“Não tem rigorosamente nada a ver com a vida política nem com as funções que exerço ou exerci”, disse António Costa, Primeiro-Ministro de Portugal, relativamente à sua presença na comissão de honra de Luís Filipe Vieira para as eleições do Benfica. Mas tem, sr. Primeiro-Ministro, tem tudo a ver com a sua vida política e com as funções que exerce. Quem disse que nem à mesa do café os ministros se podiam esquecer que são ministros, tomou uma decisão que nem numa conversa de café seria levada a sério.
É verdade que, entretanto, o presidente do Benfica retirou António Costa, Fernando Medina e os restantes titulares de cargos públicos da sua comissão de honra, mas o mal já estava feito. O princípio que ditou esta demonstração de apoio pode muito bem ser o fim para Luís Filipe Vieira à frente do clube. Porque o que ficou na retina foi a inclusão de diversos políticos, em funções executivas, na sua comissão de honra às eleições internas do clube e que deixam no ar a nuvem de dúvida sobre relações onde há um óbvio conflito de interesses.
Esta relação entre o futebol e a política é de uma insensatez e de uma promiscuidade atroz e revela uma instrumentalização da política como escudo para o cerco da Justiça que cada vez mais se aperta. Pelo que consta no Código de conduta do Governo, criado na sequência do “Galpgate”, nomeadamente os artigos 4º, 6º e 10º, ficou até comprovado que este apoio não era sequer compatível com esse mesmo código de conduta.
Ao ter aceitado integrar a comissão de honra, parte-se do pressuposto que António Costa apoia Luís Filipe Vieira. Na minha opinião, qualquer político em funções tem direito a ser adepto de um clube e até de ser sócio. Mas, enquanto membro de uma comissão de honra de uma candidatura à presidência de um clube, é pelo seu cargo que responde. E o que António Costa disse com esta ação foi que o Primeiro-Ministro de Portugal apoia uma pessoa que é um dos grandes devedores da banca portuguesa e que aparece em processos judiciais como a Operação Lex e o mais recente caso da Odebrecht.
Neste rol de dívidas à banca, incluem-se os mais de 200 milhões de euros ao Novo Banco, o tal que foi constituído com um Fundo de Resolução e cujas perdas andamos todos nós contribuintes a pagar, facto publicamente criticado este ano por António Costa. Quem diria? Ainda mais surreal é o Governo ter afirmado que tinham chegado ao fim os empréstimos da banca aos clubes de futebol e na semana passada ter sido anunciado um empréstimo do Novo Banco ao Benfica no valor de 28 milhões de euros.
Com isto, Luís Filipe Vieira estende o seu all-in a outros campos de atuação, em paralelo com a despesa astronómica em reforços para o futebol do Benfica, três meses depois de o CEO do clube ter afirmado que os tempos que se vivem são de exceção e de contenção, pelo que haveria um travão no investimento no mercado de transferências. Viu-se.
O atual Presidente do Benfica disse, inicialmente, que só iria falar quando entendesse e que nesse momento o mais importante eram os jogadores do Benfica responderem dentro de campo. Responderem a quê, pergunto eu? Porque o que Luís Filipe Vieira afirmou foi que, num raciocínio extremamente deturpado, as críticas aos seus atos, eram, afinal, direcionadas aos jogadores e ao próprio clube, como se estes tivessem alguma responsabilidade pelas ações do seu presidente? O Presidente do Benfica sentiu este ataque como um ataque à sua pessoa e acreditou que a resposta eram os jogadores do Benfica que a iam dar dentro de campo? Mas em que mundo vive Luís Filipe Vieira?
Conotar-se com o próprio clube é o reflexo da soberba de quem se acha dono dele e, pior ainda, de quem acha, que se não fosse ele, o clube não existia. Se calhar era importante alguém recordar a Luís Filipe Vieira que ele é o 33º presidente da história do Benfica e, com todos os méritos que teve desde que foi eleito, quando iniciou funções no clube este já estava a completar 100 anos de existência.
Por fim, considero bizarro quem defende Luís Filipe Vieira quando ele menciona “debates estéreis” e “intérpretes deprimidos”, quando o próprio presidente do Benfica se recusa a ir a debate com os candidatos às próximas eleições do clube. Percebe-se também que o desnorte é total, quando no Benfica se viram para o rival do norte em jeito de “desculpabilização”, nomeadamente no que toca a ter políticos em listas para a presidência ou órgãos de clubes de futebol.
Luís Filipe Vieira falou numa campanha ofensiva e caluniosa nunca antes vista e eu concordo com ele: há muito que não via uma campanha tão ofensiva e caluniosa contra os valores da decência e da credibilidade. Espero que os sócios do Benfica não se esqueçam disto quando forem votar em outubro, da mesma maneira que espero que os eleitores não se esqueçam disto da próxima vez que forem às urnas.