O presente ensaio procura explicar o porquê de dia 24 colocar o meu voto em Tiago Mayan Gonçalves. Contudo, ao invés de martelar um artigo propagandista pró-Mayan, decidi optar por um exercício que penso ser mais benéfico para o debate que circunscreve as eleições. Nesse sentido, antes de me debruçar no porquê do meu voto ser Mayan, debruçar-me-ei no porquê de não ser nos outros candidatos. Começarei pelos candidatos dos quais me considero mais visceralmente afastado, afunilando, assim, até àquele que me parece ser a opção mais viável e por isso fiel depositária do meu voto. É também necessário deixar uma nota de declaração de interesses, pois sou amigo do Tiago Mayan pré-candidato-à-Presidência-da-República, tendo-o conhecido nas suas vitoriosas equipas de quizzes no Pisco’s Bar. Não obstante, essa amizade não me tolda a visão política – algo que pretendo deixar claro através da racionalidade e sensibilidade que demonstrarei estarem investidas num voto em Mayan. Vamos, então, afunilar os candidatos até chegarmos ao candidato.

7 André Ventura é um nada bem aparelhado. Uma espécie de veículo esponjoso que absorve queixumes populares e os devolve, em formato soundbite e via televisão, aos que em primeira instância os proferiram, consolidando assim estes votos. As sua inegáveis popularidade e legitimidade são essas – as de se assumir como uma espécie de megafone do “povo esquecido” (e sabemos o quanto isto não deve ser menosprezado). Na verdade, Ventura é uma caixa de ar vazia – embora firmemente estruturada -, que se vai enchendo com os assuntos que ele sabe que lhe trarão melhores resultados eleitorais. A sua falta de coluna vertebral é a sua maior arma política. A sua única linha de ação é a da conquista do voto. Uma figura absolutamente despida de qualquer ideologia, que assume o papel de Messias do povo frustrado que “não sabe o que se passa, mas que já teve o suficiente disto!”, citando Slavoj Žižek.

Carismático e com destreza política, Ventura é leão e raposa. Raposa, pois ludibria o eleitor menos letrado, apresentando soluções simples (quando as apresenta) a problemas tão emaranhados como spaghetti. Leão, pois fá-lo com destreza e carisma, deixando o eleitor deleitado e eletrificado com o que assiste. Raposa, pois vai lançando soundbites “inocentes” como o de Papa João Paulo II ser sua referência – tocando o sininho aos católicos que o viam –, deliberadamente ignorando a incoerência de se bradar católico e ao mesmo tempo identificar etnias párias, abrir espaço à pena de morte e castrações químicas e destilar ódio ao próximo. O catolicismo é amor e humanismo, não raiva e crueldade. Esta postura de Ventura é absolutamente paradoxal. Algo tão incoerente como a hipótese de vermos João Ferreira – comunista – a adotar um discurso anarcocapitalista. Uma incoerência que enoja, pois demonstra, mais uma vez, a falta de espinha que Ventura decide ter – sim, decide: pois tudo isto que lhe aponto é algo de que ele está perfeitamente ciente; contudo, sabe que é o modus operandi a seguir em direção ao voto. Muito pouco católico de sua parte, diga-se.

Para além disso, Ventura cavalga em direção à tentativa de sequestração da direita. Em debate com Mayan, acusa-o de ser bloquista, puramente pelo facto de ser uma pessoa íntegra que não adere ao seu discurso de ódio. Estas ações de Ventura são, sobretudo, prejudiciais para a direita, pois fica com o seu espectro conspurcado e associado ao seu discurso afiado. Ventura vem tentando sequestrá-la, prejudicando todos aqueles que, com uma postura socialmente responsável e humanista, verdadeiramente a representam, contrariamente a Ventura. A direita não atropela minorias, André.

