Seria fastidioso avançar aqui com mais um bloco de estatísticas destinado a mostrar – com números do INE, do EUROSTAT e do Banco de Portugal – que o país cor-de-rosa afinal tem matizes de cinzento carregado, sobretudo se atentarmos no horizonte.

O Primeiro-Ministro, que esta semana voltou a mostrar que transborda de optimismo acerca das perspectivas de evolução para a nossa pequena Economia, insiste em não dar a mínima atenção ou muito menos apresentar um pensamento estratégico de correcção para factos inegáveis da nossa situação económica.

E por isso não posso deixar de destacar a “tendência descendente” na evolução do PIB, que o Banco de Portugal assinala, o aumento progressivo do distanciamento face à média Europeia do nosso PIB per capita, o decréscimo do consumo privado, a desaceleração das exportações, em simultâneo com as importações que “deverão apresentar uma trajetória de aceleração progressiva”. E assim se confirma, de acordo com a mesma Instituição, uma “trajetória de abrandamento do rendimento disponível real em 2020-21”.

Trocando por miúdos – quer António Costa queira, quer não — os portugueses estão mais pobres e vão ficar cada vez mais pobres. O país está cor-de-rosa, sim, mas estaria rosa-choque se estivesse consciente desta realidade.

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Para além do Banco de Portugal, talvez convenha também mandar calar a responsável do Banco Alimentar, que veio denunciar o aumento dos pedidos de apoio dirigidos a essa instituição, por parte de cidadãos que não conseguem já prover às suas mais básicas necessidades de alimentação. Que maçada é que continue a haver quem não perceba que o discurso tem de ser sempre positivo e irritantemente optimista.

Mário Centeno já vem dizendo que o crescimento não é eterno (parece que o Ronaldo das finanças está com dificuldade em marcar golos) e Costa (qual Calimero) põe um ar triste para dizer que não pode aumentar os enfermeiros nem a função pública, e que não compreende porque lhe estão a pedir mais. Passou três anos a alimentar o monstro com reduções de horários, progressões de carreiras e um leque interminável de cedências a torto e a direito e agora admira-se que o monstro esteja de boca aberta a pedir mais e mais.

Suspeito que o que vem a caminho seja o agravamento do IRS para os trabalhadores do sector privado, já que, na opinião do chefe do Governo, os funcionários públicos foram os grandes penalizados pela troika – ficou, por isso, o aviso feito e só não vê quem não quiser ver. Basta ver a forma habilidosa como (não) se mexeu nos escalões do IRS, cirurgicamente e para imprensa ver.

Somar-se-ão mais uns impostos indirectos e umas criativas taxas e taxinhas, aplicadas sempre em nome de melhor saúde, menos consumo, ou qualquer outra barbaridade que o Bloco se lembre de colocar na agenda.

Para além disso, virão mais impostos sobre as empresas. Parece que o pretexto do cobrador do Governo (sim, o Bloco) é, desta vez, financiar “o hábito de leitura de jornais e revistas” (SIC), à falta de um ângulo mais imaginoso para onerar os empresários que produzem riqueza e criam emprego – fruto de um pensamento mais vasto que visa castigar aqueles que geram os malfadados e terríveis lucros.

O que me leva ao ponto seguinte. Não vou ensaiar um qualquer paralelismo entre a República Portuguesa e a República Bolivariana da Venezuela, dado que, apesar de tudo, temos por cá uma democracia séria e autêntica (ainda que falha de oposição ao poder) e estamos longe de quedas do PIB de dois dígitos sucessivas e de uma inflação de 10.000.000%. Mas a verdade é uma e não me consigo abstrair dela – temos no Governo da República Portuguesa um primeiro-ministro que não vê nenhum problema em coligar-se com dois partidos que olham para a Venezuela com candura e alguma nostalgia até.

António Costa encara com naturalidade um Governo (que é para continuar, dada a “impossibilidade virtual” de uma maioria absoluta) sustentado por um Partido Comunista que não vê na Venezuela senão o resultado de conspirações internas e externas contra a bem-aventurada revolução bolivariana Chavista-Madurista e que lê a realidade pós-comunista da seguinte forma, segundo texto de há uns anos: “Contrariando o comemorativismo e triunfalismo que o Capitalismo quer impor à humanidade, a propósito dos 20 anos da «queda do muro de Berlim», a verdade é que o mundo está hoje mais injusto, mais desigual, mais perigoso e menos democrático”.

Para o Bloco, mais táctico, mais plástico, mais cínico, convém não apoiar “Nicolas Maduro nem Guaidó”, pois que “engana-se quem acha que se apaga fogo com gasolina” – lava-se as mãos e mantém-se o fingimento. Comunidade Portuguesa na Venezuela: perdoa-lhes, que não sabem o que dizem…

E, enquanto isso, os de cá vão ficando mais pobres, mas continuam a dançar ao som da música que Costa vai cantando sempre que lhe põem um microfone à frente.

Pobretes mas alegretes. Siga a festa.