Não fui um apoiante de Marcelo Rebelo de Sousa, mas desejo-lhe agora as maiores felicidades. Portugal precisa de um bom Presidente. A tomada de posse e a lua de mel que se seguiu mostraram que o novo Presidente quer mobilizar o país e dar confiança aos portugueses. E Portugal parece estar enamorado por Marcelo. O Presidente terá contudo que gerir as expectativas. Não será fácil.

Comecemos pela economia. Portugal enfrenta três problemas muito sérios e complicados. Em primeiro lugar, a falta de crescimento económico duradouro. A economia portuguesa não cresce de um modo significativo desde 2000. Por isso, o país acumulou dívidas. Sem a criação de riqueza, um país fica condenado a viver de créditos. Este é o verdadeiro problema de Portugal. Todos os outros, desde as dívidas à fragilidade do sistema financeiro, decorrem da ausência de crescimento.

A estratégia económica deste governo continuará a impedir o crescimento. Há aliás uma contradição insanável nas políticas da “geringonça”. A restituição de rendimentos levou ao aumento dos impostos indirectos para controlar o défice. Mas esse aumento irá travar o consumo interno, fundamental nos planos do governo para fazer crescer a economia. Nenhuma economia como a portuguesa poderá crescer com o aumento dos custos de trabalho e dos preços da energia. Os maiores riscos para este governo serão a estagnação económica e o aumento do desemprego.

O governo enfrenta também um problema orçamental. Não vale a pena repetir o que tem sido escrito e discutido por muita gente, mas as medidas orçamentais adicionais em Maio e o orçamento de 2017 serão dois sarilhos para Costa e para os seus aliados à esquerda.

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Por fim, a fragilidade do sistema financeiro constitui o terceiro dos problemas económicos. As necessidades de recapitalização da Caixa Geral de Depósitos e as mais do que prováveis perdas do Fundo de Resolução com a venda do Novo Banco vão piorar o problema, sobretudo se a situação da banca na zona Euro continuar instável. Neste momento, os investidores não confiam no sistema de resolução da União Bancária. Sem essa confiança a situação do sector tende a agravar-se. Nesse contexto, não será de excluir que o governo necessite de uma ajuda externa para recapitalizar os bancos portugueses.

Mas além da economia, a política portuguesa está demasiada radicalizada e assim continuará por algum tempo. Há períodos nos quais as tendências políticas são mais poderosas do que as intenções dos protagonistas políticos. Portugal (e a Europa em geral) atravessa um desses períodos. Marcelo deseja os consensos e a moderação, mas os seus desejos são insuficientes. Passos Coelho e Assunção Cristas foram, respectivamente, reeleitos e eleitos com mandatos claros: enquanto António Costa for PM, não haverá entendimentos com este governo (o que não invalida votos parlamentares ao lado do governo em casos pontuais).

Por outro lado, António Costa não tem ilusões sobre acordos com o PSD ou com o CDS. Como politico experiente soube desde o início que a sua escolha de se aliar ao PCP e ao BE teria consequências políticas. O que ele deseja é cultivar uma imagem de moderado, para equlibrar a aliança com os radicais. Para isso, uma relação próxima com Marcelo será importante. Mas não será suficiente para alterar o rumo actual da política nacional. Com estas lideranças partidárias, não haverá uma aproximação entre o PS e os partidos à sua direita. Marcelo não tem poder para alterar essa realidade, mesmo que tenha vontade. Por isso, não será sensato criar a expectativa de poderá fazê-lo.

São demasiados riscos para que tudo corra bem. Neste momento interessa a Marcelo e a António Costa desenvolverem uma relação cordial, senão mesmo próxima. Mas quando os problemas se acumularem e o governo começar a pagar um preço político por isso, o novo inquilino de Belém afastar-se-á de São Bento. Como Presidente da República. Marcelo pode ajudar, mas não tem o poder suficiente para impedir que as coisas corram mal ao governo. Quando isso acontecer, tudo fará para não permitir que o governo lhe retire popularidade, o capital político deste Presidente. Será uma questão de tempo.