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Outra das muitas incoerências de Ventura é dizer-se antissistema. Se Ventura fosse realmente antissistema, não teria tido ligações com Luís Filipe Vieira, um dos maiores devedores do BES e baluarte da híperblindada corrupção portuguesa. Se Ventura fosse realmente antissistema, não arrecadaria financiamentos duvidosos para o seu partido. Se Ventura fosse realmente antissistema, não teria perpetuado o mesmo enquanto autarca pelo sistemático PSD em Loures. Mas não só de incoerências quanto ao seu catolicismo e “antisistemismo” pode Ventura ser acusado. A sua própria campanha é também uma incoerência redonda. O soundbite de que Ventura “[não será] Presidente de todos os portugueses, mas apenas e só daqueles de bem” fluiu. Foi falado. Cartazes reproduziram a ideia. Ele vai repetindo. Plim, sucesso: entrou na cabeça dos portugueses. Todavia, é engraçado notar que a sua carta de intenções – para além dos erros de pontuação que contém – veicula, novamente, uma ideia oposta à que André propaga nas ruas. Ironicamente (isto, efetivamente, parece ser uma piada, considerando que tem literalmente cartazes a dizer o contrário),  nela, Ventura diz ser candidato à Presidência da República “para representar e defender todos os Portugueses”… Então afinal também se propõe a Presidente dos “ciganos que beneficiam do RSI?”. Enfim, se houver uma palavra que possa caracterizar André Ventura é “incoerência” – e tenho a certeza de que não lhe estarei a dar nenhuma novidade.

Em suma, porquê um não tão grande a André Ventura? Por ser um homem de muros e não de pontes. Pela sua falta de amor e humanismo. Por ser uma fraude. Por ser incoerente. Por a sua falta de coluna vertebral ser parte fulminante da sua estratégia política. Pelo seu vazio ideológico. Pelo perigo que as suas ideias comportam. Pelos seus tiques autoritários e antidemocráticos. Por tudo isto, André Ventura torna-se, para mim, no último candidato em quem votaria nestas eleições. E já que falamos em tiques antidemocráticos, avançamos já para o próximo candidato, neste caso, candidata.

6 Marisa Matias. Confesso que estava indeciso quanto a quem colocar nesta posição, se Marisa Matias, se João Ferreira. Considerando que discordo ideologicamente de ambos, decidi-me pela Marisa, devido à sua atual figura política: Marisa está visivelmente cansada, sem luz. Não traz a frescura que é necessária a uma corrida presidencial. Não tem o vigor que demonstrou em 2016. A sua imagem está gasta. Nota-se que está à deriva, mal preparada e sem estratégia definida – o que ficou evidente na maneira como patinou no debate com Ventura.

Esta sua atual falta de inteligência política e estratégica ficou absolutamente exposta quando, no mesmo debate, afirmou que, como Presidente de República, jamais daria posse a um governo do Chega. Ora, estes tiques antidemocráticos de Marisa Matias são absolutamente condenáveis. Lembram aquele miúdo infantil que, quando perde a jogar futebol no recreio, leva a bola consigo e não permite que os outros continuem o jogo. “Ou é como eu quero ou não é, mesmo que a maioria dos portugueses assim o desejem!”. Uma absoluta falta de sentido de Estado, que se repercutirá em mais “gasolina” ao discurso venturista populista de que “nos querem calar”.  Marisa, aqui não há complexo de Popper – esse lugar comum que os internautas de esquerda vomitam ad nauseam nas redes socias – que a salve. É simplesmente imaturidade democrática sob égide da superioridade moral que a esquerda gosta de usurpar. Qualquer democrata que se preze, ao ouvir tal coisa, deveria automaticamente afastar-se de um voto em Marisa.

Por fim – e sem querer cavalgar adentro pelo plano ideológico que tanto me afasta de Marisa, não obstante rever-me no seu tato humanístico -, Marisa demonstra uma visão antiquada quando diz na sua brochura presidencial que “é preciso que o Estado faça mais o que a economia está a fazer menos: investir e produzir”, esquecendo-se que o foco da economia são as pessoas e que as decisões económicas se baseiam nas suas decisões, de maneira que o Estado, ao centralizar e a planear, está a retirar-lhes o poder decisivo que – note-se – é  força motriz do desenvolvimento económico. Aqui chegados, porque não Marisa Matias? Porque surge com uma imagem politicamente cansada e mal preparada. Porque tem tiques antidemocráticos e autocráticos reveladores de falta de empatia (mesmo que por aqueles que possam não a ter em primeiro lugar) e respeito pela soberania popular. E, por fim, de um ponto de vista ideológico, porque promove uma visão económica diferente daquela que eu acredito ser a mais benéfica. E já que falamos de diferença ideológica no plano económico, eis que seguimos com o candidato comunista.

