1. Os factos podem ser chatos, incómodos e até mesmo irritantes. Mas são o que são. Veja bem, caro leitor. No fim-de-semana que António Costa jurava que o país está no trilho certo do crescimento económico, os portugueses ficavam a saber através do Expresso que, a concretizar-se a previsão da Comissão Europeia para o crescimento do PIB em 2018 (2,3%), acontecerá o seguinte:

  • Portugal vai voltar a perder poder de compra face à média da União Europeia (UE);
  • O nosso país vai ser ultrapassado no final de 2018 “por três rivais de Leste: Lituânia, Eslováquia e Estónia”;
  • “Portugal fechará” 2018 na “21ª posição da UE” — “a pior classificação de sempre num ranking em que arrancamos em 16.º. Entretanto, foi sendo ultrapassado pela Eslovénia em 2003, pela República Checa em 2007, por Malta em 2010 e rivaliza com a Eslováquia desde 2012”;
  • O valor recorde de 84% do PIB per capita face à média UE foi atingido em 1999 — há 17 anos. O valor mais baixo foi de 75,2% em 2012, sendo que em 2017 conseguimos atingir 78%. (Expresso, Caderno de Economia, 26/05//2018).

Trocado por miúdos: os portugueses vão ficar cada vez mais longe do poder de compra médio dos restantes Estados-membros da UE e cada vez mais perto do lanterna vermelho do ranking chamado Bulgária.

E porque é que Portugal não consegue convergir com a UE? Por que os outros países crescem mais. Só em 2017, apesar do maior crescimento económico do séc. XXI (2,7% do PIB) e de ter crescido acima da média europeia, Portugal ocupa apenas o 20.º lugar desse ranking de crescimento económico na UE. Isto é, 19 países cresceram mais do que Portugal.

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É uma realidade bastante diferente do diagnóstico cor-de-rosa que António Costa e os seus camaradas socialistas quiseram vender-nos durante o último fim-de-semana no 22.º Congresso do PS, não é?

2. O primeiro-ministro até aflorou o assunto no seu discurso de encerramento do Congresso do PS ao referir que “o problema não se coloca só ao nível do salário mínimo. Temos que convergir também com a UE a nível salarial”. Uma verdade à La Palisse que, contudo, não cola com a estratégia estrutural de Costa.

Pergunta-se: O que está António Costa a fazer para fomentar a convergência do poder de compra dos portugueses com a média europeia? Que medidas revolucionárias está o Governo do PS a tomar para criar um novo modelo económico sustentável que elimine de vez a estagnação económica dos últimos 18 anos?

Na mesma notícia do Expresso, referia-se, citando dados de uma consultora internacional relativos a 2016: em termos de investimento direto estrangeiro, Portugal conseguiu atrair apenas 59 projetos contra 70 da Eslováquia, 107 da Hungria, 110 da República Checa e 132 da Roménia ou 256 da Polónia.

Dados muito relevantes quando as empresas e os bancos portugueses estão descapitalizados. Insistimos: que investimentos estruturais, como uma Auto-Europa, por exemplo, já conseguiu o Governo de António Costa captar?

Investimentos diretos estrangeiros com relevância estrutural para o perfil da economia portuguesa pouco ou nada se vê.

Pelo contrário, além de ser um Governo de navegação à vista, este é um Executivo que esteve permanentemente a olhar pelo retrovisor, a olhar para o passado.

A sua ação central foram as chamadas políticas de reversão para viabilizar a construção de uma maioria no Parlamento. Por oportunismo e necessidade política de António Costa, reverteram-se as privatizações dos transportes para agradar ao PCP e aos seus sindicatos, reverteram-se os cortes salariais impostos pela troika para agradar aos funcionários públicos — um dos eleitorados naturais do PS, do PCP e do BE.

E tentaram reverter em nome de preconceitos ideológicos as reformas do Governo Passos Coelho que melhores resultados económicos deram até agora: a flexibilização do mercado de trabalho e a lei do arrendamento urbano.

Este é um governo que, em suma, se arrisca a cumprir uma legislatura de quatro anos sem uma reforma que se veja, sem um pensamento estrutural sobre o futuro do país.

3. Mas pior que tudo é a autêntica política de avestruz seguida pelos socialistas (já para não falar de comunistas e bloquistas) sobre questões estruturantes do Estado Social português.

É sempre bonito ouvir um tribuno com o dom da oratória como Pedro Nuno Santos a citar uma frase de Karl Marx mas a questão — e sem referir o contra-senso filosófico do Estado que toma de conta de nós ser o Estado que liberta os indivíduos defendido pelo secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares — volta a ser simples:

  • quem paga a fatura de um sistema de pensões que está falido a curto/médio prazo por não ter ativos em número suficiente para pagar as pensões a pagamento? O índice de envelhecimento situava-se em 2016 em 148 idosos para 100 jovens com tendência para agravar-se, tendo em conta que desde 1983 que Portugal deixou de ter um índice de fecundidade que permita substituir as gerações.
  • Como será tapado o buraco da Caixa Geral de Aposentações? As contribuições já só pagam cerca de 45% dos encargos.
  • Com que fundos será financiado um Serviço Nacional de Saúde que tem um problema crónico de financiamento? O buraco já vai em cerca de 1,4 mil milhões de euros.

Fica igualmente bem afirmar com voz de trovão e a mão em cima do “Das Kapital” que os malandros da direita querem é uma sociedade individualista e desigual. O problema é só um: como se financia esse Estado Social universal e sem viabilidade financeira?

A resposta dos socialistas costuma ser sempre a mesma: aumentar os impostos.

E até têm uma boa desculpa: as estatísticas europeias dizem que a carga fiscal portuguesa ainda está abaixo da europeia. O problema são dois:

  • o poder de compra
  • e a qualidade dos serviços públicos prestados face aos impostos que os portugueses pagam

Já para não falar da perda de competitividade da economia portuguesa sempre que se aumenta a carga fiscal.

4. Para agravar a situação, a economia europeia está em desaceleração, o Banco Central Europeu deverá terminar até ao final de 2018 com a compra de dívida pública dos Estados da Zona Euro e a instabilidade política da Itália e de Espanha está para lavar e durar.

Tudo junto, podemos ter consequências a diferentes níveis:

  • Menos receita do Turismo — que em 2017 cresceram 16,6% face a 2016 e totalizaram 3,39 mil milhões de euros;
  • Subida das taxas Euribor e consequente subida da prestação os empréstimos subscritos por muitos portugueses;
  • E a instabilidade política em Itáia e em Espanha provocar um aumento e o contágio das taxas de juros da dívida pública

Por isso mesmo, em vez de fazer um discurso de encerramento do Congresso do PS a apontar para a maioria absoluta em 2019, tentando tocar em todos os grupos eleitorais decisivos (os reformados, os funcionários públicos, as famílias, os estudantes universitários, etc.), António Costa devia ter “prudência” como palavra-chave do seu discurso.

Talvez seja pedir de mais a um líder e a um partido que preferem ter a cabeça enterrada na areia em vez de olharem de frente para a realidade dos números.