientes fechados, como escolas, restaurantes, escritórios e transportes. Este lavar de mãos permanente e atitude de avestruz, ao qual o próprio Governo português parece não ser imune, devia-nos deixar preocupados.

Nunca fui pessimista, mas como dizem muitos actores da comunidade científica, actualmente estamos a conseguir derrotar a COVID, mas estamos a perder a batalha contra a estupidez humana. É bem verdade que para perceber isso, bastaria olhar para o que se passa na Ucrânia, com uma guerra neste Século XXI. Será que não estaremos reféns da situação de cansaço acumulado ao tema Covid? Será que não deveríamos estar preparados para a eventual possibilidade do agravamento da pandemia?

Deixar de usar máscaras ao ar livre faz todo sentido, pois há enorme quantidade de estudos efectuados, que demonstram que a transmissão ao ar livre é diminuta. Mas deixar de usar máscaras em ambientes fechados, sem ao mesmo tempo assegurar regulamentação que assegura a qualidade do ar nesses espaços, é displicente, quase negligente.

Deixar de disponibilizar testes gratuitos para a população, num momento em que a incidência está a disparar, não faz sentido nenhum. Deixar o vírus circular livremente, com o seu escape imunitário seja às vacinas, seja pelo risco de reinfecção, sem testar e portanto sem sabermos por onde anda, deixando-o entrar nos lares, nos hospitais, nas escolas, nas nossas casas, é também negligente.

Deixar os infectados, sair de isolamento ao fim de 7 dias, sem voltar a testar para ter a certeza que já não estão a infectar, é também displicente, ou mesmo negligente.

Devíamos estar pelo menos alerta e com cuidados, sem alarmismos. Por mais difícil que nos seja imaginar, devíamos planear para a possibilidade de uma variante ainda pior do que as Omicron nos próximos meses. E não, nós não temos de “viver com o vírus”. Estamos cansados disto tudo, mas não devemos estar mal informados ou sermos enganados por má informação sobre o vírus.

Devíamos estar a falar da ciência, das consequências de deixarmos o vírus circular livremente, e de como mitigar os riscos, evitando mais confinamentos no futuro, em vez de estarmos a falar de uma falsa sensação de imunidade, que tudo indica é impossível existir para um vírus como este.

Temos de evitar os confinamentos que tivemos de suportar no passado, com as consequências económicas e psicológicas, que todos sentimos ao longo destes quase dois anos e meio de pandemia, com soluções simples e eficazes.

Devíamos estar já com a maioria das crianças dos 5 aos 11 ano imunizadas via vacinação, e com os grupos de risco, nomeadamente acima dos 60 anos de idade, e os imunocomprometidos, com a 4ª dose já inoculada.

Devíamos apostar em soluções simples de ventilação e de luz ultravioleta (UV-C) que permitem manter o ar “limpo” de germes, bactérias e vírus. Soluções extremamente baratas, quando comparadas com o custo dos testes para rastreio de casos, e para o tratamento no Serviço Nacional de Saúde dos casos agudos, graves ou crónicos, e que permitiriam levarmos uma vida mais normal, sem contribuir para o aumento de casos que hoje estamos a verificar e vão inevitavelmente levar a mais mortalidade e a mais Covid crónica.

Temos de evitar a todo o custo deixar a situação da pandemia chegar a situações como as que assistimos no Verão do ano passado e há dois anos, para não sacrificarmos mais uma vez a economia em geral, e o sector do Turismo em particular, com impacto nomeadamente na hotelaria e na restauração, mas em tantas outras actividades económicas que dependem da chegada de turistas a território nacional.

A nossa vida não pode ser vivida só à volta do tema guerra ou do tema Covid, mas temos de prevenir para evitar males piores. Haja vontade política de decisão para definir uma estratégia de combate ao vírus que seja eficaz e sem implicar transtornos e sacrifícios desnecessários na vida das pessoas.

Agradecimentos ao Think Tank informal “Info4us” (nome que substituiu “INFO | Covid-19”)