5 João Ferreira é um candidato com quem é fácil simpatizar. Foi dos poucos que, até agora, se pronunciou sobre o estado da cultura ou a soberania nacional e isso não deve passar em vão. Diplomático, doce, respeitador e com uma mensagem clara. Porém, não é suposto isso ter peso suficiente para lhe atribuirmos o nosso voto. O conteúdo ainda importa um poucochinho. João Ferreira é indicado pelo Partido Comunista, o que faz dele, à partida, comunista. Ora, se ele é comunista, significa que ele tem uma visão para o país congruente com o comunismo. E como calha eu não ser comunista pelo facto de acreditar na propriedade privada aristotélica e considerar que as constantes tentativas de colocar o comunismo em prática foram desastres humanitários, não voto em João Ferreira. Nem aconselho o leitor a votar. Mayan e Ventura têm razão quando notam os atuais efeitos nefastos do comunismo em países como Cuba, Coreia do Norte, ou Venezuela. É política 101.

João Ferreira é o que se espera dele, adotando críticas – na sua declaração de candidatura – ao capitalismo pela forma como respondeu à pandemia, uma posição da qual discordo solenemente. Se não fosse o capitalismo, o seu mercado competitivo e a sua virilidade de capacidade produtiva, não se conseguiria ter dado uma resposta tão rápida, flexível e eficiente à procura megalómana por máscaras, álcool gel e equipamentos médicos. Para além disso, a corrida científica pela vacina nunca seria tão estimulante para as empresas se elas não pudessem obter alguma justa compensação. Os resultados da corrida à vacina foram, como vimos, um marco científico na história do Homem. É ainda curioso como alguém que é tão avesso ao capitalismo seja aquele que irá investir mais capital na sua campanha, a larga distância dos restantes. De garras fixas sobre a Constituição, na mesma declaração, João Ferreira atribui ainda culpa às “políticas de direita” pelos “sérios problemas estruturais [que Portugal carrega]”, ignorando o facto de, nos últimos 25 anos, a direita ter sido Governo apenas durante sete. Tudo isto enquanto escreve sobre “desburocratização da justiça” – completando a careta de ser sempre divertido ver um Comunista falar sobre “desburocratizar”.

A menos que seja comunista e ainda acredite na praticidade de um sistema em que até os mais conceituados marxistas deixaram de acreditar (como Jacques Derrida), não há motivo para votar em João Ferreira. Caso seja e João Ferreira efetivamente vença, conseguindo galvanização tal da ideologia, que a leve, mais tarde, ao Governo, espero encontrá-lo/a na fila do pão. Cenários improváveis. Porque não votar João Ferreira? Porque tem uma visão anacrónica para o país, imbuída num sistema totalitário, castrador de liberdades individuais e de prosperidade económica, tal como podemos observar nos países em que a tal visão é tentada ser posta em prática (com taxas de insucesso a rondar os 100% – “pOrQuE o VeRdAdEiRo CoMuNiSmO nUnCa ExIsTiU”). E já que estamos numa de fazer rir, seguimos para o próximo candidato.

4 Vitorino Silva é um candidato meme. A maior parte da esfera política olha para ele como uma espécie de animal de estimação que não morde e que só pede atenção para os assuntos que traz na boca. Talvez seja mesmo isso que ele seja – e há muita beleza nisso. De raízes populares, Vitorino Silva dá voz a um Portugal esquecido, que trabalha a terra e ainda tem calor no coração (ao contrário dos apoiantes de Ventura, que ficaram sem chama). Lutam pelo mesmo eleitorado, contudo, Vitorino Silva cria pontes, é solidário e carrega esperança e amor. Com uma postura mais católica do que Ventura, Tino é uma personificação do Português bom, internacionalmente conhecido pela sua hospitalidade e carinho. Por esta sua conduta, Vitorino representa alguém em que me revejo a nível pessoal e que, por isso, esteve mais perto de receber o meu voto do que os candidatos analisados supra.

Todavia, a candidatura que apresenta não é suficiente para tal. A política não deve ser sobre identificar-nos com pessoas, mas sim com as suas ideias. Se conseguirmos ambos, ótimo. Vitorino, apesar de bem-intencionado, é – outra semelhança com Ventura – um vazio ideológico. As suas principais propostas são um chorrilho de lugares-comuns que não trazem qualquer segurança política ao eleitor. O vício pela ideia populista de um dia “ser de esquerda às direitas” e noutro “ter um pé direito e um pé esquerdo” resulta num enorme vácuo, em que a falta de matéria política faz com que o candidato seja visto de forma amadora e vulnerável. Não obstante esta cinzenta intenção de Vitorino, uma leitura do programa do RIR faz-nos facilmente aproximá-lo ao socialismo. Apesar de benigno, Vitorino tem, tal como Ventura, um estilo híperpopulista em que pesca a adesão do povo através da cimentação de soundbites populares e difusos. Por fim, não vendo no seu discurso uma distinta preparação e, no seu comportamento social, uma destreza diplomática (sendo Marcelo o ex-líbris disto), penso que Vitorino não faria um bom papel como nosso chefe de Estado, nomeadamente em questões internacionais.

