É um encontro sem precedentes: 15 associações sindicais, das Forças Armadas aos diplomatas, das polícias aos magistrados do Ministério Público, Impostos e trabalhadores dos Registos e Notariado juntaram-se para “lançar um alerta” aos responsáveis políticos portugueses. Une-as o facto de representaram áreas de soberania do Estado e de sentirem que estão há demasiado tempo a ser desrespeitadas pelos sucessivos Governos.

A conferência “Funções soberanas do Estado” vai decorrer esta quinta-feira, na Universidade Católica, para fazer uma “chamada de atenção” conjunta. Ao Observador, membros do grupo de todas estas associações — que não podem converter-se em sindicatos — destacam o caráter “inédito” do encontro e admitem que, em várias das áreas representadas na conferência, o incómodo das hierarquias já se fez sentir.

Também estava previsto que o Presidente da República fizesse a intervenção da abertura da conferência. A presença chegou a estar confirmada — consta, aliás, do cartaz oficial que dá conta do encontro –, mas Marcelo Rebelo de Sousa acabou por desmarcar a sua presença, alegando motivos de agenda: o chefe de Estado vai estar em Belém a ouvir os partidos com representação parlamentar sobre o Orçamento do Estado para 2017. Na sua vez, Marcelo enviou um representante da presidência da República.

As profissões que desempenham funções de soberania no Estado entendem que o Estado não lhes tem dado a devida importância a estas funções, [apesar de serem] pilares do Estado e da Democracia que, ao longo dos anos, têm sido encaradas como uma mera despesa e não como funções essenciais para o Estado”, refere António Ventinhas, presidente do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público (SMMP) e um dos promotores do encontro.

O tom é de descontentamento geral, mas a palavra é dada aos de fora.

A conferência terá duas mesas de discussão: uma sobre “Defesa, Política Externa e Segurança“, com a participação do ex-ministro da Defesa e da Administração Interna Nuno Severiano Teixeira, o constitucionalista Jorge Bacelar Gouveia e António Almeida de Moura, capitão de mar-e-guerra; o segundo debate será sobre “Justiça e Finanças” e terá intervenções dos professores universitários Eduardo Paz Ferreira, Luís Fábrica, José Lobo Moutinho e Mónica Jardim.

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António Ventinhas justifica o facto de nenhum elemento das associações que organizaram o encontro (ver lista no final) ter intervenções programadas com o objetivo da conferência. “Não pretendemos que esta conferência seja corporativa, que dê a ideia de que queremos uma dignificação das funções soberanas do Estado em função das nossas próprias interesses corporativos”, justifica o presidente do SMMP.

Um estado que renuncia à sua própria soberania não pode ser soberano”, sublinha o procurador da República.

Para abarcar todos os presentes é preciso percorrer uma lista extensa: procuradores, funcionários judiciais, inspetores do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, Guardas Prisionais, trabalhadores dos Impostos e dos Registos e Notariados, Diplomatas, Forças Armadas (entre oficiais, sargentos, praças e militares na reserva e na reforma), militares da GNR, agentes da PSP, inspetores da Polícia Judiciária e elementos da Polícia Marítima — vão estar todos juntos, no anfiteatro da Universidade Católica, para defender a “dignificação” das funções soberanas do Estado e tentar contrariar “um processo que se arrasta há vários anos”. Em tom de brincadeira, quase se interpreta na reunião magna de áreas de soberania uma revolta institucional.

conferência Estado

Dirigentes das associações sindicais de funções soberanas do Estado vão juntar-se esta quinta-feira, em Lisboa

Não é disso que se trata, garantem os vários responsáveis, sem esconder que o timing ideal talvez fosse outro. “Os argumentos que são válidos agora seriam muito mais válidos, ou tão válidos, há um ano”, quando o país estava sob intervenção externa, a braços com um resgate financeiro, e as decisões internas obrigavam o Governo a requerer um crivo de Bruxelas. Porquê, então, um encontro desta dimensão nesta altura? Porque “a conjuntura assim o permitiu” e porque só agora foi possível “o encontro das vontades das muitas associações”, justifica.

No foco dos vários dirigentes associativos há uma ideia central: “O Estado tem abdicado da sua própria soberania, quer por razões externas quer por razões internas, e queremos que o Estado seja soberano e que as funções soberanas do Estado sejam respeitadas”, sublinha Ventinhas, porta-voz informal do grupo.

Os problemas “graves” são transversais às diferentes áreas, porque “muitas vezes o Estado faz uma gestão à flor da pele, de orçamento ano a ano, e não tem uma perspetiva de médio ou ongo prazo sobre o que o Estado quer ser”. É também esse o debate que se quer promover esta quinta-feira: “Que Estado queremos ser?“.

A conferência começou a ser organizada há mais de meio ano e, pelo caminho, a lista de organizadores foi crescendo. Esta terça-feira, contava com 15 associações sindicais:

  • Sindicato dos Magistrados do Ministério Público
  • Sindicato dos Funcionários Judiciais
  • Sindicato da Carreira de Investigação e Fiscalização do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras
  • Sindicato Nacional do Corpo da Guarda Prisional
  • Sindicato dos Trabalhadores dos Impostos
  • Sindicato dos Trabalhadores dos Registos e Notariado
  • Associação Sindical dos Diplomatas Portugueses
  • Associação dos Oficiais das Forças Armadas
  • Associação Nacional de Sargentos
  • Associação de Praças
  • Associação dos Militares na Reserva e Reforma
  • Associação dos Profissionais da Guarda
  • Associação de Funcionários de Investigação Criminal da Polícia Judiciária
  • Associação Sindical dos Profissionais de Polícia
  • Associação Sócio-Profissional da Polícia Marítima