Corria o longínquo ano de 1965, o país encontrava-se submerso num ambiente hostil e totalitário quando Simone de Oliveira encantou o mundo lusófono no Festival da Canção da RTP com os versos “A vida perdeu fulgor. Como o sol de inverno, não tenho calor”. O tema ficou eternizado como Sol de Inverno e, actualmente, serve como metáfora perfeita ao contexto térmico daquela que é a realidade da grande maioria das habitações no nosso país.

Segundo um relatório divulgado pelo Portal da Construção Sustentável, “Cerca de 74% dos portugueses consideram as suas casas frias no inverno. A maioria recorre a mais roupa e a mais equipamentos para colmatar as necessidades de aquecimento”. Aliás, até 1990 a legislação não exigia qualquer tipo de isolamento térmico na construção de novas habitações.

Já em 2003 foi realizada pela Universidade de Dublin uma investigação que concluiu que Portugal é um dos países da União Europeia onde mais se morre por falta de condições de isolamento e aquecimento nas casas. A Quercus revela que apenas 1% considera a sua casa termicamente confortável e 21% dos portugueses consideram haver um aumento significativo no consumo de energia para manter o conforto.

À previsão de um Inverno rigoroso alia-se o facto de a pressão sobre os preços praticados no mercado grossista de electricidade na Península Ibérica (Mibel) conduzir a um avanço consecutivo para novos máximos históricos. No dia 18 de Novembro de 2020 o preço da electricidade no mercado Ibérico cifrava-se em valores a rondar os 38,24 €/MWh. Actualmente este valor encontra-se a 206,32€/MWh, um aumento de 540%, quando em comparação com o período homólogo do ano passado. Esta sequência de picos no preço da energia é reflexo do aumento do custo do gás natural no mercado internacional, assim como dos elevados preços das licenças de emissão de dióxido de carbono. Outro motivo que tem também contribuído para esta escalada de preços é a diminuição da geração de energia através da força do vento, o que leva as centrais de ciclo combinado de gás natural a recorrerem ao mix energético para compensar a situação.

Em Espanha o Conselho de Ministros anunciou uma série de medidas para combater o aumento do preço da electricidade, nomeadamente a redução de 5,11% para 0,5% do imposto especial sobre a electricidade, cobrado a famílias e empresas. Por cá, a Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos (ERSE) anunciou que a fatura da luz vai sofrer aumentos entre um e três euros para mais de 930 mil consumidores. No entanto, para compensar este efeito, a ERSE revelou que as tarifas a aplicar no próximo ano terão uma redução de 3,4% face a Dezembro de 2021.

No país com maior exposição solar da Europa, resta-nos apelar ao Sol de Inverno de Simone para contrariar a situação em que grande parte das famílias portuguesas se encontram. Ainda que seja ousado dizer-se que em Portugal há gente a morrer de frio, será factual dizer-se que há gente a morrer pelo frio que sente e pelas consequências que isso tem na sua saúde – nomeadamente problemas respiratórios e alergias – situação que envergonha o regime e consequentemente enfraquece a Democracia.

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