Porque não votar Vitorino Silva? Apesar de parecer genuinamente ser bem-intencionado, o projeto político que Vitorino apresenta é oco em termos de ideológicos, populista e há uma fraca preparação diplomática do candidato para assumir o cargo de chefe de Estado. Falando em diplomacia, segue-se a próxima não-depositária do meu voto.

3 Ana Gomes posiciona-se em terceiro lugar nesta lista por ser oposição a António Costa e mostrar estar munida de hirta coluna vertebral nas constantes denúncias de corrupção que enceta à classe política, à Justiça, ao Partido Socialista e demais assuntos. Para além disso, tem já bastante arcabouço político – ao contrário de Mayan ou Vitorino –, o que a abastece da experiência que um Presidente da República deve (e não necessita obrigatoriamente) de ter. Demonstra convictas posições humanistas quanto à a crise dos refugiados e à maneira como olha para o envelhecimento. Fala com eloquência e de forma comunicativa. Tem posições pertinentes quanto à estimulação da saúde mental e literacia digital. Fala sobre cibersegurança, a necessidade de revalorização da docência, e a inovaçãoeducacional. Ambientalmente civilizada e promotora da diversidade étnica, cultural e religiosa, a candidatura de Ana Gomes representa o socialismo cosmopolita verde, atualmente muito em voga na Europa – daí o óbvio apoio do Livre, não obstante as exaltações à pátria presentes na sua carta de compromissos. Nota a urgência da descentralização, aponta soluções para a mesma e ainda sublinha a necessidade de um fortalecimento do interior, assim como a necessidade de se investir na literacia política dos portugueses. É crítica voraz à inércia e conivência de Marcelo Rebelo de Sousa nos casos de Tancos e do SEF. Por estas razões – que não são poucas –, Ana Gomes colhe em mim alguma simpatia política. É a candidata que, à asquerda, coloco em primeiro lugar, pois é a única com qualidade efetiva – como a sua carta de compromissos expõe.

É, contudo, sobretudo no campo económico que deixo de me rever em Ana Gomes. A eurodeputada bandeira um enorme preconceito pelos serviços de saúde privados, quando diz que os nossos profissionais de saúde são “empurrados” para lá. Isto é demonstrativo de um enorme preconceito contra os privados-papões, pois os profissionais de saúde têm total liberdade de preferir trabalhar num privado em detrimento de um público. Trabalhar num privado não é necessariamente sinal de que se foi “empurrado” para lá, como as afirmações coletivistas de Ana Gomes sugerem. Se há necessidade de pessoal médico num hospital privado é porque este tem lá pacientes em necessidade. E se este lá tem pacientes é porque o SNS não está a suprir totalmente as necessidades dos cidadãos (num plano extrapandémico). Ainda bem que existem privados com “trabalhadores empurrados” a tapar estes buracos. Este preconceito reconfirma-se quando Ana Gomes aponta a falha de existirem “sistemas de propriedade privada que impossibilitam a atuação do Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas”, em alusão à morte dos animais na Torre Bela e em Santo Tirso. Concordamos na desgraça, mas discordamos quanto ao problema residir na existência de “sistemas de propriedade privada”. Ana Gomes atinge o seu clímax de críticas ao liberalismo quando nota que “a massificação do turismo é destrutiva para Portugal”, esquecendo-se que o turismo foi um dos maiores ganha-pão do Portugal recente. No Norte, um Porto vazio, cinzento e perigoso passou a ser uma das cidades mais cool e divertidas da Europa. Fartou-se de exportar francesinhas e deu emprego a milhares de portuenses que agradecem diariamente o trabalho que Rui Moreira fez, quando – inspirado no “I ♥ NY” – tornou a cidade numa marca internacional, sem prejuízo de a ter desvirtuado. Com certeza que há rendas altas e problemas de gentrificação, contudo, não relevantes ao ponto de dizer que o turismo massificado é um adamastor “destrutivo para Portugal”. O “turismo sustentável” que Ana Gomes sugere é pertinente, todavia, ter uma visão tão diabólica e maniqueísta sobre o antigo (pré-corona) estado do turismo em Portugal não é o ponto de partida correto para o debate, independentemente de ideologias.

