A Comissão Europeia acusou nesta terça-feira Portugal de falhar os compromissos assumidos durante o Programa de Assistência Económica e Financeira (PAEF), de compensar com medidas de qualidade e dimensão equivalente desvios ao défice orçamental que viessem a materializar-se, caso dos chumbos do Tribunal Constitucional e dos desvios na despesa que entretanto se verificaram.
Numa análise ao programa de ajustamento português, a Comissão Europeia (que fez parte da troika juntamente com o Fundo Monetário Internacional e o Banco Central Europeu) lembra os chumbos do Tribunal Constitucional este ano e os desvios identificados pelo Governo na despesa pública, e a opção do Governo por não tomar medidas adicionais.
Para Bruxelas, a opção levou a que a “estratégia de consolidação orçamental seja de menor qualidade que nos planos iniciais, uma vez que é baseada menos em medidas permanentes de redução de despesa e minimiza o ajustamento estrutural necessário”.
Seguindo esta linha, a Comissão diz então que esta decisão de compensar os desvios com a receita acima do esperado com impostos, não tentando compensar os desvios, “também se afasta do compromisso assumido pelas autoridades durante o programa de implementar medidas para compensar, de igual dimensão e qualidade, caso se materializassem desvios, devido a consequências legais ou de execução, após as decisões do Tribunal Constitucional”. “No entanto, o segundo orçamento retificativo não inclui qualquer medida adicional de consolidação”, sublinha.
Défice pode ser duas vezes e meia o esperado no início do ano
Para além da falha nos compromissos, Bruxelas deixa ainda o alerta: o défice orçamental no final deste ano pode ser duas vezes e meia o que o Governo esperava no orçamento e acordou com Bruxelas. Isto porque o Orçamento do Estado para 2014 e o acordo feito com Bruxelas inicialmente era o de que o défice se ficasse pelos 4% do Produto Interno Bruto (PIB) ainda de acordo com as anteriores regras estatísticas europeias, o Sistema Europeu de Contas 1995 (SEC95).
Agora, Bruxelas calcula que, com as operações que estão por classificar nesta altura pelas autoridades estatísticas, de acordo com as regras antigas, o défice pode chegar aos 10% do PIB, mais 6 pontos percentuais que o acordo inicial.
Este valor toma especial relevância considerando que a ministra das Finanças durante a apresentação do segundo orçamento retificativo deste ano, após uma reunião do Conselho de Ministros no final de agosto, calculava que o défice orçamental seria de 4% sem operações extraordinárias, mas de acordo com as regras do SEC95, com estas operações todas classificadas no défice, não chegaria sequer aos 8% do PIB.
Quando o INE publicou no final de setembro as contas para o défice orçamental e para a dívida pública já de acordo com as novas regras (SEC10), o Ministério das Finanças entregou uma projeção revista de défice de 4% para 4,8% do PIB, mas explicou-se dizendo que esse valor contabilizava as operações extraordinárias que a Comissão Europeia não terá em conta para o apuramento do défice acordado com as autoridades.
No entanto, agora a Comissão Europeia diz também que existe o risco de esse valor chegar a 7,5% d PIB. Entre os principais riscos, que ainda não estão acautelados nos novos números, está a nova estratégia de gestão financeira das empresas de transportes, e também, por exemplo, o empréstimo do Estado ao Fundo de Resolução para o aumento de capital do Novo Banco.