Parece que anda um Almirante na loja de porcelanas. Obviamente, o Almirante é Gouveia e Melo. E a loja de porcelanas, a nossa melindrosa partidocracia. Aliás, os partidos talvez se chamem partidos precisamente pela facilidade cerâmica com que se partem e transformam em cacos.
O Almirante é na verdade um intruso não domesticado ou amestrado que ameaça perturbar a solene residência oficial dos interesses estabelecidos. Quebrando as embaciadas vitrines partidárias e derrubando os canapés da oligarquia inquilina.
Henrique Gouveia e Melo não foi de facto convidado. Vem por vontade própria, de fora do sistema, como um bárbaro invasor. E aparentemente sem compromissos nem alinhamentos. Não está controlado nem parece vir a ser controlável.
Além disso trata-se de um militar. Tem a escola do Serviço, a educação do dever. O que é inquietante para a mentalidade de conveniência típica das seitas partidárias e das novas burguesias do regime.
Mas o pior para a nomenklatura é ele ter uma ligação directa com o povo, sem intermediação dos partidos. O Almirante no fundo é a democracia directa. A qual interpela sempre a democracia representativa, visto ser uma emanação imediata da própria soberania nacional e não mera captura da representação popular, através das máquinas partidárias.
Os porta-vozes do establishment nos media acusam-no também de não se lhe conhecer pensamento político. Por outras palavras, de não exibir cartilha ideológica.
Todavia, quem já leu os seus escritos atlantistas e ouviu com cuidado as entrevistas, sabe que ele possui uma coisa infinitamente mais valiosa e rara: uma visão para o país.
O Almirante Gouveia e Melo tem uma ideia de longo prazo sobre o futuro e o destino de Portugal.