Depois, a forma. Apesar de menos que Ventura, Marcelo, e Vitorino, Ana Gomes é, também, populista. Refere-se aos baixos salários como “recorrentes violações de direitos fundamentais” – algo que, como sabe, não é suscetível de uma mudança fugaz e simplória (menos ainda como Presidente da República). O mesmo tique populista está presente nas suas tentativas brutas de abanar o sino feminista, mais precisamente quando nota que “o acesso a cargos como o de Presidente da República ainda está sistematicamente vedado às mulheres”. Não entendo como é que uma mulher candidata à Presidência da República pode afirmar que o cargo para o qual se candidata lhe está vedado – uma enorme fábula populista que a coloca na posição da vítima que não é, enfraquecendo-a a si e às mulheres. Por fim, a enorme veia justiceira de Ana Gomes não inspira confiança no campo da Justiça, quando nota que irá, através do magistério de influência, “persuadir, influenciar e lograr mudanças de facto”. Aqui, Ana Gomes parece falhar em perceber que, para um correto funcionamento do Estado democrático, deverá respeitar o princípio basilar de separação de poderes que a Constituição prevê. Infelizmente, como pude atestar, partilha dos mesmos tiques antidemocráticos que Marisa, algo que fica ainda mais claro com a sua posição favorável à ilegalização do Chega.

Aqui chegados, porque não Ana Gomes? Apesar das sugestivas e interessantes políticas que a sua candidatura elenca, tal como as suas valências diplomáticas, Ana Gomes encerra em si um enorme preconceito contra os privados na saúde, não entendendo que estes nascem para suprir as falhas do Estadão que defende. Para além disso, diaboliza o turismo que trouxe pão à mesa de muitos dos Portugueses. A forma como faz política é populista – amalgama problemas complexos e apresenta soluções simples e floreadas. Demonstra, também, uma veia justiceira e antidemocrática, que no campo da Justiça poderá ser perigosa para o normal funcionamento da separação de poderes. Por estas razões, não voto em Ana Gomes. E já que o tema era populismo, passamos para o populista mais sofisticado e charmoso de Portugal, também ele não depositário do meu voto.

2 Marcelo Rebelo de Sousa é, ideologicamente, o candidato com quem me aproximo mais. Pertence à direita social e católica em que me revejo, preocupada com questões humanitárias, com o bem-estar do próximo e, sobretudo, com o dos desfavorecidos. É a direita da paz, do amor, da compreensão e da união – atualmente epitomada pelo Papa Francisco e por alguns considerada “direita fofinha”. Chamar-lhe-ia, antes, a “direita dos não brutos”. A tal, que Ventura tenta sequestrar, tendo levado uma sova no debate que travou com Marcelo. A tal – nestas eleições protagonizada por si e por Mayan -, inteligente suficiente para entender que o Chega se combate no campo das ideias e não através da sua proibição, que só mais combustível lhe daria. A tal, visceralmente democrática. Por estas razões, Marcelo partiria, teoricamente, em vantagem à conquista do meu voto. Contudo, calha de, por acaso, ter sido Presidente da República nos últimos cinco anos. E calha, de igual modo, de ter tido um mandato em que não me senti representado.

Marcelo tem distintas qualidades. É um homem estupidamente charmoso, carismático, bem-falante, inteligentíssimo e com provas dadas de ter um nível intelectual e preparação adequados para o cargo. É o candidato que está na posição mais difícil por ter um mandato fresco e à mão de escrutinar. Contudo, nos últimos cinco anos, Marcelo foi, efetivamente, conivente com as variadíssimas falhas graves do Governo de António Costa, não exercendo a contrabalança necessária a um Governo que tem responsabilidade política sobre a morte cruel de um cidadão ucraniano. Não exercendo a contrabalança necessária na misteriosa questão de Tancos. Não exercendo a contrabalança necessária a um Governo que trata o país como se fosse a sua herdade, tendo a si associados inúmeros casos de nepotismo, corrupção e nomeações políticas de ex-ministros para cargos públicos de sonho como, sei lá, governadores do Banco de Portugal. Marcelo e o seu silêncio serviram como plataformas de betão para o espetáculo circense que o Partido Socialista ofereceu aos Portugueses nos últimos cinco anos. E, por isso, pelo seu silêncio cooperante, não terá o meu voto. Estou descontente com Marcelo.

Descontente, por Marcelo ser populista e refém do numerário de popularidade que sabia vir a precisar nestas eleições. Descontente, por ter permitido ao Governo atual deslizar sobre uma pista de gelo infinita em que fez o que quis e à velocidade que entendeu, desde corridas a patinagem artística – todo um espaço de imunidade política por si batizado. Descontente, por não ter justificado a razão por que alguns o elegeram, tendo sido, não uma múmia, mas sim um fantasma político – assustadoramente assíduo de corpo, mas sem alma.

Porque não Marcelo? Porque Marcelo Presidente não é Marcelo Rebelo de Sousa, mas sim alguém populista que age em conformidade com o que lhe trará mais popularidade, despindo-se da sua coluna vertebral e dos seus valores exigentes e teoricamente fomentadores de justiça, transparência e servidão. Porque Marcelo Presidente capitula à ideia vaidosa de ser visto como o Rei de Portugal, delineando toda a sua agenda e modus operandi em conformidade com esta vontade (e já se sabe que é um erro querer agradar a todos). Porque Marcelo Presidente não agiu perante os grotescos crimes políticos cometidos pelo Governo que presidiu. Porque Marcelo Presidente é, foi e será uma grande desilusão política. Contudo, não desespere, há solução!

1 Tiago Mayan Gonçalves é o único candidato do espaço não socialista, não populista e não permissivo com a gestão atual do país. É o candidato da direita moderada, humanista e com coluna vertebral. Só ele o é e só ele a representa. A sua candidatura surge, sobretudo, como um profundo fôlego nestas eleições. O ensaio é escrito em jeito de afunilamento não por questões estéticas, mas sim por questões de raciocínio. O leitor mais atento reparará que estou a tirar as pétalas – algumas com espinhos – a uma flor. E, com muita pena minha, só uma pétala sobra em estado de colher. Mayan poderia ter um par, não fossem todas as críticas que aponto a Marcelo. E se, em primeiro lugar, Mayan se apresentou como aquele “menos mau”, hoje vemos que a sua candidatura lhe galvanizou qualidades que estavam em potência. Houve um enorme crescendo na sua prestação, desde a sua primeira entrevista televisiva com Miguel Sousa Tavares até ao estupendo debate que travou com Marisa – o melhor de toda a corrida. Mayan é incisivo – magoa com argumentos. Deita por terra a superioridade moral que a esquerda conquistou em Portugal. Cria pontes em vez de muros, buscando ser Presidente de todos (“até dele”). Mostra que é possível haver uma direita humanista, civilizada e com uma visão estratégica rumo à prosperidade económica. O seu único preconceito é não ter preconceitos. Deixa de ocupar o espaço do “menos mau” para ocupar o espaço do “realmente bom”. Sim, vou dizê-lo: surpreendeu.

Votarei nele por convicção. Votarei Mayan, porque não gosto de ver as empresas dos meus familiares e amigos a serem esventradas até à medula com taxas e taxinhas, não permitindo margens para que as mesmas possam investir e criar empregos. Votarei Mayan, porque não gosto de ver a estúpida carga burocrática que existe em Portugal, que pouco mais é do que um açaime à criatividade de jovens empresários. Votarei Mayan, porque acredito ser altura de travar o protocaudilhismo tentacular imposto pelo Partido Socialista com o batismo de Marcelo. Votarei Mayan, porque sou demoliberal e radicalmente moderado. Votarei Mayan, porque acredito no amor e na inclusão, independentemente de culturas, raças, credos, ou orientações sexuais. Votarei Mayan, porque acredito que cada um consegue escolher o melhor para si. Votarei Mayan, porque almejo um Portugal desprendido de um Estado-Pai, principalmente quando este está conspurcado até ao pescoço de casos corrupção. Votarei Mayan, porque é visceralmente democrático e não se alista à retórica totalitária de “calar quem não pensa como ele”. Votarei Mayan, porque sei-o consciente de que depressões e problemas de saúde mental não são uma “frescura” das novas gerações e outras. Votarei Mayan, porque partilhamos uma visão de Europa como ela sempre foi: plural e diferente de si própria. Votarei Mayan, por saber que não está emaranhado nas teias elitistas e centralizadoras de Lisboa. Votarei Mayan, porque conheço o Tiago e sei-o íntegro, bondoso, culto e munido das ferramentas que o cargo envolve. Enfim, muitas são as razões, contudo, nenhuma tão importante como esta: votar Mayan é investir o nosso voto de racionalidade e sensibilidade, numa altura em que estas se tornarão ferramentas imprescindíveis à luta cultural e política que se adivinha – Mayan é a única água potável no oásis de ideias que Portugal atravessa.